A Saúde Pública em
Sergipe (Início da República – parte dois)
Antonio Samarone de Santana
Academia Sergipana de Medicina
A situação sanitária do Estado de
Sergipe começou a receber duras críticas através da imprensa. Em 18 de agosto
de 1895, o jornal “Gazeta de Sergipe”, atacou duramente o poder público, em seu
descaso com a salubridade. Cobrava-se dos representantes do povo compromissos
com a saúde pública, visto que “os cargos públicos não são simplesmente meio de
vida; não se aceita somente pelos proventos materiais que deles possam vir”.
Solicitava-se que as autoridades dessem uma volta pela cidade para perceberem a
realidade: febres dizimando a população, falta de asseio nas ruas, casos de
varíola. As condições de saúde da população eram deploráveis e o Hospital de
Caridade estava repleto.
A Inspetoria de Higiene alegava
que nada podia fazer, a saúde pública dependia de variáveis independentes de
sua autoridade. A cidade sem calçamento, sem água potável, impregnada de
miasmas que exalavam dos materiais encontrados nas areias dos aterros, tudo
isso estava fora do seu campo de ação. Era esse o entendimento. A partir de
24/11/1896, quando o Dr. Daniel Campos é renomeado] Inspetor de Higiene, em
substituição ao Dr. Francisco Barbosa Cardoso, começaram a ocorrer pequenas
modificações.
O Dr. Daniel Campos era um médico
de muita influência na sociedade, Deputado Estadual por várias legislaturas,
Presidente da Assembleia, Presidente interino do Estado; o cargo de Inspetor de
Higiene ganhava certa importância com a sua nomeação. O Dr. Daniel Campos
permanecerá no Cargo até o início do Governo Josino Meneses, quando em 13 de
março de 1903, aposentou-se do serviço público.
Daniel Caetano da Silva Campos
Jr, nasceu em 25 de maio de 1855 no engenho Feiticeira, município de Capela/SE,
filho de Daniel Caetano da Silva Campos e Antonia Pinto da Silva Campos.
Formou-se pela Faculdade de Medicina da Bahia em 17 de fevereiro de 1882
defendendo a tese “Fisionomia clínica das moléstias inflamatórias agudas
complicadas de malária”. Estabeleceu-se como clínico em Aracaju, professor do
Atheneu Sergipense,
Daniel Campos foi Inspetor de
Higiene no primeiro governo de Oliveira Valadão (1896) e no governo Olímpio
Campos (1899 a 1902), deputado estadual constituinte por várias legislaturas,
presidente da Assembleia e nessa condição chegou a ocupar o cargo de governador,
entre abril a julho de 1898. Foi fundador da primeira associação médica do
Estado, a Sociedade de Medicina de Sergipe, em 1910. A entidade, entretanto,
teve duração efêmera, sendo extinta um ano depois. Faleceu em 8 de fevereiro de
1922, em Aracaju/SE, com 67 anos.
Com Daniel Campos na Inspetoria
de Higiene, o Diário Oficial começou a publicar o expediente da repartição de
higiene; com avisos sobre a obrigatoriedade da vacinação para menores de 6
meses de idade (a multa era de 10$000), relação das farmácias fiscalizadas, as
ações de polícia sanitária (apreensão de alimentos estragados, etc.),
fiscalização de habitações (o “habite-se” era dado pela repartição de higiene).
O Inspetor tentava cumprir o regulamento sanitário de 1892, inclusive, exigindo
os relatórios dos hospitais de caridade (Aracaju, Laranjeiras, Estância,
Rosário e Maruim).
Contudo, os esforços do Dr.
Daniel Campos não foram suficientes para mudar a estrutura do poder público no
campo sanitário. Reforçando esta afirmativa, vejam a opinião do próprio Presidente
do Estado, Manoel P. Oliveira Valadão, em mensagem â Assembleia Legislativa:
“Não devo ocultar-vos que a nossa Inspetoria de Higiene carece de ser melhorada
ou, direi melhor organizada. É uma repartição desprovida de tudo, inclusive de
pessoal, porque a lei que lhe deu existência apenas criou o Inspetor, comose
esse por si só pudesse fazer todo o serviço e constituir o que em linguagem
administrativa se chama repartição.
A estrutura da Inspetoria de
Higiene expandiu-se para o interior. Em 1898, possuíam Delegado de Higiene
nomeados os seguintes municípios: Japaratuba, Dr. Gonçalo de Faro Rollemberg;
Laranjeiras, Dr. Antônio Militão de Bragança; Maruim, Dr. Sebastião de Andrade;
Estância, Dr. Sebastião Lisboa; São Cristóvão, Dr. Antonio Miguel do Prado;
Rosário, Cirurgião Benito Derisans Nabuco; Capela, Dr. Francisco Muniz;
Itaporanga, Dr. Aurélio de Resende; Divina Pastora, Dr. Alexandre de Oliveira
Freire; Propriá, Farmacêutico Epímaco de Azevedo Melo; Lagarto, Dr. Felino
Martins Fontes; Simão Dias, Dr. Joviniano Joaquim de Carvalho; Itabaiana, Dr.
Manoel Baptista Itajay; Riachuelo, Farmacêutico Cantidiano José de Oliveira, e
Vila Nova, Dr. Felício de Castro. Nos municípios não citados, o cargo de
Delegado de Higiene encontrava-se vago.
Em 23 de dezembro de 1899,
através da lei nº 58, foi criado o Serviço de Higiene do Município de Aracaju.
Entre outras competências, esse Serviço era responsável pelo asseio da viação
pública e pela coleta do lixo. O Regulamento do Serviço Municipal de Higiene só
foi aprovado em 14 de julho de 1913.
Com a aposentadoria, em 14 de
março de 1903, do Dr. Daniel Campos, assumiu o cargo de Inspetor de Higiene o
Dr. Theodureto Nascimento, no Governo de Josino Menezes. A saúde pública
recebeu um novo alento, explicado pelo surgimento de uma incipiente opinião
pública, pela permanência do quadro sanitário (exacerbado pela epidemia de
peste bubônica), pela competência do novo Inspetor e pela formação profissional
do Presidente do Estado (governador), que era um farmacêutico atuante.
Theodureto Archanjo do
Nascimento, nasceu em 16 de setembro de 1866, em Lagarto/SE, filho de Miguel
Archanjo do Nascimento e Josepha Maria do Nascimento. Recebeu grau de doutor em
medicina pela Faculdade da Bahia em 18 de dezembro de 1886, defendendo a tese
“Alcoolismo embriaguez”. Participou do movimento republicano em Sergipe. Em
1891, foi à Europa estudar o tratamento da tuberculose com o uso da linfa.
Durante a administração de Josino
Menezes (1902 a 1905), o Dr. Theodureto apresentou um projeto de reforma
sanitária avançado, embora ele próprio achasse inexequível, devido à situação
do erário. Entre as mudanças mais importantes, ele defendeu a reforma do
regulamento da Inspetoria de Higiene, a aprovação de um código sanitário, o
nivelamento e drenagem do solo da capital, canalização de água para Aracaju,
uma rede de esgoto, criação do desinfectório modelo, um hospital para doenças
contagiosas, fornos de incineração e o tão sonhado instituto soroterápico
vacinogênico. Continuaremos depois sobre o Governo Josino Menezes.
Foto: Hospital de Nossa Senhora
do Rosário, Sergipe.
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