quarta-feira, 31 de janeiro de 2018

SABINO OLEGÁRIO LUDGERO PINHO - HOMEOPATA


SABINO OLEGÁRIO LUDGERO PINHO

Por Antônio Samarone.

Sergipano de Neópolis, nasceu em 11 de julho de 1820, no sítio Papa-Ovelha, perto do povoado de Ilha dos Bois. filho de Pedro José de Pinho e Anna Joaquina do Sacramento Pinho. Estudo o primário e o ginásio na cidade de Penedo. Em 1838, partiu para Salvador, onde concluiu os estudos preparatório. Em 1839, ingressou na Faculdade de Medicina da Bahia, concluindo o curso em 21 de novembro de 1845, defendendo a tese “Considerações acerca da música e suas influências sobre organismo”: Bahia, 1845, 56, págs. in. 4º gr. Tip. de José da Costa Vilaça.

As bases da homeopatia estabeleceram-se em 1818, quando Hahnemann publicou o “Organon da arte de curar da medicina racional”. A homeopatia chegou ao Brasil nos anos 1840, trazida pelo médico francês Benoît-Jules Mure, tendo rápida difusão pelas Províncias.
Sabino Pinho tornou-se seguidor da doutrina homeopática desde 1847, após ter sido tratado de uma doença grave pela homeopatia. Transferiu-se para Pernambuco em 1948, onde exerceu grande influência. 

Clinicou em várias Províncias do Norte. Durante a epidemia de cólera de 1855, em Recife, diante da ineficácia dos purgantes e vomitórios do tratamento da medicina alopática, que agravavam a desidratação e apressava a morte; Sabino Pinho divulgou amplamente um tratamento homeopático para enfermidade. A Homeopatia prescrevia três substâncias para o tratamento da cólera: o veratrum álbum, o cumprum metalicum e o arsenicum álbum. Foi grande a polêmica em Pernambuco, acreditava-se que a cólera só não acabou com a população de Vitória de Santo Antão, devido ao tratamento homeopático.

Sabino Pinho foi sócio efetivo da Sociedade Instrutiva; da Auxiliadora da Instrução e do Instituto Literário da Bahia; membro do Instituto Homeopático do Brasil e seu representante nas províncias do Norte; fundador e diretor da Escola Homeopática de Pernambuco; fundador das sociedades homeopáticas da Paraíba e do Maranhão; membro correspondente da Academia Homeopática do Rio de Janeiro; da Academia Médico-Homeopática do Brasil; do Instituto Homeopático de Paris; das sociedades Médicas Homeopáticas de França, Hahnemanianas de Paris e de Madrid; das Academias Homeopáticas de Turim e Palermo. Foi deputado por dois mandatos, na Assembleia Provincial de Pernambuco, em 1856 e 1863.

Notável cantor e exímio violinista. Escreveu: “A homeopatia e a cólera”,” Diário de um médico”, “Apontamentos para a História da Homeopatia”. Colaborou para o “Correio Sergipense”. Redigiu: “O médico do povo” (1850-51). Autor de vários trabalhos sobre a homeopatia: “vade-mecum do homeopata”, “Propaganda homeopática em Pernambuco”, “A homeopatia e a Cholera”, “Apontamento para a história da homeopatia”, entre outros. 

O doutor Sabino Pinho teve sua biografia escrita pelo irmão, bacharel Themistocles Belino de Pinho, publicado no “Jornal de Recife” entre os anos de 1860 e 1863. Foi o criador da famosa “Farmácia Sabino” em Recife/PE, falecendo no Arraial, subúrbio da capital de Pernambuco, a 17 de novembro de 1869, com 59 anos. 

quarta-feira, 24 de janeiro de 2018

A FEBRE AMARELA VEM DE LONGE.


A febre amarela vem de longe.

(texto: Antonio Samarone)

A história antiga da medicina não relata a febre amarela. A primeira epidemia só foi registrada em 1495, no Haiti, durante a segunda expedição de Cristóvão Colombo. No Brasil, a primeira epidemia de febre amarela aconteceu em 1685, no Recife. Esta Peste da febre amarela no Recife está descrita no “Tratado Único da Constituição Pestilencial de Pernambuco: primeira descrição dos "males" por João Ferreira da Rosa no século XVII”, tornando-se uma referência para o mundo.

Em decorrência desta mazela, iniciou-se em Recife a primeira campanha de Saúde Pública que se tem notícia no Brasil. Entre as providências, a purificação do ar se destacou: Cada grupo de cinco moradores ficou com a obrigação de acender uma fogueira com ervas cheirosas, durante trinta dias. Nas fogueiras se lançariam ramos de murta, incenso, almecega, bálsamo, óleo de copaíba e galhos de aroeira e de erva-cidreira. Existem dúvidas se a tradição de acender fogueiras no Nordeste tem a ver com Santa Izabel, mãe de São João Batista, ou com o combate às epidemias.

Entre as medidas de combate a epidemia de febre amarela no Recife, essa chama mais a atenção: “Por fim, far-se-ia o rol de todas as meretrizes para as despejar da terra para dez léguas de distância caso ofendessem a Deus, e os homens, livres ou escravos, que se achassem com elas em pecado seriam presos, pagando multa e sofrendo degredo, se reincidentes. E, finalmente, proibia que “mulher de qualquer qualidade” andasse sozinha nas ruas, depois das ave-marias. Somente em rede com suas escravas conhecidas; e sendo só, se estivesse em companhia do marido ou dos pais. Multa e açoites para quem desobedecesse a este artigo.”

Outra epidemia de febre amarela foi registrada na Bahia: Em 1686, aos “quatro dias andados do mês de abril”, surgiu o tifo icteroide na Bahia. Deram-lhe o nome de bicha, “pelo voraz e apressado do seu golpe” e porque a todos mordia. “No Brasil, os anos de 1849 a 1861 foram particularmente infaustos no que tange à febre-amarela. Durante esse período a doença se propagou do norte ao sul do País, eclodindo em quase todas as Províncias do Império e levando-lhes a desolação e o luto.”. Por conta desta epidemia ter chegado ao Rio de Janeiro, onde se tornou endêmica, foi criada a Junta Central de Higiene Pública. Ainda em 1850, foi diagnosticada em Sergipe, inicialmente na cidade de Itabaiana, uma febre igual à da Bahia.

Encurtando a história, no alvorecer do século XX, o Presidente Rodrigues Alves nomeou Oswaldo Cruz como Diretor da Saúde Pública, com o objetivo central de combater a febre amarela, que ameaçava as zonas portuárias, dificultando assim as exportações, item principal da economia. Usando dos novos conhecimentos sobre as doenças transmissíveis, dos métodos da chamada polícia médica e atacando frontalmente o mosquito (Aedes aegypti), o cientista conseguiu reduzir a zero a mortalidade pela doença, em menos de três anos. Entretanto, a febre amarela continua grassando pelo restante do país.
Em 25 de janeiro de 1929, o Governo Brasileiro assinou um contrato com a Fundação Rockefeller tornando-a responsável pelo combate à febre amarela, da Bahia a Amazônia, por todo o norte do país. A região Sul ficou a cargo do Departamento Nacional de Saúde Pública. Entre 1931 e 1939, o contrato foi estendido, e a febre amarela em todo país ficou a cargo da Fundação Rockefeller. Neste período, surgiram dúvidas quanto ao diagnóstico da febre amarela, muitas vezes confundida com a malária. A saída encontrada foi a viscerotomia, ou seja, colher fragmentos do fígado dos casos suspeitos. Inicialmente o material era colhido em cadáveres. Com os resultados encontrados, resolveu-se criar um aparelho, o viscerotomo, e passar a colher o material no fígado dos vivos.

Em abril de 1928, Dr. M. E. Connor, então Diretor do Serviço de Febre Amarela no Norte do Brasil, dera instruções a Dr. Mário Bião, em Estância, Estado de Sergipe, para a colheita rotineira de amostras de tecido hepático para o diagnóstico de febre-amarela. O povo da Estância serviu de cobaia para a implantação deste agressivo e cruento método, que se espalhou em pouco tempo por todo o Brasil. Daí surgiu o medo do povo pelo “papafigo”, que nada mais era que os antigos agentes sanitários puncionando o fígado dos viventes, no combate à febre amarela. 

Em 23 de janeiro de 1940 foi criado o Serviço Nacional de Febre-Amarela, passando à responsabilidade exclusiva para os sanitaristas brasileiros. O novo serviço, adotou no combate à febre amarela o sistema de flambagem das paredes internas das casas infestadas; o combate aos focos de larvas ou de ninfas, com a mistura de óleos Diesel e Fuel; e o combate à fase alada com a aplicação de inseticidas, por meio de bombas aspersoras manuais, no interior das casas onde fossem encontrados focos da estegomia (Aedes aegypti), e naquelas que estivessem dentro de um raio de 100 metros, em torno da casa com foco. Em 1947, o Serviço Nacional de Febre-Amarela iniciou o emprego do dicloro-difenil-tricloretano (DDT), no combate ao mosquito.

A Lei n.º 1.920, de 25 de julho de 1953, criou o Ministério da Saúde, desmembrando-o da Educação. Em 07 de março de 1956, foi criado o Departamento Nacional de Endemias Rurais (DNERu), absorvendo os Serviços Nacionais de Malária, Peste e Febre-Amarela.  O sucesso da atuação da Saúde Pública permitiu que, em setembro de 1958, na XV Conferência Sanitária Pan-Americana realizada em Porto Rico, o representante do Brasil, Dr. Luiz Ferreira Tavares Lessa, declarasse erradicado do Território Brasileiro o mosquito Aedes aegypti. Esta declaração foi aceita pela Resolução XXXV daquela Conferência Sanitária, em 2 de outubro de 1958. Somente em 1967, surgiram notícias da reinfestação do Aedes aegypti, na cidade de Belém do Pará.

Em 22 de maio de 1970, com a fusão do DNERU com outros órgãos de Saúde Pública, criou-se a Superintendência de Campanhas de Saúde Pública (SUCAM), onde tive a felicidade de estagiar durante o ano de 1979. A SUCAM deu continuidade ao relevante trabalho do DNERU.

Para concluir, após séculos de combate as epidemias, com o desmonte da Saúde Pública, o Brasil voltou ao desespero de uma nova ameaça da febre amarela. Estamos desprotegidos. Por ironia, os maiores riscos surgiram em estados ricos (São Paulo, Rio de Janeiro e Bahia); mas todo o Brasil está ameaçado pelas velhas doenças tropicais. E quando começa o desmonte da Saúde Pública?
Exatamente em 1990, Governo Sarney, quando a SUCAM foi incorporada a FUNASA, ou seja, extinta na prática. A responsabilidade pelo combate à febre amarela passou para os munícipios, ou seja, foi entregue às baratas. As redes municipais de saúde são perdulárias e incapazes, via de regra. Se não bastassem a dengue, chikungunya e zika; a velha febre amarela renasceu, ainda em sua forma rural, mas tendo tudo para se tornar urbana. O único recurso que atualmente dispõe a Saúde Pública é a vacinação. Viva Oswaldo Cruz.

Fonte principal: História da Febre Amarela no Brasil, Odair Franco.

sexta-feira, 12 de janeiro de 2018

O nascimento da oftalmologia no Brasil. (Apontamentos).


O nascimento da oftalmologia no Brasil. (Apontamentos).


Nas primeiras décadas do século XIX, a oftalmologia era apanágio dos cirurgiões aprovados, que realizavam operações de catarata, de fístula lacrimal e enucleação do globo ocular.  Os naturalistas Spix e Martius, relatam o tratamento de moléstias dos olhos, por volta de 1818. Em Recife, o médico Henrique Krause, anunciava realizar qualquer tipo de operação nos olhos. As patologias oculares mais frequentes eram: conjuntivite, terçol, sapiranga, blefarite, arcus sinilis, oftalmia purulenta e tracoma. Entre os medicamentos da flora brasileira usados nas oftalmias citamos: suco de cansanção, sumo de brotos de umbaúba; contra manchas brancas nos olhos usava-se esterco de jacaré. Já se lavava os olhos com água boricada.  Em 1854, fundou-se no Rio de Janeiro, o Imperial Instituto dos Meninos Cegos. Pelas bandas de Sergipe, José Lourenço de Magalhães, José Correia de Melo Bitencourt e Antônio Militão de Bragança são os primeiros médicos a tratarem das doenças dos olhos. (fonte: Lycurgo Santos)

O primeiro serviço público destinado ao tratamento das moléstias dos olhos foi criado em 1858, pelo Marquês de Abrantes, provedor da Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro. O serviço foi entregue ao conceituado médico ítalo-francês Carron Du Villards. Nascia então a chamada 1ª enfermaria da Santa Casa, onde nasceu a oculística cientifica dando início a oftalmologia no Brasil. Foi também nessa enfermaria que surgiu a cátedra de oftalmologia da Faculdade Nacional de Medicina, em 1883. O primeiro professor a ocupar a cadeira foi Hilário Soares Gouveia. Quem foi o Dr. Charles Joseph Fréderic Carron Du Villards, fundador da oftalmologia no Brasil?

Quando chegou ao Brasil em 1857, Carron Du Villards, com 57 anos, já era um oculista famoso no Velho Mundo. Autor de um Tratado de Oftalmologia (Guide Pratique pour l’étude et le traitement des maladies des yeux), tinha implantado e dirigido um dispensário de oftalmologia em Paris, sido assistente dos cursos de oftalmologia ministrado por Lisfranc.  Carron Du Vilards possui vários trabalhos científicos publicados no “Annales d’Oculistique”. Doutor em medicina e membro da Academie Royale des sciences del Turin. Mesmo já estabelecido e conceituado na França, Carron Du Villards era um apaixonado por viagens. A partir de 1848, partiu percorrendo vários países, buscando novas experiências, até chegar ao Brasil.

Carron Du Villards nasceu em 1800, na Savoia, doutorou-se em Turim aos 20 anos, filho do médico militar sardenho, Carlo Giacono Luigi Carron, foi discípulo de Antonio Scarpa, maior nome da oftalmologia italiana. Em 1832, transferiu-se para a França, onde naturalizou-se. Faleceu no Brasil, em 02 de fevereiro de 1860, sendo sepultado no cemitério São João Batista. Com a morte de Carron Du Villards, comandaram essa enfermaria oftalmológica da Santa Casa, pela ordem, os renomados Joaquim Antonio Araújo e Silva (Barão do Catete) – 1860/1863;    Manoel da Gama Lobo – 1863/1867;  Hilário de Gouveia, Pereira da Cunha, Fernandes Pires Ferreira e o professor Octávio do Rego Lopes. Foi dessa enfermaria, que a partir de 1898, o médico sergipano José Antonio de Abreu Fialho comandou por 40 anos a oftalmologia brasileira. Em seu gabinete de trabalho, destacava-se um mapa de Sergipe, emoldurado, e posto em destaque na parede. Abreu Fialho foi assistente do Professor Pires Ferreira. Desse serviço saíram os melhores professores e profissionais de oftalmologia brasileira.

José Antonio de Abreu Fialho nasceu em 20 de janeiro de 1874, em Aracaju, filho de Tito de Abreu Fialho e Maria José de Abreu Fialho. Formou-se no Rio de Janeiro em 1896. Dois anos depois, com apenas 24 anos, foi aprovado em concurso público para a cátedra de oftalmologia. Em seguida, marchou para Viena, onde cursou por 2 anos, a especialização em oftalmologia na Clínica de Fuchs, o melhor serviço do Velho Mundo. Em 1918, Abreu Fialho convocou e dirigiu o Congresso Brasileiro do Tracoma, sendo o primeiro a chamar atenção para esse grave problema de Saúde Pública. Em 1922, fundou e dirigiu até a sua morte, a Sociedade Brasileira de Oftalmologia. Em 1928, lançou os “Anais da Oculística” e assumiu a direção da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, convidado pelo Presidente Washington Luís. 

Por ocasião da posse como Diretor da Faculdade de Medicina, Abreu Fialho enfatizou em seu discurso: “Quero a dignidade do ensino e no ensino. Ser útil, sem exceção, a quem ensina e a quem aprende. Quero elevar-me ao cimo das paixões humanas; com o ideal da beleza moral diante dos olhos, para cuidar com afinco dos deveres do meu cargo; sem ódios nem rivalidades que amesquinham os homens; sem desagravos a desagravar, sem contas a ajustar; sem dar ouvidos a estas palavras que o vento traz pela boca dos noveleiros; sem otimismos cândidos, sem confianças ilimitadas, antes sempre preso às realidades, e vigilante na guarda da coisa pública que me foi confiada”.

Segundo Sylvio Fialho, “a atividade de José Antonio de Abreu Fialho – na enfermaria, na cátedra, nas academias, nas revistas médicas, na imprensa, nos congressos, nas sociedades sábias, na administração – mas o grande cenário da sua vida sempre foi o seu consultório, na Rua dos Ourives, onde ele clinicou durante quase quarenta anos, e em cujos arquivos ficou a história da vida de um grande médico”. “Cerca de quatrocentos mil doentes, no consultório e no hospital, desfilaram diante do professor famoso, gente de todas as raças e de todas as condições sociais, vindas não raro de longes confins, atraídas pelo renome da sua ciência e da sua honestidade profissional. Sabiam que da sua boca só ouviriam a verdade, não ignoravam que o interesse mercantil jamais toldara a consciência daquele profissional, que sempre teve em estandarte a honradez e a probidade. Para Abreu Fialho, que cultuava acima de tudo a sua profissão, e a queria cada vez mais dignificada e respeitável, tanto valia o cliente rico quanto o pobre, o humilde tanto quanto o poderoso, nivelados todos pelo denominador comum dum sofrimento igual”.

Seu amor a medicina e o desapego ao poder, fez Abreu Fialho rejeitar o convite do Presidente Arthur Bernardes para governar Sergipe, e em seguida o mandato de Senador por oito anos; de forma consensual com todos os Partidos, sem precisar participar das disputas eleitorais. As frações em disputa em Sergipe queriam um nome de fora da política e com boa fama.  Abreu Fialho foi presidente do Centro Sergipano, no Rio de Janeiro. Faleceu em 17 de março de 1940.
Antonio Samarone.

quarta-feira, 10 de janeiro de 2018

QUAIS OS PROJETOS DAS ESQUERDAS PARA O BRASIL


Quais os projetos das esquerdas para o Brasil?

Entre os aspectos da crise brasileira, a falta de propostas para o futuro é pouco discutida. Como sairemos desse buraco? Os debates giram entre dois caminhos inviáveis: o grupo no poder acredita no projeto neoliberal, no estado mínimo em sua forma mais extrema, com supressão de direitos trabalhistas e previdenciários, redução de políticas sociais, privatizações, inclusão pelo mercado e na redução de impostos e concessão de subsídios às empresas.  É a crença na mão invisível do mercado. Eles acreditam que criado esse ambiente favorável aos lucros, o capital internacional destinaria os seus investimentos para o Brasil. Seria a nossa redenção econômica. Sem entrar na discussão de doutrinas econômicas, se a concentração de renda e o aumento da desigualdade é um caminho para o desenvolvimento, não creio que a maioria da população esteja disposta a esperar o bolo crescer. Depois a divisão nunca acontece. Esse projeto exige um longo período de privações, que inviabiliza a sua sanção nas urnas. 

Uma segunda força política, liderada por Lula, acena com a repetição da democratização do consumo, através da melhoria da renda e facilidades do crédito, o chamado nacional consumismo. Um modelo de desenvolvimento que amplia o consumo dos excluídos, sem cuidar da produção, um tipo de populismo econômico. A ascensão social através do consumo, propiciou o surgimento da famosa Classe C. Um ciclo de riquezas fáceis, que no Brasil foi sustentado pelas commodities: a agricultura, a pecuária e a mineração. Esse período de riqueza acabou, mas deixou boas lembranças nas massas. Uma conjuntura onde todos ganharam, em especial os mais ricos. Uma composição sustentada por um grande consenso político, onde poucos ficaram de fora. A tese é que o aumento do consumo criaria um mercado nacional e induziria a produção. O fim desse projeto de nacional consumismo se deu no Governo Dilma, com a alteração da conjuntura econômica, desvalorização das commodities, agravamento de crise fiscal, fim do consenso político e o golpe jurídico parlamentar. A crise tem se aprofundado, sobretudo pela extensão dos envolvidos com a corrupção, recessão econômica e protagonismo político do judiciário. Não existem inocentes nesse jogo.

A novidade fica por conta do surgimento de uma terceira alternativa de desenvolvimento, proposta e detalhada por Mangabeira Unger, em entrevista a Caetano Veloso, na Mídia Ninja. ( https://www.youtube.com/watch?v=Mfv-4zQ9_Q0 ).  O que propõe Mangabeira? A democratização da economia pelo lado da produção, da oferta e das capacitações. Segundo ele existe uma imensa vitalidade no povo brasileiro, sufocada pelas elites dirigentes. Seria necessário então, resgatar da informalidade e da precarização a maioria da nossa força de trabalho e transformar a relação do sistema financeiro com a produção, gerando um produtivísmo includente. A segunda esfera de mudanças seria na educação, a transformação do enciclopedismo raso e dogmático atual num ensino analítico, capacitador e dialético.

Continua Mangabeira: o equilíbrio fiscal do estado brasileiro será necessário, não para ganhar a confiança do mercado financeiro, mas para não depender dele. O estado brasileiro precisa de autonomia para liderar esse projeto de desenvolvimento. O sacrifício só será legitimado dentro de um projeto de democratização das oportunidades e das capacitações. A reforma da política seria a consequência de um projeto forte do estado brasileiro. A base social desse projeto seria formada pelos emergentes, a classe média empreendedora, e a massa pobre que quer seguir esses emergentes; o segundo aliado seria formado pela associação do capital produtivo com o trabalho, contra o rentísmo do capital financeiro; o terceiro aliado seria constituídos pelas regiões, o Brasil profundo, que está à espera de uma solução. “O Brasil é um caldeirão que fervilha de energia humana desperdiçada”, afirma Mangabeira Unger. O povo está disponível, falta quem aponte um rumo certo. Esse projeto está sendo defendido politicamente por Ciro Gomes, uma herança do trabalhismo brizolista.

Claro, não abordei outros projetos por desconhecimento. O que pensam os outros Partidos de esquerda sobre as saídas para o Brasil? Não sei!
Antonio Samarone.

terça-feira, 9 de janeiro de 2018

A GESTÃO DA SAÚDE (quem manda?)


A GESTÃO DA SAÚDE (quem manda?)

Diante do cipoal do SUS, sua inoperância, do sofrimento dos pacientes, dos gastos indevidos, vamos pensar numa questão: qual o papel da burocracia no Sistema? Vamos aos fatos: Os aluguéis faraônicos das sedes das secretarias de Saúde é a parte visível, a que levanta suspeitas, a que causa indignação. Mas o problema é anterior, vamos a ele.

Os sistemas de saúde existem para prestar serviços à sociedade, enfrentar os problemas e atender a quem precisa. No Brasil, esses serviços foram organizados por uma burocracia hipertrofiada e poderosa. É muita gente administrando, pensando, planejando, mamando, analisando, supervisionando, vagando, avaliando, mandando, ensinando, para uns poucos executarem. Tem muito cacique! Cada tema tem uma coordenação, um chefe e vários cargos comissionados. São infinitas assessorias: jurídica, contábil, financeira, comunicação, política, técnica, comunitária, marketing, logística, etc. Cada rede de atenção tem outros chefes, cada um com as suas siglas e regalias. São diretores, adjuntos, gerentes, coordenadores, supervisores a perder de vista.

Tem mais: essa numerosa burocracia viaja muito e se atualiza regularmente. Vive em seminários, palestras, oficinas, conclaves, mesas-redondas, conferências, em regime de capacitação permanente. As regalias nos vencimentos são assustadoras, em média, 70% acima dos mortais que estão se esfolando na linha de frente. Parece que na prática são dois SUS. De um lado, essa burocracia, ciosa dos seus direitos; e do outro, uma massa de trabalhadores se virando para atender bem, e quando não conseguem, arcando com a justa ira popular.

Por último, essa burocracia se afastou completamente da rede de atenção, dos que executam. Os mandarins não precisam de quem está prestando serviços e muito menos dos usuários. O poder dessa burocracia provém de suas ligações políticas, do elevado saber que cultuam e das influências que cultivam. Tem gente que entra e sai dessa corte sanitária sem pôr os pés numa unidade de saúde. Por outro lado, quem está nas unidades trabalhando não presta a menor atenção aos gestores. Entra equipe, sai equipe, e o nível local fica sabendo pela imprensa. O nível local tem lógica própria. A governabilidade do nível central é muita baixa. São dois subsistemas autônomos e profundamente desiguais: um com conforto, prestígio e regalias; o outro sobrecarregado, esquecido e criticado.

Entenderam por que a burocracia funciona em prédios suntuosos e caros, e os trabalhadores diretos permanecem em maltratadas unidades?
Antonio Samarone.

sábado, 6 de janeiro de 2018

SANTO ANTONIO FUJÃO


SANTO ANTONIO FUJÃO 

As primeiras sesmarias doadas na região de Itabaiana, datam da primeira metade do século XVI. Logo chegaram os colonos. Uma vez estabelecidos, construíram uma pequena capela (igreja velha), no Vale do Rio Jacarecica. formou-se um pequeno Arraial. Em seguida, pleitearam a transformação do Arraial em Villa. Para tal, era necessário: igreja, cadeia pública e câmara municipal. Antes precisava-se de um terreno público para a instalação da Vila. Criou-se a “Irmandade das Almas” – juntou-se o dinheiro e compraram um sítio a Sebastião Pedroso de Goes, padre de São Cristóvão. Ocorre que o sítio, chamado Caatinga de Aires da Rocha, ficava em local árido, sem água.

Como convencer os colonos a transferirem a capela de uma área fértil, nas margens de um rio, para a Caatinga de Ayres da Rocha, um local inóspito? Só que o padre que vendeu o sítio era o mesmo que celebrava as missas, e não teve dúvidas. Passou a levar o Santo Antonio durante a noite para debaixo de uma quixabeira, no local onde ele queria que fosse a nova igreja, no sítio que ele vendeu. Em seguida o santo era dado por desaparecido, até que alguém o encontrasse debaixo da quixabeira, e para glória do santo, fazia-se uma procissão levando o santo de volta para a igreja velha. Esse fato se repetiu várias vezes. Botava-se o santo na igreja velha e ele a noite fugia para a quixabeira.

Qual foi a versão do padre: gente, Santo Antonio não quer ficar na igreja velha, no Vale do Jacarecica. Não adianta forçar, a gente traz o santo, e pela noite ele foge para debaixo da quixabeira. O jeito é construirmos uma nova igreja ao lado da quixabeira. Assim foi feito, e Itabaiana foi transferida para a sede atual, por insistência de Santo Antonio fujão. Quem escolheu o local definitivo foi o santo.

Essa quixabeira existiu até o início do século XX. Eu conheci gente que conheceu a famosa quixabeira. Não sei quem, mas um espírito de porco qualquer, em nome do progresso, da modernidade, derrubou a quixabeira. Agora, quase cem anos depois, a Associação Sergipanas de Peregrinos, com sede em Itabaiana, liderada pelo engenheiro Ancelmo Rocha, tomou a iniciativa de replantar a quixabeira no mesmo local da antiga, e solicitou autorização ao Prefeito Valmir de Francisquinho. No domingo, esperamos a presença do Prefeito, e das demais autoridades: civis, militares e eclesiásticas.

A solenidade de plantio da quixabeira será no próximo domingo, as 7 horas, defronte à igreja de Santo Antonio e Almas de Itabaiana, para a qual estão todos convidados. Sei que é de última hora. Mas a muda foi comprada no interior da Paraíba (foto), já chegou, e não pode ficar esperando pela burocracia. Portanto, TODOS CONVIDADOS: Academia de Letras, CDL, Rotary, filarmônica, ambientalistas, e o povo em geral.
Antonio Samarone.
Fonte: os livros de Vladimir Carvalho.

terça-feira, 2 de janeiro de 2018

POLÍTICA EM SERGIPE - O livro de Ibarê Dantas.


Política em Sergipe – O livro de Ibarê Dantas.

A pretexto de escrever uma biografia, o historiador Ibarê Dantas, em seu novo livro – “Leandro Maciel na Política do Século XX”, traçou um consistente perfil da política sergipana, no período entre a revolução de 1930 e a ditadura militar; correspondendo ao início da vida pública de Leandro Maciel, em 1926, como diretor de obras públicas do Estado; e ao seu melancólico fim, em 1974, na humilhante derrota para o médico Gilvan Rocha, na disputa para o Senado.

Um livro da maturidade do escritor. Cuidadoso com os dados e as fontes, isento, minucioso, com uma escrita leve, contrariando a visão dominante no Brasil, que só os jornalistas escrevem bons livros de história. O livro do historiador Ibarê Dantas é bom e bem editado.

Ao traçar a disputa pelo poder num estado periférico, o livro de Ibarê Dantas retrata a caminhada de um grande político. Um chefe político dentro do antigo manequim da República Velha. Astucioso, zeloso com o seu prestígio, fiel e tolerante com os correligionários; implacável e violento com os inimigos. Leandro Maciel foi um conservador ilustrado, que disputou o poder por quase meio século, com um programa de desenvolvimento para Sergipe na cabeça. Leandro acreditava que o desenvolvimento de Sergipe seria pelo caminho da industrialização. O livro analisa a disputa política em conjunturas distintas: revolução de 1930, estado novo, populismo e ditadura militar. Como Leandro Maciel sobreviveu em cada conjuntura.

A parte mais substantiva do livro, que transcende aos objetivos das histórias locais e das biografias, é a descrição de uma sociedade civil numa conjuntura hegemonizada pela política. Os conflitos, os embates, os avanços e recuos ocorrem no campo da política. Mesmo em períodos de exceção, o legitimador das decisões continuava sendo a política, nesses casos, uma política autoritária. O livro permite aos mais jovens uma comparação com a atualidade, onde a esfera política está deslegitimada, criminalizada, onde o voto direto e secreto deixou de ser a fonte de poder, e as eleições livres estão eivadas de suspeitas. Vivemos numa era da usurpação do poder emanado do povo, como rezava os velhos textos republicanos. Parte da sociedade acredita que a única forma de legitimação do agente público é o concurso.

A deslegitimação da esfera política e a consequente perda de prestígio social dos seus agentes, atendem aos objetivos da esfera econômica, sobretudo do capital financeiro globalizado, que precisa de liberdade de ação e exploração, e que a nada respeita, nem normas nem fronteiras. Os humores e as idiossincrasias do mercado são apresentados como uma lei da natureza, uma força física, a qual devemos nos submeter. Os interesses do capital financeiro aparecem como princípios de uma realidade científica. O livro do professor Ibarê Dantas retrata uma conjuntura anterior, onde as contradições e os interesses de classes eram decididos no campo da política. Para que não haja mal-entendidos, duas observações: não estou fazendo juízo de valor sobre a natureza da política da época, apenas uma constatação; e claro, tratava-se de uma política excludente das massas subalternas (operários, camponeses, lúmpen, etc). Essa é outra discussão.

O livro “Leandro Maciel, na Política do Século XX”, do intelectual Ibarê Dantas, além da biografia de um personagem relevante, o livro trata da história, da vida e dos costumes da Província de Sergipe d’ El Rey no período; e ainda traz um belo estudo de caso de ciência política. Uma pena tratar-se de uma tiragem reduzida, sem distribuição nacional. Muita porcaria tem sido publicada pelas grandes editoras nacionais. Nesse caso, é o preço que se paga por se pensar a partir da periferia.
Antonio Samarone.