quinta-feira, 24 de janeiro de 2019

A MEDICINA DOS TUPINAMBÁS



A Medicina dos Tupinambás. (por Antonio Samarone)

Na Idade Média, os cirurgiões do Velho Mundo curavam todos os males a ferro e a fogo. Os Tupinambás não conheciam o ferro, os seus pajés limitavam-se ao fogo. Quase todas as mazelas eram tratadas com o fogo (compressa quente e banho de luz). No caso da varíola, eram feitas valas forradas com fogo e brasas, cobertas com varas. Os doentes deitavam-se sobre essas varas, o tempo necessário para a cura. Muitos sucumbiam antes. Os jesuítas não sabiam como lidar com a varíola.

A sucção e o assopro também eram técnicas usadas pelos pajés. A importância do sopro é bíblica, lembram-se como Deus criou o homem? Se o pajé soprar a parte lesada, expele o mal. O sopro continua sendo usado pela medicina, é indispensável nos casos de reanimação cardiopulmonar (a compressão e o assopro podem devolver a vida). Na cosmogonia macuxim, Tupan assopra nas narinas de um boneco de barro.

Nos diz o beato Anchieta: “Estes feiticeiros e outros que não chegam a tanto, costumam esfregar, chupar e defumar os doentes nas partes lesadas e dizem que com isto os saram. E disto há muito por aqui...”

Sugavam os pontos que doíam, os lugares ulcerados, as partes feridas. Sugavam o ferimento das mordidas de cobra. Sugavam o fleimão, apostemas e perebas, para retirar o pus. Sugavam as feridas das flechadas. Uma drenagem natural e humana. Chupar sempre foi um recurso mágico.

A salva e a urina, como remédios naturais, foram usadas habitualmente pelos Tupinambás. O cuspe aplicava-se nos ferimentos como antisséptico e cicatrizantes. Aliás, essa prática continua popular. Quem não lambe as próprias feridas? O cuspe continua de grande serventia. A urina era utilizada para acalmar as dores no ventre, além ser um potente e infalível emético, usado para se provocar vômitos. Hoje já existem outros recursos.

Usavam os Tupinambás a hidroterapia dos romanos. O banho era um recurso terapêutico. Quando a febre aumentava, os índios atiravam-se na água fria. As massagens faziam parte do arsenal terapêutico. Nos conta Lycurgo: “o pajé molha as mãos com saliva, caldas de ervas, cinza quente, apalpa e fricciona fortemente o corpo paciente, provocando-lhe pela ação mecânica dores, suores profusos e até dejeções.”

O Jejum era outro recurso terapêutico, como prescreve as grandes religiões do mundo. Américo Vespúcio anotou: “quando enfermavam gravemente, os índios eram conduzidos para longe numa rede; bailavam ao redor do doente, deixando-o sem alimento por quatro dias ou mais.” Procedimento, aliás, de grande resolutividade.

Por fim, os Tupinambás faziam grande uso da fitoterapia. Disse Martius: “A mata é a farmácia desse povo”. Não por coincidência, foi no Século XVI que teve início a botânica cientifica. Em sua magnífica obra, “Systema Materia Medicae Vegetalis Brasiliense”, o mesmo Martius descreveu 470 plantas medicinais, das quais, mais de uma centena era usada pelos índios. Vários princípios ativos dessas plantas foram incorporados a farmacopeia moderna.

Nesse passeio pela medicina dos Tupinambás, se observa um sistema organizado e coerente com as crenças e visões que eles professavam, sobre as suas doenças. Essa narrativa ensinada nas escolas de que eram selvagens, primitivos; de quem se duvidava se eram mesmo humanos, se tinham alma; foi a forma encontrada pelos portugueses para praticarem o genocídio e o etnocídio, sem o menor peso na consciência cristã.

Antonio Samarone.

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