terça-feira, 5 de fevereiro de 2019

MAMÃE NÃO QUER OBEDECER



Mamãe não quer obedecer... (por Antonio Samarone).

Encontrei com Rosana, uma amiga de infância, e perguntei como andava a sua mãe. Ela, com o ar impaciente, me respondeu: minha não tem jeito, já está com 79 anos, e não quer ir aos médicos. Pensa que ainda é menina. Ela não sente nada, dorme e come bem (não abre mão da carne frita, aos sábados); e ainda faz a feira sozinha, em Itabaiana. Anda para cima e para baixo, e continua alegre e conversadeira. Já quis trazê-la para Aracaju, e ela não quis nem saber.

Eu não me controlei, e você quer leva-la aos médicos para que? Hum! Para quê? Para fazer um check-up. Ela não lembra mais nem o dia que papai morreu, começou a ficar esquecida. Você sabe que as demências podem ser evitadas, ou pelo menos adiadas. 

Rosana aprofundou a conversa. Argumentei com mamãe, vamos a um geriatra que a senhora está ficando esquecida. Hoje eles fazem uns exercícios para a memória que são maravilhosos. É a ciência, mamãe! Dona Lúcia, retrucou: “mas o esquecimento faz parte da vida, Deus sabe o que faz. Tem muita coisa que eu preciso esquecer, muitos sofrimentos impostos pela velhice que eu preciso não prestar muita a atenção. A felicidade tem os seus segredos.”

Rosana, sua mãe tem razão! Os Serviços de Saúde no Brasil não estão preparados para atender os idosos. São raros os profissionais com formação holística e humanizados. E fui em frente... 

A medicina tem pouco a oferecer, e o que oferece cobra um preço inaceitável. A condição imposta pela medicina é um regramento absoluto: isso não pode, isso não pode e isso também não pode. Viver ficará resumido ao cumprimento da disciplina médica. Se não bastasse, teremos ainda que engolir uma dezena de comprimidos, tem até uma caixinha com os horários. Os idosos consomem 80% dos medicamentos produzidos. Nas proximidades da morte, sobrará um leito de hospital, para os que podem pagar.

Envelhecer é um exercício de desapegos, mas de duas coisas não se pode abrir mão: independência e autonomia. Exatamente as duas coisas que a sociedade quer suprimir. Todo mundo quer mandar nos idosos, a começar pelos filhos, mesmo os bons. É uma atenção cheia de cobranças impacientes.

Rosana silenciou. Não sei se concordando comigo ou para não discutir. 

Antonio Samarone.

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