Novas Saúvas.
(por Antonio Samarone)
Terminado o curso de medicina, me especializei em Saúde Pública. Foi difícil explicar a mamãe o que fazia um médico sanitarista. A salvação foi apontar a obra de Osvaldo Cruz: saúde pública é isso! Mamãe fez de conta que entendeu.
Se a pergunta fosse hoje, a resposta seria mais complicada. Os higienistas do meu tempo carregavam uma narrativa civilizadora. Havia um círculo vicioso pobreza/doença. Lembram-se do Zeca Tatu de Monteiro Lobato?
A maioria das pestes estavam relacionadas com as condições de vida, com a pobreza. Como acabar com a pobreza não estava nos planos, os sanitaristas sonhavam em acabar com as doenças.
Investia-se em dois planos: na mudança dos hábitos de higiene pessoal, através da educação sanitária; e no combate aos insetos transmissores, através das campanhas da Saúde Pública.
Um único mosquito, o Aedes aegypti, transmite quatro endemias graves. Oswaldo Cruz saiu como um louco matando esse mosquito. Uma luta inglória, os mosquitos se adaptaram aos venenos.
A nova Saúde Pública encontrou novos métodos: além das vacinas, o Instituto Butantã acaba de anunciar a descoberta de uma vacina eficaz contra a dengue, a fundação Bill Gates, patrocina um laboratório em Medellín, na Colômbia, que produz 30 milhões de mosquitos geneticamente modificados, por semana.
Explico, o Aedes para se reproduzir precisa de sangue, e cada humano tem cerca de cinco litros. Nesse banquete, o mosquito injeta o vírus.
As novas tecnologias apontam: vamos produzir mosquitos estéreis, que não precisam de sangue, e vamos jogá-los na natureza. Nessa concorrência legitima, logo, logo, os mosquitos naturais vão desaparecer.
Se anuncia, que outras doenças entrarão nessa lista. A Fundação Bill Gates quer produzir os mosquitos (são muitos) da malária, para espalhar na floresta amazônica, e produzir o amedrontador “barbeiro”, para soltar na Bahia e no Norte de Minas Gerais.
Os velhos sanitaristas diziam cheios de orgulho, que o fim da doença de Chagas dependia de residências higiênicas para todos, um amplo programa habitacional. Vivíamos num Brasil Rural. A doença de Chagas precisava do BNH e não do DDT.
Os insetos geneticamente modificados, desmontaram o discurso social da Saúde Pública. A Fundação Bill Gates quer acabar com as doenças sem mexer com a pobreza.
Os mosquitos também viraram mercadorias, com patentes e donos, comercializados nas bolsas de valores. A Big Pharma investe na introdução da inteligência artificial nos mosquitos. Um sonho, os mosquitos passarão a picar seletivamente, de acordo com o software.
Acho que os “maruins” aqui em casa já são dessas inteligentes. Nada explica a seletividade deles em me picar, sempre no tornozelo.
Imaginem, como explicar isso a mamãe.
Feliz Natal.
Antonio Samarone (por enquanto, médico sanitarista)
domingo, 25 de dezembro de 2022
NOVAS SAÚVAS
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