terça-feira, 29 de junho de 2021

MORREU FRANCIS DE ANDRADE


Morreu Francis de Andrade, a Voz da Democracia.
(por Antonio Samarone)

José Francisco de Andrade (Francis de Andrade), morreu da Peste pandêmica, aos 62 anos.

Francis de Andrade, nasceu em Santos, e chegou em Itabaiana com 10 anos de idade. Um meninão diferente, de calças curtas e suspensório. Filho de Seu Brió e Dona Juanita. Moravam numa casa bonita, com muro baixo e varanda, na esquina da Praça de Eventos.

Zé de Brió (o nome de menino) teve o seu avô paterno, Luiz Pereira de Andrade, assassinado pela polícia na porta da Igreja Matriz de Itabaiana, em 1916, durante as trezenas de Santo Antonio, por conta do conflito do Coronel Sebrão com o Cônego Vicente Francisco de Jesus.

As raízes de Zé de Brió em Itabaiana são profundas.

Zé de Brió terminou o segundo grau no Murilo Braga. Foi um autodidata de grande inteligência. Nunca puxei um assunto, para ele está desinformado. Nasceu para o rádio.

Antes, Zé de Brió foi telefonista da Telergipe. Sempre com uma voz poderosa, talhada para a locução.

Quando a Radio Princesa da Serra foi inaugurada (13/06/1978), Zé de Brió já participou da primeira equipe. Juarez do Correio montou uma equipe local, por bairrismo e economia.

Chamou os que falavam bem em serviços de alto-falante: Djalma Lobo, Messias Santos (Taquari), Fernando Pinto (do Campo do Brito), Aloiso Santos (do Saco do Ribeiro), Daniel Barros e Gilson Portela. Tentaram até o iconoclasta Zé de Álvaro.

Depois é que chegou João Batista (um profissional), ganhando a fábula de seis salários-mínimos.

Foi na Rádio Princesa da Serra que Zé de Brió começou, como disc jockey, imitando o grande Francisco Carlos, o Chicão da Paradinha, sucesso daquele tempo. Nesse momento surgiu o radialista Francis de Andrade, o nome artístico de Zé de Brió.

Depois foi trabalhar na FM – Itabaiana (93.1), onde atuava até ontem, com grande audiência. Ia esquecendo, foi locutor esportivo, no mesmo nível de Jorge Cury e Waldir Amaral.
A entrada na política foi uma consequência da entrada da Princesa da Serra na política. Fez parte das mudanças em Itabaiana.

Francis de Andrade, a voz da democracia, exerceu 4 mandatos de vereador em Itabaiana, chegando a ser o Presidente da Casa. No final do mandato de Presidente, deixou nos cofres da Câmara 116 mil reais, uma novidade.

Foi o maior animador de palanque político que eu conheci. Com Francis de Andrade, não existia tristeza em comícios.

Francis de Andrade, nunca teve papas na língua. Carismático, tocava fundo e com ironia nas mazelas de Itabaiana e do mundo.

Era muito inteligente, culto e de privilegiado tirocínio. Rápido nas improvisações, desconcertantes nos debates e cheio de trocadilhos.
Francis de Andrade foi um talento no rádio, desperdiçado na Província.

Francis de Andrade foi um homem livre. Usava a maconha recreativa, com um fundo cultural profundo. Já naquele tempo, em Itabaiana. Não pensem que era fácil.

Espirituoso criador de apelidos. Em Itabaiana tinha um político que vivia em cima do muro, nem cheirava nem fedia, Francis de Andrade o denominou de “Bufa de Alma”.

Tem outros apelidos que eu não posso contar.

Minha homenagem e admiração a Francis de Andrade, talento do rádio sergipano.

Deixou seis filhos.

Antonio Samarone (médico sanitarista).


 

A REVOLUÇÃO DOS BICHOS


A Revolução dos Bichos.
(Por Antonio Samarone)

Em 19 de julho de 1979, Eu estava no ECEM (Encontro Científico dos Estudantes de Medicina), na Universidade Federal da Paraíba. Comemorei efusivamente a queda do sanguinolento ditador Anastácio Somoza (45 anos no poder).

Era a Revolução Sandinista!

Eu estampei no peito o “botton” da Frente Sandinista de Libertação Nacional (FSLN). Uma revolução ampla, marxistas e cristãos juntos (Teologia da Libertação). Prometiam um reino de liberdade na Nicarágua.

Sérgio Arouca, a maior expressão do movimento sanitário brasileiro, ajudou na elaboração da política de saúde da Revolução Sandinista.

A Frente Sandinista foi assim chamada em homenagem ao líder de esquerda, Augusto César Sandino, assassinado em 1934, por tropas americanas que invadiram a Nicarágua.

A Revolução Sandinista governou a Nicarágua até 1990, sob a liderança de Daniel Ortega, quando foi derrotada nas urnas por Violeta Chamorro.

Até então o discurso era perfeito. Uma revolução democrática, que aceitava até o revezamento no poder.

A Nicarágua vivenciou a sua experiência neoliberal, após o período revolucionário.

Os Sandinistas voltaram ao poder em 2007, com a eleição de Daniel Ortega. O líder nicaraguense reassumiu prometendo combater o capitalismo selvagem e o neoliberalismo, que haviam sido implantados depois de 1990.

De lá para cá as coisas não andaram bem com a economia nicaraguense. O capitalismo é global e sufoca qualquer sonho alternativo.

Resta à esquerda latino americana, populista ou não, quando governa, dar uma face humana ao capitalismo periférico?

É a história da América Latina nos últimos anos: a esquerda tentando, sem sucesso, superar séculos de injustiças e desigualdades. Com pequenos avanços e grandes retrocessos.

O PT governou o Brasil por 13 anos, sem mexer com o projeto neoliberal. Pelo contrário, contribuiu para o seu fortalecimento. A justiça social foi uma distribuição de renda possível, limitada, sem mexer nas estruturas.

A famosa classe “C” desapareceu com a mesma rapidez como surgiu. Claro, mesmo assim foi um pequeno e efêmero avanço.
Os governos de direita na América Latina, geralmente, cuidam da violência e do saque das riquezas nacionais. Desconheço qualquer experiência bem-sucedida. O Brasil está atravessando uma forte tempestade.

Não conheço os detalhes da luta política na Nicarágua. Acompanho de longe. Mas parece que a revolução sandinista começou como uma crônica de García Márquez e está terminando como como a Revolução dos Bichos, livro de Orwell.

Às vésperas de uma nova eleição na Nicarágua (em novembro de 2021), Daniel Ortega, da FSLN, busca a quarta reeleição, depois do retorno em 2007.

A direita acusa Ortega de repressão política. A FSLN diz que está prendendo criminosos.

A grande imprensa aponta vícios no processo eleitoral e acusam Daniel Ortega, líder de uma revolução esperançosa, de estar repetindo a tirania de Anastácio Somoza.

A FSLN diz estar construindo uma Nicarágua mais justa. O velho conflito liberdade/igualdade.

A luta política passa principalmente pela disputa de narrativas.

Antonio Samarone (médico sanitarista)


 

domingo, 27 de junho de 2021

CENÁRIOS PÓS PANDÊMICOS


Cenários Pós Pandêmicos
(por Antonio Samarone)

A humanidade nunca experimentou um isolamento social tão longo, contrário a condição humana.

A desobediência sanitária ao isolamento é uma forma de resistência natural, tratada pela mídia como irresponsabilidade.

Viver é estar entre os homens” (inter homines esse).

As consequências psicológicas, comportamentais e culturais desse longo isolamento, em especial para os idosos, serão profundas.

A virtualidade das redes sociais tornou-se a realidade possível. O isolamento, que destrói a esfera comum e impede a ação humana,
é um pré-requisito da tirania.

O Pós-Pandemia não acena com a liberdade.

“O que nos salva da futilidade da vida é o desejo de estar vivo promovida pela ação política, cujo impulso brota do desejo de estar na companhia dos outros, do amor ao mundo e da paixão pela liberdade.” – Hannah Arendt.

O totalitarismo é a destruição da política. Enquanto a monarquia funda-se na honra e a república na virtude, o totalitarismo se assenta no medo.

Para Teseu, fundador de Atenas, o que permitia ao homem comum, ao jovem e ao velho, suportar o fardo da vida: “era a pólis, o espaço dos livres feitos e das palavras vivas do homem, que poderiam dotar a vida de esplendor”.

O isolamento social prolongado é uma matriz de transtornos mentais, já observados.

As sequelas orgânicas e o longo período de recuperação para os que tiveram as formas graves da enfermidade, exigem do sistema de saúde uma atenção especial.

Entretanto, aqui surge um risco iatrogênico: alterações comportamentais, decorrentes das transformações sociais em curso, também serão medicalizadas, tratadas quimicamente. Aliás, já está ocorrendo.

O sofrimento pelo qual a sociedade é a responsável, será privatizado e psicologizado. As condições sociais serão ocultadas.

Devem-se melhorar a alma!

A psicologia positiva encarregar-se-á da motivação. Nada de raiva, descontentamento com as condições sociais, a saída encontra-se no esforço de cada um, em apreender o caminho da vitória.

“Numa sociedade onde o bem-estar é obrigatório, a felicidade pode ser medicamente produzida. Drogas usadas paliativamente, serão de uso corrente por pessoas saudáveis.” Chul-Han

O Pós-Pandemia não promete bem-estar e felicidade.

Antonio Samarone (médico sanitarista)