sexta-feira, 9 de dezembro de 2022

VELHOS AMIGOS

 Velhos amigos.
(por Antonio Samarone)

Não sei como os velhos suportavam a vida antes das redes sociais. As relações virtuais são mais amplas, consistentes e menos trabalhosas. Quando se tornam chatas, se deleta. Simplesmente.

Os amigos de carne e osso tomam o tempo, querendo contar as suas estórias, muitas vezes repetidas. Em geral, são falsos e invejosos. Não conte com os amigos, são poucos.

A solidão na velhice é uma opção. O tempo desvenda as almas. Nas casas de repousos (asilos), não existe diálogo entre os internados. As estórias do outro não interessam. Os velhos deixam de contar vantagens e não se interessam pelas vantagens dos outros.

Os amigos virtuais não cobram atenção, podemos deixar as narrativas escritas e não ficamos sabendo se foram lidas. Não precisa! Basta uma curtida, um “emoji” de aprovação, que a leitura fica dispensada. Se a opção for um comentário positivo (belo texto), a felicidade é completa.

"As mentiras sinceras interessam." Cazuza.

Os amigos virtuais são bichinhos de pelúcia, que podem ser descartados sem peso na consciência.

A vida virtual foi criada para suportamos a realidade na velhice, para continuarmos vivendo coletivamente, mesmo sozinhos.

Os valores, a personalidade, o caráter, os desejos, as crenças e as ilusões estão localizadas no córtex pré-frontal, o resto é cenário. Os apetites inconscientes e os desejos do “id” são amansados na velhice.

A família é o último refúgio de carinho, solidariedade e proteção. É a nossa melhor herança evolutiva.

O celular ligado a internet 5G é uma grande companhia, o melhor amigo, sempre disponível. A ante-sala do paraíso. O verdadeiro calor humano é virtual, subjetivo, uma função do cérebro.

As emoções nascem na alma, na memória e na sensibilidade afetiva de cada um. Com a velhice, renasce a gratidão, doma-se o ego e a vaidade, aprofunda-se a certeza da morte e do esquecimento.

Tenho pouco tempo e muito a dizer. Cadê a coragem para contrariar? Espero que essa virtude chegue antes da demência. Freud está certo: “a natureza não tem compromissos com a felicidade.”

Buda achava que a felicidade era a ausência dos desejos. O capitalismo concorda, desde que, não se renuncie ao desejo de consumo.

“Que a luz eterna dos refletores brilhe sobre nós!”

Antonio Samarone (médico sanitarista)

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