O Cérebro faz o homem?
(por Antonio Samarone)
Acreditar que somos o nosso cérebro é uma conveniência existencial. Nos isenta de boa parte das responsabilidades. Qualquer desvio, é atribuído a um transtorno mental, uma doença.
É o fim da culpa, como sentimento ético/religioso.
Por outro lado, aumenta a discriminação. Se qualquer desvio é uma doença o perigo é maior, torna-se uma fatalidade biológica. Aumenta a discriminação.
Acredita-se que a unicidade cérebro/mente já foi comprovada pelas neurociências, mesmo os pontos obscuros, não explicados, é só esperar, é uma questão de tempo. Somos uma máquina físico/química.
Não tem nada comprovado. É uma crença que se legitima com a credibilidade do discurso científico. A ciência é a última referência.
Duvidar dessa evidência, comprovada pela ressonância funcional, é sair do âmbito da ciência. Ocorre, que as neurociências nunca comprovaram nada disso.
A mente é uma função do cérebro. A memória e a consciência são funções do cérebro. A nossa identidade é uma ilusão pretensiosa.
O dualismo corpo e alma é uma ranço obscurantista. O corpo é quem produz a alma.
Qualquer pensamento, ideia, filosofia tem uma base neural, biológica. A poesia brota em determinados cérebros, pré-formados com essa especificidade. Essa crença por enquanto é uma crença.
Se somos o cérebro, perdemos as referências, não existem mais caminhos. Ou cada um faz o seu. O pensamento é um função biológica. Abandonamos a transcendência por soberba e estamos perdidos.
O humanismo foi um equívoco (o homem como referência). O homem é conduzido pela vaidade, não merece confiança. Não é o que pensa que é.
O homem, sendo mais preciso, o seu cérebro, passou a ser a medida de todas as coisas.
Vivo uma confusão: comecei a perceber o funcionamento autônomo do cérebro, ele querendo impor os seus ditames, e eu reagindo. Um colega neurologista disse-me que não se trata de dualismo, a evolução criou estruturas novas e as antigas permaneceram.
O cérebro não é único, são vários.
A confusão aumentou. Eu escolho a qual cérebro obedecer, ou eles decidem entre eles, em reunião? Freud inventou o inconsciente que nos controla. As neurociências foi mais longe, descobriu que é a mente que nos controla e não apenas o inconsciente.
O livre arbítrio é uma ilusão.
Antonio Samarone (médico sanitarista)
terça-feira, 18 de outubro de 2022
O CÉREBRO FAZ O HOMEM
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