domingo, 29 de setembro de 2019

ÓLEO DE RÍCINO


Óleo de Rícino (por Antônio Samarone)

O fastio em crianças, real ou imaginário, era um alerta de alguma enfermidade. No mínimo, uma infestação por lombrigas. Para tratar o fastio havia uma terapêutica tríplice: remédio de verme, purgativo e um bom fortificante.

Quando mamãe cismava que eu estava com fastio, tomava a decisão: “vá no bodega de Zé Meu Mano e compre um copo de óleo de rícino. Leve o copo. Só serve o de Neópolis, da fábrica Cravo & Cia. Eu já voltava enjoando com o cheiro!

Entres os purgantes o mais popular era o óleo de rícino. Um óleo amarelado, espesso, viscoso, cheiro e sabor desagradáveis. Aqui residia a tortura. Desagradável mesmo! Eu fechava o nariz e engolia de vez, sob terrível ameaça: tome logo, para ficar livre.

Para reduzir a vontade de vomitar, chupava-se uma banda de limão, para se tirar o gosto do óleo de rícino da boca. Eu imaginava que no inferno, além do fogo, se usava óleo de rícino três vezes ao dia.

Em menos de três horas, o cristão se desmanchava, mudava-se para o sanitário, era oito horas de purgação. Ao final, ficava-se prostrado, olhos fundos, certamente pela desidratação. No dia seguinte, mamãe entrava com Biotônico Fontoura, o fortificante.

Em quinze dias o fastio acabava.

Para os mais novos: o óleo de rícino é extraído da mamona (Ricinus communis), vendia-se em farmácias, drogarias e bodegas. Minha mãe usava uma dose de 100 ml, meio copo. O indicado era 15 ml.

Não é atoa que quando um sujeito é muito chato ainda dizemos: fulano de tal é um purgante.

Antônio Samarone.


quinta-feira, 26 de setembro de 2019

AFETOS DE VIOLÊNCIA.


Afetos de Violência. (por Antônio Samarone)

Estranho, numa conversa descontraída com um colega médico, fiz um desabafo: o governo do Rio de Janeiro matou 1.249 pessoas em nove meses. Todos negros e pobres. Por último, fuzilou a menina Ágatha Vitória Sales Félix, de 8 anos. Isso é um genocídio!

Ele reagiu: “o governo está certo. Bandido, com fuzil engatilhado, tem que morrer. Temos que fuzilar todos!” Ele se identificou de imediato com o genocídio. “Temos”?

Eu retruquei, você acha que os 1.249 mortos estavam armados de fuzil, inclusive as crianças?

Ele não se intimidou: “era tudo bandido!” “Um ou outro inocente, acontece, mas é assim mesmo, na guerra também morrem inocentes.”

Ainda sentenciou, com a voz exaltada: “essa balela de direitos humanos não se aplica no Brasil. Ou matamos essa gente ou não teremos segurança!”  

Comecei a perceber que o diálogo tinha ficado impossível. 

Antes de me afastar, ainda ouvi: “estávamos à beira do socialismo, ainda bem que acordamos há tempo.”

Retruquei, que socialismo mal-assombrado? Somos o país mais desigual do mundo. O PT governou seguindo o manual do neoliberalismo e dos banqueiros, basta lembrar quem foi o Ministro da Economia de Lula. O PT governou em aliança com gatos e cachorros. O vice era Temer.

O doutor encerou o assunto, com o sorriso dos vencedores: “Comunismo, nunca mais!”

Percebi: é morte do diálogo! A luta será longa...

Antônio Samarone.

sábado, 21 de setembro de 2019

ONDE NASCE O SOL?



Onde nasce o sol? (por Antônio Samarone)

Gente que nunca acreditou no capitalismo, muito menos na viabilidade em dar-lhe uma “face mais humana”, vamos ouvir os jovens.

O enfrentamento contra o capitalismo financeiro, globalizado, em sua forma mais perversa (o neoliberalismo) não se faz com formas antigas de luta. É ineficaz!

Gente a luta é a mesma, mas os caminhos são outros.

A velha mensagem de Belchior “Não preciso que me digam de que lado nasce o sol/ Por que sei que bate lá meu coração” perdeu a validade. O sol está nascendo em outros lugares.

Vamos ouvir os jovens!

A mensagem de Greta Thunberg:

“Os adultos não param de dizer ‘temos a obrigação de dar esperança aos jovens’. Mas nós não queremos a esperança deles. Não queremos que tenham esperança. Queremos que sintam pânico e façam algo.”

A mudança de vida desejada pelos jovens não é compatível com o neoliberalismo.

A forma de luta dos jovens também é outra. Eles não precisam de heróis!  "Infeliz a nação que precisa de heróis.” (Brechet).  

Eles fizeram uma “Greve Mundial pelo Clima”, e não vão desistir. A questão ambiental tornou-se uma luta anticapitalista. A proposta é de um novo modo de vida, em um mundo bem melhor.

Antônio Samarone.

sexta-feira, 20 de setembro de 2019

ADEUS, HERMENEGILDO...


Adeus, Hermenegildo... (por Antônio Samarone)

“O céu nos deu como contrapeso aos muitos fardos da vida duas coisas: a esperança e o sono.” Kant.

Profissional bem-sucedido, inteligente, irônico, sempre com um sorriso largo... Ninguém suspeitava do tamanho da tristeza de Hermenegildo.  

Hermenegildo resistiu ao mundo virtual, viveu fora das redes sociais. Entre a solidão e promiscuidade social optou pela solidão. Uma solidão filosófica. Viveu plenamente a sua individualidade. Amou ao seu modo. Cultuou a solidariedade discreta.

Hermenegildo partiu de forma misteriosa, ninguém desconfiou que ele estava de malas prontas. Ninguém mesmo! Uns poucos perceberam que ele andava meio triste, mas não suspeitaram que a tristeza fosse tanta. Um gesto como esse se prepara no silêncio do coração.

A sua ida avexada, sem avisar, nos deixou uma pergunta profunda: qual o sentido da vida? Talvez a maior questão da filosofia. O iluminismo criou a ilusão do humanismo: o homem se basta, ele é o centro de todas as coisas. A hipótese divina foi descartada.

A dessacralização da vida foi um equívoco?

“Julgar se a vida vale ou não a pena ser vivida é responder à questão fundamental da filosofia.” Albert Camus.

Na pós modernidade, a vida se tornou excessivamente transitória, não há nada que prometa duração e persistência. Passamos por uma profunda crise, manifestada pela perplexidade e pelo ceticismo social crescente, que apontam para a necessidade de um novo conjunto ideológico. Novas razões de viver.

Diante da incapacidade da moral religiosa, da impotência da razão para governar os homens e da dificuldade de submeter as paixões por meio de pura repressão, o homem foi deixado a própria sorte. Por outro lado, o humanismo iluminista foi sufocado pelas razões do mercado.

Vivemos na sociedade do cansaço. Do cansaço solitário, sem sentido, dividido, calado, cego. Um cansaço fundamental, profundo, um cansaço da alma.

Como disse o poeta Lenine: “Enquanto o tempo/ Acelera e pede pressa/ Eu me recuso, faço hora/ Vou na valsa/ A vida é tão rara...”

Hermenegildo, talvez você reencontre a “Lola” que você tanto amou, no meio dos anjos.

Antônio Samarone.

quinta-feira, 19 de setembro de 2019

ARACAJU INTELIGENTE?


Aracaju Inteligente? (por Antônio Samarone)

Aracaju padece com a ocupação das Avenidas Rio de Janeiro e Matadouro com a sucata de uma antiga linha férrea da Leste Brasileira. A linha está sem uso há décadas. Inclusive, com vários trechos cobertos pelo mato, no interior do Estado. Sem contar uma antiga Estação Ferroviária abandonada, no coração da cidade.

Por que a Prefeitura de Aracaju nunca tomou providências para liberar essas avenidas, favorecendo a mobilidade, o direito de ir e vir? A quem pertence essa rede ferroviária?

A Ferrovia Centro-Atlântica S.A. obteve a concessão da Malha Centro-Leste, incluindo o trecho que passa em Sergipe, no leilão realizado em 14/06/96. A empresa iniciou a operação dos serviços públicos de transporte ferroviário de cargas em 01/09/96. A concessão foi por trinta anos.

Ocorre que, após 23 anos da concessão, a Centro Atlântica S.A. nunca operou regularmente o trecho sergipano. Na clausula nona do contrato de concessão, entre as obrigações da concessionária encontra-se:

“prestar serviço adequado ao pleno atendimento dos usuários, sem qualquer tipo de discriminação e sem ocorrer em abuso do poder econômico, atendendo as condições de regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade, cortesia na sua prestação e modicidades das tarifas.”

Esta cláusula nunca foi cumprida. A concessão está nula de pleno direito. Bastava um pouco de zelo do gestor municipal, para acionar a Agência Nacional de Transporte Públicos (ANTT) solicitando a desocupação das vias públicas de Aracaju. Não conseguindo pela via administrativa, acionar o poder judiciário.

De acordo com o artigo 38, da Lei nº 8.987, de 13/02/1995 – Lei das Concessões, o contrato caducou há muito tempo, por falta de cumprimento do objeto do contrato, a prestação do serviço.

Falta ação e interesse do Prefeito de Aracaju.

Antônio Samarone.

quarta-feira, 18 de setembro de 2019

A BIOGRAFIA DE JOSÉ ROLLEMBERG LEITE. RESENHA DO LIVRO


A biografia de José Leite, resenha do livro de Dilson Barreto - (por Antônio Samarone)

Não se escreve uma biografa em vão. Biografa-se com finalidades precisas: exaltar, criticar, demolir, descobrir, renegar, apologizar, reabilitar, santificar, dessacralizar. O livro do economista Dilson Barreto, sobre a vida de José Rollemberg Leite, procura construir a memória de um personagem da vida pública sergipana. Criar uma narrativa!

Sergipe, do ponto de vista nacional, é um estado desprovidos de grandes nomes na política. Ressalvando-se Olímpio Campos, Fausto Cardoso, Leandro Maciel e o General Maynard, mais um ou dois, a vida pública sergipana foi dominada por líderes discretos, de pouco destaque fora da Província.  

O economista Dilson Barreto escreveu uma biografia política, muito próximo de um livro de história. Fui procurar sobre a vida pessoal, a intimidade do biografado, e não encontrei muita coisa. As informações sobre a vida privada, são frias, objetivas, uma espécie de Curriculum vitae ampliado. Passa-se a impressão que ele já nasceu como um homem público. O livro é uma parte da história política do PSD em Sergipe.

Mesmo quando o autor trata das festas de São João, onde o biografado aparece como amante das canjicas e manauês, feitas em fogão a lenha, a narrativa serve apenas para torná-lo mais popular, pelo menos no fundo, bem no fundo. Não se fica sabendo quem era José Leite, na vida privada. Talvez o autor tenha respeitado o recato da aristocracia sergipana.

Uma fato singelo despertou o meu interesse provinciano e bairrista: José Leite se casou em Itabaiana, em 15 de julho de 1939, com D. Maria de Lourdes Silveira Leite, irmã de Zeca Mesquita. Nos em Itabaiana acreditamos, que por isso, tivemos um Ginásio no início da década de 1950. Esse fato mudou a vida de muita gente, inclusive a minha. José Leite levou o ensino secundário para Itabaiana.

A vida privada é contada no que ela se relaciona com a vida pública. Por exemplo:

Uma passagem na página 93 é esclarecedora: “No ano de 1928, agora com 16 anos, José Rollemberg Leite encerra a segunda etapa de sua jornada intelectual, recebendo uma educação alicerçada no rigor da disciplina e elevado nível de conhecimento. Decorrente de sua rígida educação doméstica, sempre se destacou como uma aluno responsável, dedicado aos estudos e cumpridor de seus deveres de estudantes.”

Aqui estão assentados os pressupostos da imagem do homem público José Leite, que o autor quer transmitir para os leitores e para a memória. Essa imagem já é em parte difundida pelo senso comum: de um homem preparado, justo e honesto.

A ideia de glorificar os feitos e realizações dos governantes remonta às primeiras civilizações da Antiguidade.

Mesmo o autor se auto considerando um admirador prévio do biografado, o livro não distorce, e procura fundamentar as interpretações. O livro não entra no pantanal da apologia, gênero tão comum em Sergipe del’ Rey. Seria injusto colocar o livro na categoria das hagiografias.

Por exemplos, alguns fatos polêmicos do primeiro governo José Leite são enfrentados:

O assassinato do militante Anísio Dário, o espancamento do jornalista Fragmon Carlos Borges e os atos de violência contra José Onias, líder udenista de Propriá, no inicio do primeiro Governo José Leite, são atribuídos ao Secretário de Segurança Pública, João de Araújo Monteiro, o temido Monteirinho, e a  “mão pesada” do Comandante da Polícia, Djenal Queiroz, que recebiam ordens diretamente do Presidente Eurico Gaspar Dutra.

Na versão do livro, José Rollemberg Leite sai isento desses episódios de violência. 

Por outro lado, José Rollemberg era acusado de fazer “vistas grossas” ao comunismo, pela opção política do seu irmão, Márcio Rollemberg Leite, promotor público, simpatizante do credo vermelho, ligado ao PCB.  

No mais, a biografia exalta os feitos dos governos José Leite, em especial, a sua honradez na participação na vida pública. O livro ressalta as virtudes do biografado, um técnico que atuou na política, um homem de grandes virtudes morais. O livro também é uma prestação de contas da vida pública de José Leite, numa versão autorizada
.
Como biografia é uma bom livro de história. Sem a pretensão cientificistas, os fatos citados são devidamente referenciados.

Em síntese, o livro vale a pena ser lido. Está bem acima da média das biografias locais, geralmente bajulatórias.  É uma pesquisa de folego, que terá grande valia para os interessados na história política de Sergipe. Cada um que faça a sua leitura.

Antônio Samarone.

ARACAJU: O NÓ NO TRÂNSITO E AS SAÍDAS.


Aracaju: o nó no trânsito e as saídas. (por Antônio Samarone)

Em agosto de 2019, no mês passado, Aracaju possuía uma frota de 350 mil veículos, para uma população estimadas em 650 mil habitantes. Um veículo para cada duas pessoas, aproximadamente. Se desconsideramos os menores e os idosos acima de 80 anos, sobrará quase um veículo por habitante. Sem contar com a frota da Grande Aracaju, que roda a maior parte do tempo por aqui.

O grande nó passou a ser a fluidez. De nada serve o potente e confortável veículo se ele não anda. A velocidade média de 10 Km/hora.

O que fazer?  

A saída tradicional da engenharia em priorizar o transporte coletivo, não deu certo em Aracaju. O número de passageiros vem diminuindo.

Construir novas vias, viadutos, rotulas, duplicações, binários, tuneis são economicamente inviáveis. Aracaju, há décadas, é um paraíso da especulação imobiliária, por isso as suas ruas e avenidas são tão estreitas. Muitas vezes invadidas. Os espaços públicos são estreitados, exíguos, minúsculos. Não se construiu uma grande avenida nos últimos 30 anos, só promessas.

Usar o transporte fluvial? Já foi estudado: pareceu economicamente inviável.

Construir uma rede de ciclovias integradas, pensando num transporte sustentável? Bicicletas, patinetes elétricos, e novos modais. Criar alternativas para os pedestres, com calçadas livres e seguras. Travessia nas faixas priorizadas. Tudo isso é cidadania, tudo isso é sonho, qualidade de vida. Ainda estamos longe.

Semáforos “inteligentes” é pura fumaça, com reduzido impacto na fluidez.

Aracaju ainda não travou de vez, pela opção forçada que as pessoas fizeram por motos, Uber, táxis, mototáxis, o que aliviou os engarrafamentos, por ocuparem menos espaços. A opção pela alternativa moto agravou os riscos de acidentes, mas melhorou a fluidez.

Aracaju possui 180 mil automóveis e 82 mil motos e similares. Já, já, as motos superam os automóveis.

O que sobra de alternativa para aliviar a fluidez, com baixo investimento? 

Em todo centro expandido de Aracaju, no antigo “quadrado de Pirro”, parte planejada da cidade antes das construtoras, as ruas possuem 12 metros de largura: 3 metros de calçada, 1,5 m de cada lado, e pista de rolamento de 9 metros, com três faixa de circulação. Um dessas faixas é ocupada atualmente com estacionamento. Gente que chega cedo e passa o resto do dia ocupando o espaço público.

Uma alternativa é construir novos corredores, o que apontou os estudos. Bastava proibir o estacionamento nessas vias congestionadas, que se ganharia uma nova faixa para a circulação. Teríamos 33% a mais de espaço disponível, melhorando significativamente a fluidez. Apenas, iriamos contrariar os interesses de meia dúzia, que usa as vias pública privadamente, para estacionar os seus veículos.

É aí reside uma dificuldade: tomar essa decisão, contraria alguns interesses.

Essa alternativa já foi tentada, mas forças poderosas impediram, com a alegação de que sem estacionamento na porta o comércio do Centro quebraria. Claro, essa tese é totalmente falsa. A saída com o estacionamento rotativo foi tentada sem sucesso, o espaço continuava ocupado, só que por carros diferentes.

Fluidez é a resultante da relação entre os veículos circulantes com os espaços disponíveis. Em Aracaju, uma alternativa de baixo custo é disponibilizar os espaços usados como estacionamentos, para a circulação dos veículos. Simples! Só que essa decisão só será tomada por um Prefeito com grande espírito público, sem jeitinhos e sem malabarismos políticos.

Por enquanto, continuaremos impacientes, com um trânsito quase travado.

Antônio Samarone.

domingo, 15 de setembro de 2019

GENTE SERGIPANA - ROBÉRIO SANTOS


Gente Sergipana - Robério Santos.

Nasceu em Itabaiana, em 20 de fevereiro de 1981. Filho de Seu Pedro e Dona Maria Luciene Barreto. Gente dos Cearás da Cruz do Cavalcante.

Um intelectual insubmisso. Vasta obra publica. Fotografo. Jornalista. Cineasta. Formado em Letras, pela UFS. O único da nova safra itabaianense com influencia regional. Criador da revista OMNIA.

Robério Santos é um dos grandes pesquisadores brasileiros do Cangaço, do mesmo naipe de Frederico Pernambucano de Mello e Antonio Amaury. Usa uma metodologia original e fértil.

É preciso se fazer justiça: Robério Santos foi o idealizador e o principal responsável pela bem sucedida "Bienal de Itabaiana".

Depois se afastou.

Como todo intelectual independente, Robério Santos tem os seus caprichos. Não é dócil!

Vou revelar um segredo: na primeira visita à Itabaiana, durante os debates para a criação dos grupos do saber local, Luiz Antonio Barreto me confidenciou, esse Robério é inquieto, criativo, pode ir longe no mundo da cultura.

E está indo.

Antonio Samarone.

sábado, 14 de setembro de 2019

A CULTURA NA QUINTA BIENAL DE ITABAIANA



A Cultura na quinta Bienal de Itabaiana. (por Antônio Samarone)

A Bienal de Itabaiana é um grande sucesso de público. Legiões de jovens superlotam os corredores. Todos curiosos, ávidos pelo consumo cultural. Gente de todos os cantos e recantos. Parece uma romaria do Padre Cícero. O que explica esse novo poder de atração da cultura popular, do objeto cultural?

Claro, não estou falando da cultura como um sistema completo e coerente de explicação do mundo. Não! Falo da cultura mercantilizada.

A globalização da cultura convive com as culturas locais fragmentadas, sem muitos conflitos. Muitas vezes nem se cumprimentam. Para o mercado, a única medida é o consumo.

A que se deve o sucesso da Bienal de Itabaiana, a Meca da cultura sergipana?

Primeiro a ausência do Poder Público. A Bienal de Itabaiana não usa recurso público. Quando o Poder Público patrocina a coisa não anda, a politicagem toma conta. Só leva gente se contratar shows com artistas famosos, com cachês suspeitos. A parte da cultura local é esvaziada, mesmo trazendo palestrantes e atrações de fora.

Uma nota: a completa ausência dos doutores das universidades na Bienal de Itabaiana. Nem a sombra dos departamentos de letras... O saber acadêmico tem outras preocupações! Um detalhe: ninguém sente falta.

Acredito que o sucesso da Bienal de Itabaiana se deve, principalmente, ao indiscutível espírito comercial dos Itabaianenses. Uma gente que sabe comprar e vender. Uma gente que vende de ouro a castanha. Vender cultura fica fácil. Em outras palavras, o tino comercial de Honorino Júnior, Carlos Elói e Jamyson Machado é o carro chefe da Bienal. Não é atoa que transferiram a Bienal para um Shopping Center.

A alma da bienal de Itabaiana é o espírito comercial da cidade. Não é fácil vender livros de autores locais, pouco conhecidos. Um Best Sellers nas livrarias de Aracaju vende cem exemplares. Na Bienal de Itabaiana os autores locais mais famosos chegam a vender seiscentos livros. A feira tem mais de duzentos escritores e quinhentos títulos.

Escritores, poetas, trovadores, cordelistas de toda a redondeza. Do alto Sertão ao baixo São Francisco. Do Raso da Catarina, Serra Negra e Uauá. Escritores das escolas municipais dos povoados e das academias de letras. Tudo gente daqui, sem fama, sem a divulgação de grandes editoras. Quase tudo local. Todos vendendo.

Um amigo, um intelectual cabuloso, me perguntou em tom de ironia: e a qualidade desses escritos? Eu cheguei à impaciência, que qualidade, o mercado está se lixando para esse preciosismo. Os critérios mudaram: o capitalismo absorveu a cultura, destruiu as fronteiras simbólicas entre a alta e a baixa cultura, a arte e o comercial, o espírito e o divertimento.

Uma escritora do povoado Cajazeira me ofereceu dois livros de poesias. Não comprei por somiticaria.

O sucesso da Bienal se deve também a disseminação das academias de letras pelo interior. Existem academias em todos os cantos. Isso incentivou a que todos escrevessem alguma coisa, perdeu-se a timidez. O sujeito se tornou imortal, entrou numa academia, por que não escrever alguma coisa? O relativismo cultural desinibiu os letrados. Os consumidores tornaram-se produtores de conteúdo. 

Uma professora da rede municipal de Itabaiana me mostrou vaidosa o seu primeiro livro, ilustrado por um aluno. Um livro bonito. Parabéns, professora...

Com essa crise econômica, só quatro estabelecimentos prosperam em Sergipe: bodegas, vendendo bebidas alcoólicas; farmácias, vendendo medicamentos; igreja de crente, distribuindo fé; e academias de letras distribuindo cultura. A produção cultural é farta. A dificuldade é arrumar quem compre tantos livros, tirar o produto no mercado. A Bienal de Itabaiana resolveu essa pendência.

E por que outros municípios em Sergipe não realizam essas feiras culturais com sucesso, nem Aracaju? Perceberam, não é por falta de livros, nunca se escreveu tanto. O que falta é o espírito comercial. Vender! Com jeito e sabedoria vende-se de tudo.

Portanto, a minha conclusão, provisória, é que o sucesso da Bienal de Itabaiana deve-se sobretudo ao espírito comercial aguçado do seu povo.

Antônio Samarone.

sexta-feira, 13 de setembro de 2019

A BIENAL DE ITABAIANA


A Bienal de Itabaiana (2019). (Por Antônio Samarone)

Numa palestras recente, Vargas Llosa pediu para que as crianças lessem, para não serem enganadas. Pediu para que procurassem uma literatura crítica, com a capacidade de manter vivo o descontentamento com a realidade, e que se afastassem das artes como puro entretenimento.

“O entretenimento é divertido e fácil de digerir, mas não acho que, como a literatura, forme cidadãos ideais para uma sociedade democrática. Os livros deixam uma marca muitíssimo maior; geram cidadãos com um espírito crítico, e a democracia não pode sobreviver sem um espírito crítico.” (Llosa)

O medo de Vargas Llosa é que a mediocridade invada também a literatura, a poesia e as artes em geral.

“Os tempos mudaram. Ninguém tomou a Bastilha, nem pôs fogo no Reichstag, o Aurora não fez um único disparo. E, no entanto, o ataque foi lançado e teve êxito: os medíocres tomaram o poder.” (Deneault)

“O que faz de melhor uma pessoa medíocre? Reconhecer outra pessoa medíocre. Juntas se organizarão para puxarem o saco uma da outra, vão se assegurar de devolverem favores uma à outra e irão cimentar o poder de um clã que continuará a crescer, já que em seguida encontrarão uma maneira de atrair seus semelhantes.” (Musil)

Acredito que a Bienal de Itabaiana seja parte dessa resistência à mediocridade, um chega prá lá na estupidez...

Antônio Samarone.

quinta-feira, 12 de setembro de 2019

O SUICÍDIO NO ORIENTE - A CREMAÇÃO DAS VIÚVAS


O Suicídio no Oriente – A cremação das viúvas. (por Antônio Samarone).

Na Índia o termo “sati” significa esposa virtuosa, casta e fiel. Entretanto, “sati” era um costume antigo e bárbaro, que existiu por muitos séculos na Índia. As mulheres ao enviuvarem, acompanhavam o cortejo fúnebre do marido, com música e cânticos religiosos. Era tradição que ao chegar junto à pira preparada para a cremação do defunto, a esposa imolar-se junto.

O “sati” era uma cerimônia de cremação da viúva (viva).

Mesmo quando o marido morria distante, o ritual da cremação da viúva poderia ser realizado; Ela imolava-se junto a um pertence do finado. Onde o rito era o do sepultamento, a esposa era enterrada junto, viva. Esse costume era adotado pelos pertencentes da sub casta jugi (tecelões).

Em Bali, as viúvas as vezes preferiam tirar a vida com o kriss, um punhal de lâmina sinuosa.

Era um suicídio visto como purificador, aplaudido pela comunidade. As autoridades assistiam com complacência. Somente em 1984, é que o Primeiro Ministro Rajiv Gandhi declarou ser o “sati” uma vergonha nacional.

Oficialmente, o ritual de cremação da viúva (sati) foi proibido por lei em 1829, pelas autoridades inglesas que ocupavam a Índia. O que não significa que tenha deixado de existir.

O ritual do “sati” começava com a viúva declarando o seu desejo publicamente. Os parentes e amigos suplicam que ela desista, que pense nos filhos. Mas tudo é uma encenação, no fundo o desejo de quase todos é que ela se sacrifique.

Tomada a decisão, a mulher se preparava com cuidado. Vestia a roupa do casamento, coloca os braceletes e as joias nupciais, cobria a cabeça com flores, e pedia a benção dos parentes mais velhos.

A cerimonia da cremação da viúva era pública. Previa procissão, festejos, banquete e a participação de milhares de pessoas. As grávidas eram poupadas, adiava-se a cerimônia até o nascimento da criança.

A situação de viuvez era tão degradante, que as mulheres  preferiam o suicídio (sati). Se uma sati era fausta, uma viúva era infausta. Se a primeira era amada, venerada, celebrada, a segunda era odiada, desprezada e odiada.

Como na Índia predominava a poligamia, o ritual de cremação da viúva poderia assumir ares de tragédia. Em 1724, quando morreu o rajá Aijtsingh de Marwar, imolaram-se 64 esposas. Em 1799, a morte de um brâmane que tinha mais de cem esposas, a pira fúnebre ardeu por três dias, consumindo 37 delas.

Não descobrimos com que frequência esses suicídios coletivos ocorriam.

O ritual da cremação da viúva existia desde os séculos IV e III a.C. Ele nasceu para proteger os homens da ameaça das esposas, quando elas começam a envenená-los.

O passado da Índia articulava-se a quatro castas: brâmanes (sacerdotes); ksatriyas (guerreiros e cavaleiros); vaishya (comerciantes); e shudra (trabalhadores). O costume do “sati” nasceu entre os ksatriyas, uma casta alta. No início, o suicídio era proibido as mulheres dos Brâmanes. Com o tempo, o ritual foi adotado por todas as castas.

Pelos dados da administração britânica, entre 1815 e 1826, num total de 8.134 casos de SATI, 50% das viúvas que se imolaram eram de shudras, 40% brâmanes, 6% de ksatriyas e 4% vaishya.

Calcula-se que somente no século XIX, antes da proibição inglesa do “sati”, quase um milhão de mulheres tiraram a vida na Índia, após a morte do marido. No mesmo período, não se identificou nenhum viúvo que tenha se imolado após a morte da esposa.

Talvez por receio do antigo costume hindu, nos casamentos cristãos os sacerdotes fazem questão de anunciar a união marido e mulher, com uma ressalva, até que a morte os separe.

Antônio Samarone.

quarta-feira, 11 de setembro de 2019

O SUICÍDIO NA HISTÓRIA


O suicídio na história.

O suicídio é o único problema filosófico sério.” (Camus).

Um suicídio, como toda conduta humana, é uma mensagem endereçada à comunidade da qual seu sujeito faz ou fazia parte.

A história grega foi marcada por suicídios retumbantes: suicídios patrióticos, de Temístocles e Demóstenes; suicídio por remorso, de Aristodemo; suicídio pela honra, de Cleômenes; suicídio por fidelidade a uma ideia religiosa, de Pitágoras; suicídio para escapar da decrepitude da velhice, de Demócrito; suicídio filosóficos por desprezo pela vida, de Zenão, Diógenes e Epicuro. O suicídio de Sócrates é o mais conhecido.

Em Roma não foi diferente. Foi marcante o suicídio resignado de Sêneca, por ordem de Nero. Os celebres suicídios políticos de Catão, Cassius, Brutos (“Ó virtude, não passas de uma palavra”) e Cleópatra, para evitar a perda de liberdade. A popularidade de estoicismo entre as elites romanas contribuiu para banalizar o gesto fatal.

Na Idade Média o suicídio foi tratado pela proibição cristã. Aos suicidas eram negadas a sepultura. Tinha o corpo enforcado, como uma segunda morte. Na visão cristã do medievo, a salvação era negada aos suicidas. O suicídio era um problema da religião, da moral, do direito e da filosofia.

O Iluminismo encorajou a tolerância aos suicídios. A filosofia moral secular, a expansão do humanismo e o crescente prestígio da ciência contribuíram para a tolerância. Os filósofos d’Holbach, Voltaire, Montesquieu, Hume ofereciam justificativas filosófica. Somente Kant condenou duramente o suicídio.

Durante o Iluminismo tivemos o “mal inglês”.

Em 1749, Montesquieu escreveu: “Os ingleses se matam sem que se possa imaginar nenhuma razão que os determine, matam-se até em plena felicidade. É o efeito de uma doença gerada pelo clima, que atinge a alma a tal ponto que leva o desgosto por todas as coisas, até pela vida. Um mito do iluminismo: a Inglaterra era o país do suicídio.

Aliás, suicídio é um termo nascido na Inglaterra, no século XVII. (sui – de si; caedes – assassinato). Entre 1680 e 1720 explodiu o número de suicidas na aristocracia britânica. O suicídio filosoficamente justificado era um ato refinado, desde que não fosse por enforcamento. O suicídio era nobre ou pela espada ou pela pistola.

A satanização do suicídio no mundo protestante. Para Lutero, “o suicídio nada mais é do que um assassinato de uma pessoa cometido diretamente pelo diabo. Aquele que se suicida está possuído pelo demônio.  A origem satânica do suicídio é aceita com facilidade pelo povo.

O Concilio de Trento reitera a proibição absoluta de matar do quinto mandamento. A lei não diz não matarás os outros, mas não matarás. O suicida era enterrado junto aos excomungados e aos não batizados, de todos aqueles que foram excluídos da salvação eterna.

No final do século XV a loucura tornou-se tema intelectual, gerando polêmicas. Brant avaliava que era preciso estar louco para se suicidar, Erasmo, que era preciso estar louco para continuar vivo. Surge a ligação dos suicídios com a doença mental.

Uma passagem do Dr. Fausto, de Goethe, é significativa do dilema sobre o suicídio:

“Meu coração está tão endurecido que eu não consigo me arrepender. Mal posso apelar à salvação, à fé ou ao céu sem que um eco terrível ressoe em meus ouvidos: Fausto, estás condenado ao sofrimento eterno. Então, espadas, punhais, veneno, pistola, cordas e floretes envenenados se oferecem a mim para que eu me mate.”

Os médicos tinham prestado pouca atenção aos suicídios no renascimento e mesmo no iluminismo. Contudo, à medida que a profissão psiquiátrica emergia como uma entidade distinta, os autores médicos, no século XIX, começavam a enfatizar que o suicídio era causado pelas doenças mentais.

Esquirol, via o suicídio como o desfecho da monomania. Em 1838, ele declarou: “o suicídio é um ato secundário a uma perturbação emocional severa (délire de passion) ou insanidade (folie)”. Após 1820, o debate moral sobre o suicídio foi secularizado.

Até a década de 1820, o debate sobre o suicídio era dominado pela moral. Aqui inicia-se a medicalização. O suicídio deixou de ser visto como uma revolta contra Deus, mas continua um ato ameaçador para a sociedade. A psiquiatria começa a tomar conta do suicídio no final do século XVIII.

Os sociólogos também pleitearam o suicídio para o seu campo de pesquisa, consolidando-se no estudo clássico de Durkheim “O Suicídio” (1897). Durkheim rejeitou que o suicídio fosse primariamente causado por uma patologia individual, defendeu uma causa social de fundo.

O Setembro Amarelo: o suicídio não tem glamour. Hoje os médicos e psicólogos acreditam que o suicídio é um problema de Saúde Pública, e que decorrem, em sua imensa maioria, de transtornos mentais. Acreditam que esse avanço do suicídio encontra nessa explosão das doenças mentais a sua base explicativa. 

Em meu entendimento, transferem a pergunta: e o que está levando a essa explosão dos transtornos mentais?

Cada sociedade tem em momentos definidos de sua história uma determinada disposição para o suicídio, e uma taxa de suicídio numericamente particular. Essa variação ocorre no tempo, e entre diferentes civilizações. Esse entendimento só é possível pelos estudos sociológicos.

Mas essa questão não é tema desse texto.

Antônio Samarone.

domingo, 8 de setembro de 2019

O MEU BISAVÔ BERNARDINO FERREIRO



O meu bisavô Bernardino ferreiro... (por Antônio Samarone)

Aos 17 de setembro de 1926, terça-feira, às 9:40 horas, o trem M-72 da Este Brasileira, guiado pelo maquinista Caetano Antônio de Jesus, atropelou e matou Bernardino José de Oliveira (59 anos), ferreiro, residente no povoado Sambaíba, em Itabaiana Grande.

Bernardino ia de Itabaiana com destino a cidade de Maruim, para comprar ferro, matéria prima do seu ofício. Montado num burro. Ao chegar nas proximidades do povoado Caititu, um trem passava no momento. Bernardino viajava seguindo a linha do trem.

O animal assustou-se com o apito do trem e saiu em disparada. A 500 metro da estação do Caititu a linha faz uma curva (KM – 337), em seguida existe um alto pontilhão. O animal ficou sem alternativa, assustado, não conseguiu sair da linha, sendo esmagado pelo trem em cima do pontilhão. Bernardino não conseguiu nem controlar o animal nem saltar antes, sendo despedaçado pelo trem, junto com o animal.

Essa história continua na lembrança dos mais velhos do Caititu, que ouviram contar essa tragédia.

Os corpos foram apanhados num saco, gente e animal misturados, colocados na estação ferroviária do Caititu, à espera do destino legal. No mesmo dia, os cadáveres foram transferidos para Aracaju, e periciados pelos doutores Carlos Tavares de Menezes e Mário de Macedo Costa, na Chefatura de Polícia. Segue o resumo do laudo pericial, emitido pelos médicos:

“Bernardino de Oliveira, brasileiro, residente em Itabaiana, de cor branca, ferreiro, aparentando sessenta e cinco anos de idade, apresenta fratura do crânio e esmagamento de tronco e membros, literalmente separados, que provocaram a morte instantânea.” Bernardino José de Oliveira foi sepultado em Aracaju, no Cemitério de Santa Izabel.

Ontem, 07 de setembro de 2019, fui ao Caititu, local do trágico acidente que vitimou o meu Bisavô Bernardinho ferreiro. O propósito era construir no local uma “Santa Cruz”, tradição dos ferreiros, meus ascendentes. Visitei a mata, para sentir o sopro quente do ferreiro Bernardino.

Só que a mata cobriu parte da estrada de ferro. Por coincidência, no local do acidente cresceu uma linda jurema, exatamente uma jurema. Como se sabe, os ferreiros de Itabaiana preferiam o carvão de jurema em suas forjas, pois permitem elevadas temperatura. Desisti da “Santa Cruz”, a natureza ofereceu uma jurema.

A Bigorna que foi de João José, Bernardino, Totonho, Zé, Homero, agora é de Arnaldo meu primo, tá no povoado flechas, resistindo há mais de 150 anos. O som da bigorna ainda é reconhecido pelos antigos.

Gente dos Ferreiros, Bernardino não foi abandonado. Espero estar vivo, para comemorar o centenário de sua morte.

Antônio Samarone.

sexta-feira, 6 de setembro de 2019

O SOFRIMENTO DE SEU CAÇULO



O sofrimento de Seu Caçulo. (por Antonio Samarone)

Postei um relato sobre a maneira como o Seu Caçulo está cuidando da esposa, em estado avançado de Alzheimer. Tenho recebido várias mensagens de gente amiga, que está passando pela mesma provação. Suprimindo a identidade, uma experiência eu vou repassar...

Referindo-se a uma passagem do meu texto anterior (Os Mistérios da Ciência) – Imagine, a pessoa esquece de tudo, até mesmo de quem seja? Assustador! Seu Caçulo acha que não. Ele acredita que o sofrimento é para quem toma conta. A pessoa com demência apenas não consegue se comunicar, dizer o que pensa. A alma, o espírito dela sabe de tudo o que está se passando, disse ele com muita certeza.

A minha amiga, que está cuidando da mãe com Alzheimer, me contou a sua experiência:

“Li seu artigo sobre o Seu Caçulo e fiquei cá no meu amigo sofá, matutando.... Pensei... Também sou espírita, criada na doutrina e faz-me crer que a providência Divina revela a cada um no tempo certo segundo o seu amadurecimento.”

"Que ouçam os que têm ouvidos para ouvir e vejam os que têm olhos para ver".

“Sim, é muito triste para quem cuida e eu gostaria muito de ter o privilégio de ter dois dedinhos de prosa com seu Caçulo. Estou encantada com ele. Uma abnegação, paciência e coragem dignas de exemplo. Meu pai sofria muito, hoje está mais conformado. Nós os cercamos de mimos e muitos beijos. Sempre por lá, não abrimos mão dos almoços de domingo feitos por ele, com assessoria da secretária.”

“Mas o que quero dizer: a minha mãe, por algum crédito lá com a equipe dos abnegados espíritos de luz, conseguiu se comunicar conosco. Temos mensagens psicografadas, ditadas por ela, assinadas com sua letra, onde ela nos conta que já superou todo o sofrimento. Está tranquila e quer as nossas vozes à sua volta.”

“Confirmando o que seu Caçulo lhe disse, o corpo físico está deteriorando, mas o espírito permanece lúcido e durante os desdobramentos que se dão quando o corpo físico adormece, ela se desloca até um médium em Salvador, ditando as respostas aos nossos questionamentos. Temos nos consolado com isso e esperamos a hora da sua partida, dentro dos desígnios do criador.”

“Por hora, ela segue bem assistida por uma boa equipe de técnicos de enfermagem, fonoaudiólogo, fisioterapeuta, médico, dentista enfim.... todos os cuidados que a ciência terrena pode oferecer. E a fé nos conforta. Ela nos ama e cuida de cada um. De vez em quando sonho com ela bem, dando as ordens na casa, dizendo como quer as coisas. Vou lá e faço, pois sei que é o seu desejo.”

Eu, meio descrente, perguntei: como você sabe que quem escreve é mesmo a sua mãe?

“Sim, é ela. Já fizemos algumas modificações na casa, mudamos o piano de lugar, dentre outras coisas e ela perguntou por quê. Mas gostou. Quando um de nós deixa de ir para uma viagem, por qualquer motivo, ela pergunta. É a letra dela! Meu filho não acreditava. Ficou sozinho com ela no quarto e fez perguntas no seu ouvido, ela mandou a resposta para ele.”

A minha descrença diminuiu com tantas evidências.

Antônio Samarone.

terça-feira, 3 de setembro de 2019

OS MISTÉRIOS DA CIÊNCIA.


Os Mistérios da Ciência. (por Antônio Samarone).

Visitei Seu Caçulo (87 anos), um tabaréu das Candeias que, há anos, reside em Aracaju. Gostei do papo! Ele conhecia o meu avô Ascendino. Nasceram no Engenho “Matebe”, hoje povoado da Moita Bonita.

Dessa vez tive uma surpresa, Rosinha (82 anos), sua esposa, está em estágio avançado de Alzheimer. Ele é quem cuida. A filha que tiveram, morreu no ano passado.

Meio acanhado, perguntei: o que Rosinha tem? Ele de pronto: “caducando, ficou demente, não se assunta mais de nada e nem reconhece mais ninguém.” E quem está cuidando? Perguntei preocupado. Ele: “Deus! E eu tomo conta...” Imaginei as dificuldades.

Caçulo acrescentou: “outra coisa, ela não morre tão cedo. Eu tenho certeza que embarco antes.” Ele ainda filosofou: “as demências prolongam a vida. Gente assim não tem preocupação, nem raiva, nem aborrecimento. O que mata a gente é desgosto, e disso ela está livre.” Nunca tinha pensado, será se Caçulo está certo?

Com o envelhecimento da população, teremos cada vez mais gente com idade acima de 80 anos. A medicina acredita que mais da metade das pessoas acima de 85 anos, terá problemas com as demências. E a ciência ainda sabe pouco, para prevenir. 

Imagine! A pessoa esquece de tudo, até mesmo quem é. Não é assustador? Seu Caçulo acha que não. Ele acredita que o sofrimento é para quem toma conta. A pessoa com demência apenas não consegue se comunicar, dizer o que pensa. A alma, o espírito dela sabe de tudo o que está se passando, disse ele com muita certeza. “Eu sou espírita, doutor...!”

Ele ainda perguntou: “estou certo, Rosinha?” Ela nem disse que sim nem que não. O semblante dela ficou impassível. Eu fiquei calado...

Vou perguntar aos doutores da neurociência!

Antônio Samarone.