quarta-feira, 28 de julho de 2021

VELHOS AFORISMOS


Velhos Aforismos.
(por Antonio Samarone)

"A vida é breve, a arte é longa, a ocasião fugidia, a experiência enganosa e o julgamento difícil," é um conhecido aforismo de Hipócrates. Aliás, esquecido pelos médicos.

Os aforismos são sentenças que abreviam uma sabedoria, são verdades comprovadas pela vida.

Nesse processo de recuperação da memória, lembrei-me de um aforismo aprendido na infância: “Viver é enterrar os amigos”.

Pegar na alça do caixão e acompanhá-lo até a sepultura, é a prova final e definitiva da amizade. Uma solidariedade sem recompensa.

Esse aforismo é da lavra de Miguel Fagundes, um personagem itabaianense que nunca perdeu um sepultamento. Pegou na alça do caixão de muita gente. A contrapartida foi, ser o seu sepultamento, o maior da história da Villa de Santo Antonio e Almas de Itabaiana.

Deixei de enterrar muitos amigos! Deixei de viver por conta da Pandemia.

Concordo com Machado de Assis: “A morte é séria e não admite ironias.” Mas não estou com ironias. Fiz um levantamento criterioso: numa relação aleatória de 370 pessoas que eu conhecia em Itabaiana, há meio século, 217 já morreram, 73 eu perdi de vista, não sabendo o destino, e somente 80 estão vivas.

Vivas, é o jeito otimista de dizer, pois uma fração já está com o pé na cova.

Uma das queixas da Pandemia foi essa proibição de enterrar os meus mortos. O fim dos velórios. A Pandemia estreitou a condição humana.

Recebemos este pomposo nome de “Ser Humano”, porque enterramos os mortos.

“Inumar” (inhumare) é enterrar e “exumar” (exhumare) é desenterrar. Portanto, distintos mortais, humanos (humare) são aqueles que enterram os seus mortos. O esquecido aforismo de Miguel Fagundes está certo.

Cientificamente somos Homo sapiens. A nomenclatura “Homo” é recente, somente em 1758, Lineu dá vida ao seu Systema Naturae, que até hoje vigora nos estudos biológicos. O “sapiens!” é por conta da nossa pretensão desmedida.

O aforismo de Miguel Fagundes – “Viver é enterrar os amigos”, é mais profundo do que ele pensava.

Antonio Samarone (médico sanitarista)


 

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