sábado, 5 de março de 2016

HOSPITAL SANTA IZABEL (PARTE QUATRO)

Hospital Santa Izabel (Parte Quatro)

Antonio Samarone de Santana.

Em 1883, será nomeado diretor do hospital o Dr. José Marques da Silva Bastos. A partir de 1885, o Hospital de Caridade de Aracaju passa a ser dirigido pelo Dr. Augusto Borborema, logo substituído pelo Dr. Benjamim Aristide Ferreira Bandeira. Entretanto, em todas essas administrações, o homem forte continua sendo o Major José de Barros Pimentel. Os serviços médicos do hospital serão entregues ao Dr. Antônio Rodrigues de Souza Brandão, devido à exoneração, em 10 de junho de 1884, por avançada idade e quase cegueira, do Dr. Francisco Sabino Coelho Sampaio.

A mesma questão da grande dependência do Governo e da necessidade de entregar-se o hospital a uma instituição de caridade volta a ser levantada pelo Presidente Francisco Gouveia Cunha Barreto (1884), novamente sem sucesso.

“A atual Comissão administrativa, em seu relatório, trata da criação de uma Irmandade de Misericórdia (a questão retorna), constituída regularmente e a cujo cargo exclusivo fiquem todos os estabelecimentos de caridade aqui existentes”.

Não discordo dessa opinião, pois que deixando de ser considerado estabelecimento público o hospital de caridade passa a ficar sob as vistas de uma corporação religiosa, como é praxe em muitas outras Províncias do Império, poderá ele mais facilmente preencher os verdadeiros fins de sua existência...”[1]

Apesar de ser um ponto com o qual quase todos concordavam, a questão da transferência do Hospital Nossa Senhora da Conceição para uma instituição de caridade, só será resolvido no período Republicano, durante o Governo do Monsenhor Olímpio Campos (1899 a 1902), quando o hospital passará a chamar-se Santa Isabel e, finalmente, será entregue à “Associação Aracajuana de Beneficência”, com quem permanece até hoje.

É inegável que as condições de funcionamento do citado hospital, durante o Império, eram de extrema precariedade. Dr. Juliano Simões, num depoimento publicado pelo jornal da Sociedade Médica (julho 1986), descreve a situação do hospital por volta do início do século XX, nos seguintes termos:

“Sabemos, nós médicos mais antigos em Aracaju, que há muito tempo o Dr. Pimentel Franco quando ia passar visita a seus doentes, do serviço de mulheres, ao entrar na enfermaria levava ao seu lado um servente com um fogareiro aceso queimando incenso ou alcatrão, para poder suportar o mau cheiro do ambiente. Eu mesmo alcancei na enfermaria dos homens, o famigerado “pilão sem boca” (não sei por que lhe deram esse nome), local por trás de um tabique de madeira, onde doentes ulcerados ou desenganados, estendidos comumente em esteiras, arrastavam-se pelo chão até o canto, onde retiravam de um pote de barro, com um só caneco, a água para beber.”

A situação do hospital de caridade de Aracaju (atual Santa Isabel) continuou precária no inicio do período Republicano. No Governo de Oliveira Valadão (1896), já se discutia sobre a necessidade de transferir o hospital de Caridade da rua Aurora. A casa estava caindo.

Quanto ao funcionamento, em agosto de 1895, passaram pelo hospital 79 pacientes, dos quais 29 receberam alta e 8 faleceram. As causas dos óbitos foram: 2 casos de tuberculose pulmonar, 2 de leucemia, 1 de gastroenterite, 1 de pneumonia, 1 de catarro pulmonar e o último de ascite.

Em 1893, mais uma epidemia de varíola atingia Sergipe. O Governador, José Calazans, manda construir um grande lazareto para abrigar os bexiguentos. Foi exatamente para esse prédio, construído bem afastado da cidade, nos morros de areia do bairro Santo Antonio, que o hospital de caridade de Aracaju será transferido. No momento da transferência, os médicos que trabalhavam no hospital eram os doutores Costa Pinto e Aristide Fontes; e os serviços de enfermagem estavam entregues a uma italiana, a Irmã Gregorina.

No Governo Olympio Campos, o Hospital de Caridade de Aracaju é transferido da rua Aurora para o alto do Santo Antônio. Dias depois, desaba o teto da sede antiga e, por muito pouco, não aconteceu uma tragédia em Sergipe. A situação de precariedade da antiga sede do Hospital Nossa Senhora da Conceição foi descrita de forma minuciosa pelo Inspetor de Higiene, Dr. Davino Nomysio:

“O antigo edifício, além de achar-se encravado no centro da cidade, entre casas, é demasiadamente pequeno, dispondo apenas de duas salas, uma para homens e outra para mulheres, onde se encontram promiscuamente os enfermos de todas as espécies de moléstias internas e externas. Afora as referidas salas, que mal recebem luz por duas de suas faces, existe um compartimento alongado, destinado à enfermaria de polícia, comunicando diretamente com a latrina do edifício, que é antes uma fossa imunda e pestilenta, a derramar de contínuo por todo o prédio e particularmente na enfermaria mencionada, os pútridos vapores que exala, de um cheiro intolerável e nauseabundo”.

Para instalação do velho hospital no prédio do antigo Lazareto, foi comprado todo o instrumental cirúrgico na Europa e organizada uma pequena farmácia. A cirurgia ainda encontrava-se em estágio incipiente em Sergipe, como está evidente no quadro de ocorrências do hospital. Entre julho de 1901 e julho de 1902 foram realizadas apenas 16 cirurgias no Hospital Santa Isabel: uma amputação de braço, uma de perna e uma de coxa; três fimoses, duas parofimoses uma dilatação de uretra, uma paracentese e cinco abscessos. Eram chamadas pejorativamente de “cirurgias de postemas”.

O hospital vinha funcionando muito precariamente neste período, inclusive com graves denúncias de má aplicação dos minguados recursos. Antes da lei transferindo o hospital para uma instituição filantrópica, o Governo, em 25 de janeiro de 1900, nomeia uma comissão, composta pelo Inspetor do Tesouro, Luiz Marcolino Machado de Souza, e pelos senhores Alcebíades Leite e Augusto de Magalhães Carneiro, para efetuar uma rigorosa auditoria nas contas do hospital. Procura também fazer a doação de várias propriedades ao hospital, para que o mesmo, de forma autônoma, mantivesse sua administração sem os subsídios do Estado. Nesse momento, a subvenção estatal estava em torno de dez por cento da receita do hospital.

A saída vislumbrada para o Hospital de Caridade de Aracaju, desde o Império, era entregá-lo a uma Instituição Filantrópica. Como vimos no capítulo anterior, à exceção dos demais, o hospital de Aracaju era quase uma repartição pública. O Governo nomeava seus diretores e assumia a maior parte das despesas. Naquele momento não fazia parte das responsabilidades do poder público assumir a administração dos hospitais de caridade. A assistência médica aos “pobres e miseráveis” era tarefa da filantropia privada, mesmo com as dificuldades para se receber qualquer contribuição espontânea a partir do século XIX.

“O Hospital de Caridade desta Capital, que é por assim dizer uma instituição oficial, pois o pessoal de sua administração é nomeado pelo Presidente do Estado, que superintende todas as atas da administração, precisa ser reformado no sentido de dar-lhe uma administração autônoma, sem relação de dependência com o Governo, além das que são comuns a institutos dessa natureza.”




[1] Fala do Presidente da Província, Dr. Francisco de Gouvêa Cunha Barreto, com que abriu a 1a sessão da 25a Legislatura da Assembléia Provincial, em 02 de março de 1884.

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