sábado, 5 de março de 2016

HOSPITAL SANTA IZABEL (PARTE TRÊS)

Hospital Santa Izabel (Parte Três)

Antonio Samarone de Santana.

O funcionamento do Hospital Nossa Senhora da Conceição (Santa Izabel) durante o período Imperial foi bastante irregular. Momentos de boa administração alternavam-se com momentos de crise. Vez por outra, voltava à tona a questão de ser o hospital uma “Repartição Pública”, e da necessidade de repassá-lo para instituições filantrópicas. Em 1866, numa dessas crises financeiras, o Barão de Maruim doa um terreno, localizado junto à igreja de São Salvador, e o Governo empresta 20 contos de réis, para que a administração do hospital construísse uma “casa de mercado”, que passará a servir como fonte de renda. É um pouco estranho, mas o primeiro mercado de Aracaju pertenceu ao atual hospital Santa Isabel.

O financiamento do hospital, nesse período, foi feito basicamente pelo Tesouro. As chamadas contribuições filantrópicas por parte de almas caridosas estavam reduzidas a quantias simbólicas, com as quais não se conseguia cobrir nem as despesas com medicamentos. No balanço de 1866, encontramos que o Hospital Nossa Senhora da Conceição arrecadou naquele ano a quantia de 6:905$701 contos de réis, dos quais apenas 140$000 réis resultaram de donativos de particulares.

O grande responsável pela receita do hospital era o poder público, seja diretamente através de subvenções, seja através de outras formas de contribuições, como a marítima, o soldo dos praças de polícia e o imposto sobre a cana de aguardente. As outras fontes de receita como os juros das apólices, o aluguel da enfermaria São Sebastião aos militares, os rendimentos do cemitério representavam uma parcela inferior a 20% do total arrecadado.

No que se refere às despesas, nesse momento (1866) já superiores as receita, os itens que mais pesavam eram o fornecimento de víveres (1:825$041), pessoal do hospital (1:804$992), custeio (1:501$695) e fornecimento de medicamentos (1:489$652). Nesse ano, as despesas totais somaram 7:014$400 contos de réis, isto é, um pouco acima da receita existente. O que mantinha o hospital funcionando era um saldo que vinha do tempo da fundação, quando as doações foram relativamente generosas, e o que sobrou foi gasto aos poucos, no decorrer dos anos.

O que chama a atenção na participação do poder público no financiamento da chamada assistência médico-hospitalar filantrópica e a sua significativa importância como receita para o hospital, e seu desprezível valor como despesa para a Província. No caso da Província de Sergipe, essa participação se deu com maior força nas décadas de 1860/70, ou mais especificamente, nos quinze a vinte anos que se seguiram à grande epidemia de cólera.

Nota-se claramente uma redução dos gastos públicos com a assistência médica em Sergipe, no final do Império e em boa parte da Primeira República. No que se refere às despesas do poder público com as ações conhecidas como de saúde pública, a análise é mais complicada, uma vez que não aparecem nos orçamentos da década de 1860, de forma direta, mas embutidas nas rubricas de socorros públicos, obras públicas e despesas diversas.

No final do período Imperial, o Poder Público concedia subvenções diretas aos quatro hospitais em funcionamento na Província. O Hospital de Caridade de Aracaju recebia 2:000$000, o Amparo de Maria, em Estância 1:600$000, o São João de Deus, em Laranjeiras 1:600$000 e o hospital de Rosário do Catete 1:400$000. Ou seja, somente com a assistência médico-hospitalar, o poder público gastava cerca de 6:600$000 contos de réis. Em 1889, a receita total da Província foi de 533:354$695 réis e as despesas foram de 897:140$347 réis[1]. Além do grave desequilíbrio das contas públicas, percebemos que as ações de assistência hospitalar representavam cerca de 0,7% das despesas da Província.

No Governo do Presidente Cincinnato Pinto da Silva (1864), o hospital já passava por dificuldades financeiras e o principal responsável continua sendo a dependência do Estado. Novamente é levantada, sem sucesso, a possibilidade da criação da “Confraria Nossa Senhora da Conceição”, com compromissos religiosos, e a sua entrega à administração do hospital.

“Esse Estabelecimento não pode ainda receber todos os infelizes que o procuram, e em quanto tal suceder claro é que não preenche o seu grandioso fim. Há ali sessenta leitos; mas o estado das finanças dele não permitem que sejam socorridos mais de vinte doentes. É, portanto, necessário que a sua receita aumente para que ele possa abrigar maior número de miseráveis.
O Regulamento que o rege, colocou-o sob dependência imediata do governo. Não há uma Confraria, há sim uma comissão que não tem ligações por compromisso algum religioso. Logo que esse elemento entrar na constituição daquela casa mais pronunciadamente, persuado-me que ela, alargando a sua esfera, disporá de outros recursos. Pensando assim dirigi-me à Mesa Administrativa encarregando-a de organizar um compromisso, a fim de ser criada, nesta Cidade, a Confraria de Nossa Senhora da Conceição.”[2]

O hospital continua ligado ao Governo, e as direções vão se sucedendo. Em 1868, o Hospital de Caridade de Aracaju possuía uma nova direção. A Comissão Administrativa estava assim constituída: diretor, Dr. Manoel Pereira Guimarães; tesoureiro, João Manoel de Souza Pinto; Secretário, Capitão Polydoro Pereira da Fonseca Gomes; e mais, Dr. José João de Araújo Lima, Dr. Cvpriano de Almeida Sebrão, Capitão José Diniz ViIIas-boas e o Alferes Joaquim José Alves Guimarães.

Em setembro de 1872, o Presidente Joaquim Bento de Oliveira Júnior, em relatório de final de Governo, assim se manifesta sobre as condições do Hospital de Caridade de Aracaju:

“Pude observar o empenho com que a Comissão Administrativa tem procurado melhorar as condições do estabelecimento, mas não posso ocultar a impressão desagradável que experimentei vendo o estado de ruínas da casa, cujo triste aspecto dá muito má idéia da caridade que dentro dela se distribui.”

Desde a década de 1870, a questão da necessidade de transferência do Hospital de Caridade de Aracaju da casa acanhada localizada à Rua da Aurora para um local adequado, aparece na ordem do dia. Mesmo porque a casa onde funcionava o hospital tinha sido construída para instalação de um colégio, e depois adaptada no que foi possível.

A partir de 19 de janeiro de 1877, o Presidente José Martins Fontes exonera o Diretor do Hospital de Caridade, Dr. Manoel Pereira Guimarães, e nomeia uma nova Comissão Administrativa assim constituída: Gervásio Campello Pires Ferreira, Diretor; o Vigário José Luiz d’Azevedo, secretário; e mais, Ângelo Lopes de Leão, Aristides da Silveira Fontes, Theodomiro de Melo Barreto, Joaquim José Alves Guimarães e João Diniz Vilas-Boas. Nessa administração o hospital passa por uma grave crise, e o Presidente da Província substitui o Diretor (1878), nomeando em seu lugar o Comendador Cândido do Prado Pinto, e José de Barros Pimentel Filho, como tesoureiro, que durante muitos anos será o caixa forte daquela instituição.

“Basta dizer que uma de suas principais enfermarias não estava concluída, e as duas únicas que funcionavam achavam-se em péssimo estado de asseio, bem como todo o edifício, existindo nessa ocasião tão somente 7 doentes de caridade, achando-se o estabelecimento sobrecarregado de uma dívida de 2:500$000 contos de réis, não havendo fornecedor, quer de medicamentos, quer de víveres, contratados, porque na falta de pagamento ninguém queria sujeitar-se a semelhante ônus.”[3]



[1] Quadro de receitas e despesas do Estado de Sergipe, nos exercícios de 1835 a 1899, publicado em anexo à mensagem apresentada à Assembléia Legislativa, em 07 de setembro de 1900, pelo Presidente do Estado Monsenhor Olympio Campos.
[2] Fala do Presidente da Província, Dr. Cincinnato Pinto da Silva, com que foi aberta a segunda sessão da décima quarta legislatura da Assembléia Legislativa, em 01 de março de 1865.
[3] Relatório da Comissão Administrativa do Hospital Nossa Senhora da Conceição, em 6 de janeiro de 1878.

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