domingo, 11 de maio de 2025

LÁ VAI PASSANDO A PROCISSÃO

Lá vai passando a Procissão.
(por Antonio Samarone).

“Entra na velhice com cuidado/ Pé ante pé, sem provocar rumores.” Bastos Tigre.

Assisti esperançoso o anúncio do novo Papa, Leão XIV. O mundo está desandando! A Terceira Guerra já começou, só falta o anúncio oficial. O Papa pode ser uma força a remar pela paz.

A fé entra pelo ouvido (fides ex auditu), escreveu São Paulo aos romanos... Não concordo, a fé entra mesmo é pelos rituais. Eu gostava do espetáculo das procissões, em minha infância.

Gostava de todas as procissões: das festivas ou jubilares, a mais importante era a de Santo Antônio; das rogativas, pedindo uma graça, geralmente chuva; das de desagravo, participei de uma, quando numa Santa Missão, ofereceram capim a um frade; e das gratulatórias ou de agradecimento.

A Procissão era um momento especial para se fazer e se pagar promessas. Eu gostava dos cânticos antigos, sobretudo o “Queremos Deus” (Queremos Deus, homens ingratos/ Ao pai supremo, ao redentor/ Zombam da fé os insensatos/ Erguem-se em vão contra o senhor...).

Os fiéis se arrumavam em filas indianas, a cada lado rua, sem atropelamentos, todos obedecendo a uma ordem, quase natural. Na frente, puxando a procissão, vão às Irmandades e Congregações.

Em Itabaiana quem puxava as procissões eram os Irmãos das Almas, liderados por Zé Bigodinho. Todos homens, com camisas verdes, carregando círios acesos.

Eram seguidos pelas Filhas de Maria, de branco, carregando uma fita de cetim azul-celeste sobre o peito. Depois vinham as demais irmandades, todas com os seus estandartes e galhardetes.

Minha mãe era Filha de Maria, depois virou Crente.

A Irmandade do Sagrado Coração de Jesus, com as suas fitas vermelhas, sempre fazia bonito. Depois os fiéis e as beatas menos graduadas.

Muita gente pagando promessa com os pés descalços, carregando pedra na cabeça; outros trajando luto fechado, hábitos franciscanos, cada um cumpria as obrigações assumidas. Promessa é dívida, pelo menos para os devotos.

No centro do cortejo ia o clero e os seus auxiliares: padres, sacristão, coroinhas e os devotos mais chegados. Iam à frente do andor do Santo. Carregando o andor, homens de prestígio.

Cuidado com o andor, que o Santo é de barro. Não me lembro de mulheres carregando o andor, parece que não era uma tarefa feminina.

Atrás do andor, a banda de música com os seus dobrados, os políticos, as autoridades e os graúdos da cidade. Não era lugar para a arraia-miúda, mesmo assim, sempre lotava com um magote de puxa-sacos.

Os meninos brancos e ricos saiam fantasiados de anjos. Aqui tive a minha primeira decepção com a Igreja: mesmo sendo um devotinho assíduo, frequentador do catecismo, nunca me convidaram para ser anjo de procissão.

Depois fiquei sabendo que quem escolhia os anjos de procissão e os meninos a quem lavavam os pés na quinta-feira santa, era uma senhora caridosa, que não me conhecia. Se dizia, que essa devota tinha mais de mil afilhados.

Nas ruas, por onde passava a procissão, o povo se arrumava nas calçadas, pendurava toalhas bordadas nas janelas e, quem tinha, botava um jarro de flor. Juntavam-se os vizinhos e ficavam comentando as novidades. Fofocas e futricas.

As esquinas ficavam lotadas de curiosos, vendo quem estava acompanhado de quem, as roupas, os sapatos e os cabelos de quem passasse.

Quando se fazia um comentário inconveniente sobre alguém, sempre era precedido de um “Deus me perdoe” ou “não é falando não” ou “eu não gosto de fofoca, mas”... E metia-se a bomba.

Terminada a procissão, todos estavam perdoados dos seus pecados veniais. Para os pecados mortais, exigia-se a confissão.

Antonio Samarone – Secretário de Cultura de Itabaiana.
 

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