quinta-feira, 26 de novembro de 2020

A NOVA TRIAGA BRASÍLICA


A Nova Triaga Brasílica
(por Antonio Samarone)

A farmacologia médica até o século XX, era firmada nos Dioscórides (século I d.C.) e em Galeno (século II d.C.).

Os medicamentos eram classificados em simples (ou símplices, do latim simplicia), quando a droga era sujeita a purificação e divisão; e as triagas (tríaga, teriaga, teríaga, triaca e tríaca) quando misturava-se várias substâncias.

Os jesuítas inventaram a Triaga Brasílica – receita magna e secreta da botica baiana, uma Panaceia – Foi o medicamento brasileiro mais importante do período Colonial.

As boticas jesuíticas, embora tenham se tornado célebres, eram poucas no século XVIII.

Em Lisboa, as duas boticas jesuíticas mais importantes eram as do Colégio de Santo Antão e de São Roque. A rede de boticas jesuíticas espalhava-se pelos domínios ultramarinos: Évora, Coimbra, Bragança, Salvador, Maranhão, Olinda, Recife, Pará, Rio de Janeiro, Santos, São Paulo, Goa e Macau.

As triagas referem-se a receitas à base de plantas, animais e outras substâncias, como minerais, sais, óleos etc., utilizadas pela humanidade há milênios.

A Triaga Brasílica continha, entre outras drogas: Limão, Gengibre, Batata do campo, Ipecacuanha, Jurubeba, Canela da Índia, Cravo do Maranhão, Noz moscada, Açafrão, Erva de sangue, Cidra, Erva doce, Cominhos, Salsa da horta, Pindaíba, Urucu seco, Ópio, Alcaçuz, Canela, Salva, Alecrim, Caroba, Arruda e Cardo santo.

No final de semana, uma amiga testou positivo para a Covid-19, pelo RT-PCR, aquele do Swab nasal. Ela está assintomática e foi orientada a procurar uma Unidade Básica de Saúde.

O médico prescreveu: Azitromicina 500 mg, Ivermectina 6 mg, Prednisona 20 mg e Dipirona 500 mg (se aparecer dor ou febre). É o protocolo do SUS em Aracaju.

A medicina brasileira estabeleceu essa conduta (majoritariamente).

A paciente questionou: Doutor, eu não estou sentindo nada, sou assintomática, por que preciso tomar essa medicação? A paciente aprofundou: o senhor está prescrevendo corticoide na fase viral, um antibiótico sem indicação e um vermífugo.

O doutor teorizou: se não fizer bem, mal não faz. Além de aumentar a resistência do organismo contra o vírus. Se a ciência ainda não descobriu o tratamento da Covid-19, nós não podemos ficar de mãos atadas, devido a lentidão da ciência.

O doutor não se intimidou com o questionamento: aliás, todo medicamento possui um efeito placebo, resultante na crença em sua eficácia.

A medicina historicamente curou muita gente com a Triaga Brasílica dos Jesuítas. Muitos escaparam do leito da morte. É possível que essa nova Triaga (mistura de várias drogas), tenha alguma eficácia.

E concluiu: enquanto as vacinas não chegarem, vamos consumindo o que existe. O Brasil comprou um grande estoque desses produtos e não podemos desperdiçá-los.

Deus nos proteja.

Antonio Samarone (médico sanitarista)


 

terça-feira, 24 de novembro de 2020

LEI DE MURICI


Lei de Murici
(por Antonio Samarone)

“Em tempos de murici, cada um cuida de si”. Salve-se quem puder. Se cada cidadão tratar da sua vida, é quase certo que irá sobreviver. A sobrevivência alheia é assunto alheio.

Esse é o espírito da famosa Lei de Murici.

“Em tempos de murici”, qual a origem dessa assertiva? O que seria o murici? A Byrsonima crassifólia, pequena fruta do litoral nordestino, já descrita por Gabriel Soares de Souza, no século XVI? Creio que não.

Conta-se que após a morte do sanguinário Coronel Moreira César, o “Corta Cabeças”, na terceira expedição de Canudos, o seu sucessor no comando das tropas, o Coronel Pedro Nunes Tamarindo, declinou do comando e desertou, pronunciando a celebre frase: “Em tempos de murici, cada um cuide de si.”

Moreira César chegou a Canudos com a fama de crueldade. Na Ilha do Desterro, atual Florianópolis, ele determinou a enforcamento dos prisioneiros da Revolta Federalista (1893 – 1895), na Fortaleza de Anhatomirim.

A origem da Lei de Murici vem de longe.

Segundo o intelectual sergipano João Ribeiro, murici deriva de morexi ou murixy, nome asiático do Chorela-morbus, e muito usado na Índia. Murixy era o antigo nome do Cólera.

Em tempos de murixy, era em tempos do Cólera.

“O terror dos tempos do murixy se espalhou pelo mundo. A epidemia do murixy explica a origem da expressão “em tempo de murici”, bem melhor que a inofensiva frutinha de murici.”

Em Canudos, onde o apavorado Coronel Tamarindo bradou a citada sentença, o clima era de medo e pavor, semelhante aos momentos de Pestes.

“El amor en los tiempos del cólera” é título de um famoso romance de Gabriel Garcia Marques.

Antonio Samarone (médico sanitarista)


 

segunda-feira, 23 de novembro de 2020

JOÃO ALVES FILHO


João Alves Filho
(por Antonio Samarone)

Relendo a história política de Sergipe, dos últimos duzentos anos (1820 – 2020), poucos são os líderes que deixaram marcas duradouras.

Quais foram os estadistas, os que governaram para o futuro e saíram da mediocridade?

Quantos merecem uma biografia, sem precisar encomendar?

Correndo o risco de deixar alguém de fora, pela pressa, identifiquei apenas seis grandes líderes políticos em Sergipe: Sebastião Gaspar de Almeida Boto (o primeiro), João Gomes de Melo (Barão de Maruim), Olímpio Campos, Augusto Maynard, Leandro Maciel e João Alves Filho.

Cada um a seu modo e ao seu tempo!

O engenheiro João Alves Filho ingressou na política, nomeado Prefeito de Aracaju (1975 – 1979), pelo Governador José Leite. João Alves rompeu as cercas provincianas do Aracaju, preparando a cidade para a explosão imobiliária. Aracaju ganhou ares de Capital.

Fruto do trabalho realizado em Aracaju João Alves chegou ao Governo de Sergipe em 1982, com 76% dos votos. Uma novidade: eleições diretas depois da longa noite da ditadura.

A dança das oligarquias dos senhores de engenho, sofreu uma inflexão. Um empresário urbano, sem origem familiar na nobreza sergipana, chegou ao poder, pelas vias democráticas.

João Alves Filho governou Sergipe por três vezes, foi Prefeito do Aracaju por duas (uma nomeada e outra eleita) e Ministro do Interior no Governo Sarney.

Independente das discordâncias ideológicas e políticas, da convicção socialista, dos meus princípios e crenças de esquerda, prezo pela honestidade intelectual: João Alves Filho foi o maior nome da política sergipana no final do Século XX.

Nunca votei, nem apoiei João Alves. Nunca prestei serviços aos seus governos. Nunca gozei da sua amizade, nada disso, o meu registro é isento de paixões.

Numa análise objetiva, João Alves acertou bem mais do que errou, em suas passagens pelo Poder em Sergipe.

Quem quiser tirar Sergipe desse atoleiro dos últimos anos, precisa respeitar a memória de João Alves Filho. Um liberal conservador que colocou o Estado à serviço do desenvolvimento.

A infraestrutura de estradas, água, saúde, cultura, educação, turismo, agricultura em Sergipe possuem a marca dos Governos de João Alves Filho.

Antonio Samarone (médico sanitarista)


 

sábado, 21 de novembro de 2020

TIPOS SERGIPANOS - CHUMBREGA


Tipos Sergipanos - Chumbrega
(por Antonio Samarone)

Wellington da Graça, filho do Cabo João, nascido e criado no Beco Novo. Abandonou a escola com o primário incompleto. Aprendeu a ler, escrever e contar. Foi o bastante para passar a vida sem registrar um dia de serviço. Nunca trabalhou.

Passou a vida nas esquinas, bares e cafuas. Cerebrino nos jogos de azar. Imbatível na sinuca, no baralho e no pio. Para não faltar com a verdade, era apontador do bolo esportivo. Passou a vida entre a esquina da Prefeitura e o bar Brasília. (Foto)

Nunca souberam o que ele pensava, ou se pensava, pois falava pouco. Tanto pode ter sido um gênio como um apoucado. Sabe-se apenas que ele nunca teve nem amigos nem inimigos. Vivia ali, numa indiferença sepulcral.

Wellington da Graça era avesso aos banhos, mas andava perfumado e de sapato e meia. Mal formado de feições, pobre, esquisito, morreu borboletão.

A molecada não perdoava, ele logo ganhou o primoroso apelido de Chumbrega.

Chumbrega não acreditava em virtudes, nem em boas intenções. Era um niilista primitivo, ainda na casca. Cultuava uma vaidade imperial!

Segundo Alberto de Carvalho, Chumbrega foi uma contra homenagem ao Conde de Schomberg, elegante nobre português da época da Restauração (Sec. XVII).

Jeronimo de Mendonça, Governador da Província de Pernambuco, era conhecido como Chumberga. O personagem de Itabaiana era Chumbrega.

Chumbrega não possuía nem rendas nem patrimônio. Vivia de favores. Ele cobrava gorjeta pela existência. Como era pacífico e não roubava, passou a ser tolerado nas rodas dos bem nascido de Itabaiana.

Chumbrega ganhou a fama de nunca ter feito um favor. Vivia de favores, sem reciprocidade. Ninguém contasse com ele para nada.

Próximo a Prefeitura morava Alemãozinho, um comerciante prospero de Itabaiana. Alemãozinho sempre foi mão aberta com Chumbrega, nunca lhe negou uma ajuda.

Num certo domingo, logo cedo, Alemãozinho foi buscar a Rural para ir à Fazenda. O carro não pegou, precisava de um empurrãozinho. Pela hora, tinha pouca gente na rua. Alemãozinho lembrou de Chumbrega, sempre ali, na esquina da Prefeitura.

“Chumbrega, faça-me um favor, ajude-me aqui a empurrar o meu carro”, disse Alemãozinho.

Chumbrega respondeu de pronto: “Jamais! Você não pode me pedir uma coisa dessa!”

“Como assim?” - reagiu Alemãozinho. “Você passou a vida me pedindo favores e quando eu preciso de uma bobagem, você nega!”

Chumbrega, indiferente, continuou: “Não tenho lembrança de ter lhe pedido para empurrar o meu carro.”

Alemãozinho teve que se virar sozinho.

Chumbrega faleceu deixando uma marca: nunca fez nem o bem nem o mal. Saldo zero!

Não se sabe se na hora do juízo final, do acerto de contas, ele fora salvo ou condenado.

Eu não arrisco!

Antonio Samarone (médico sanitarista).