Velhos Aforismos.
(por Antonio Samarone)
"A vida é breve, a arte é longa, a ocasião fugidia, a experiência enganosa e o julgamento difícil," é um conhecido aforismo de Hipócrates. Aliás, esquecido pelos médicos.
Os aforismos são sentenças que abreviam uma sabedoria, são verdades comprovadas pela vida.
Nesse processo de recuperação da memória, lembrei-me de um aforismo aprendido na infância: “Viver é enterrar os amigos”.
Pegar na alça do caixão e acompanhá-lo até a sepultura, é a prova final e definitiva da amizade. Uma solidariedade sem recompensa.
Esse aforismo é da lavra de Miguel Fagundes, um personagem itabaianense que nunca perdeu um sepultamento. Pegou na alça do caixão de muita gente. A contrapartida foi, ser o seu sepultamento, o maior da história da Villa de Santo Antonio e Almas de Itabaiana.
Deixei de enterrar muitos amigos! Deixei de viver por conta da Pandemia.
Concordo com Machado de Assis: “A morte é séria e não admite ironias.” Mas não estou com ironias. Fiz um levantamento criterioso: numa relação aleatória de 370 pessoas que eu conhecia em Itabaiana, há meio século, 217 já morreram, 73 eu perdi de vista, não sabendo o destino, e somente 80 estão vivas.
Vivas, é o jeito otimista de dizer, pois uma fração já está com o pé na cova.
Uma das queixas da Pandemia foi essa proibição de enterrar os meus mortos. O fim dos velórios. A Pandemia estreitou a condição humana.
Recebemos este pomposo nome de “Ser Humano”, porque enterramos os mortos.
“Inumar” (inhumare) é enterrar e “exumar” (exhumare) é desenterrar. Portanto, distintos mortais, humanos (humare) são aqueles que enterram os seus mortos. O esquecido aforismo de Miguel Fagundes está certo.
Cientificamente somos Homo sapiens. A nomenclatura “Homo” é recente, somente em 1758, Lineu dá vida ao seu Systema Naturae, que até hoje vigora nos estudos biológicos. O “sapiens!” é por conta da nossa pretensão desmedida.
O aforismo de Miguel Fagundes – “Viver é enterrar os amigos”, é mais profundo do que ele pensava.
Antonio Samarone (médico sanitarista)
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