quarta-feira, 4 de setembro de 2013

José Augusto Machado - Baldock








José Augusto Machado (Baldock) é da geração de itabaianenses de 1954, nascido e criado no último trecho da Rua de Vitória, dentro do miolo cultural do Beco Novo. Filho de Seu Zé de João de Sajoaninha e Dona Mariinha. Começou o primário na Escola de Dona Jozeíta, defronte ao Clube do Trabalhador, depois teve a sorte de ser transferido para o conceituado Educandário Zenaide Cardoso Schultz, onde concluiu o primário. Baldock tem dois irmãos, Tonho de Mariinha, comerciante em Aracaju conhecido por Demacon, e Roberto, pequeno empresário do mercado financeiro, residente em Itabaiana, e uma irmã, Maria José, dona de casa, esposa do finado Joel.
Conheço José Augusto desse tempo, Eu no Beco Novo e ele na Rua de Vitória. De primeira, fizemos logo amizade, Baldock não era de brigas, uma raridade naquelas bandas, inteligente, engraçado, sempre gostou de dar uma “cordinha”.  Desde pequeno, triste de quem se metesse a besta de enfrentá-lo numa polêmica, com o raciocínio rápido e desconcertante, ele deixava qualquer sem graça, encabulado.
Uma infância sem Papai Noel, aniversários, dia da criança, estatuto, Juiz de Menor, Conselho Tutelar, uma infância sem proteção, mas, curiosamente, uma infância feliz. Um tempo onde o temível bullings era liberado e as drogas desconhecidas. Baldock desde pequeno era bom de bola, ao contrário de Nilo Base, Baldock não chutava forte, não cabeceava, não era veloz e driblador, não era pancadeiro, mesmo sem nenhuma virtude específica, era uns dos primeiros escolhidos quando se iam dividir os times numa peladas.
Baldock se destacava nos campeonatos organizados por Luiz Américo, no famoso campinho de Baltasar, onde, com cinco na linha e um no gol, ocorriam batalhas homéricas. Em um dos certames, organizamos uma equipe com os meninos mais precisados. Grilo de Firmino, no Gol, Baldock, Vadinho de Nilo, Beijo de Bebé, Eu e Nego Gato de Bonito, fomos campeões. Baldock, sempre generoso, teve logo a ideia de levarmos uma parte da premiação para Beijo, que tinha quebrado um dedo e não participou da final, e para ver se agradava seu Bebé, o pai de Beijo, que não dava moleza na criação dos filhos, e ele abrandava, deixando Beijo ir mais para peladas.
Por volta de 1967, Dr. Pedro Garcia Moreno resolveu tomar conta do futebol em Itabaiana, foi uma revolução de esperança, a cidade interira passou a achar que agora o futebol local ia para frente. Entre as novidades, Dr. Pedro resolveu criar um juvenil, e designar Miguel de Rola para treinador. No dia da seleção dos atletas, um sábado à tarde no Etelvino Mendonça, Baldock, quando perguntado em quê posição ele gostaria de jogar, ninguém entendeu, mas ele escolheu ser quarto zagueiro, uma posição destinada aos mais brutos. Se esta posição não lhe rendeu um futuro no futebol, deixou pelo menos o nome Baldock,  grande zagueiro palmeirense, time pelo qual o nosso José Augusto torce desde que nasceu.
Miguel de Rola era um treinador rigoroso, um disciplinador, punia com suspensões severas pequenas falhas os atrasos. Ninguém piava. Antes dos coletivos, Miguel iniciava longas sessões de aprendizado dos fundamentos do futebol: o chute, o passe, o cabeceio, o domínio e o drible. Ensinava a cobrança do lateral, escanteio, faltas. Certo dia, num treinamento de faltas, Miguel resolveu escalar Baldock para ficar na barreira, depois de umas cobranças violentas, Baldock se rebelou, saiu da barreira e falou para Miguel: - “peraí meu amigo, me diga um único jogador que ficou famoso por sem bom de barreira”? Tudo mundo caiu na gargalhada e Miguel mudou de treinamento.
Ginásio e Científico Baldock fez no Murilo Braga, nossa fábrica de gente, de cidadãos, caminho único de ascensão social para os que habitavam nos andares de baixo. Com a adolescência, a realidade começa a cobrar seu preço, a exclusão, os privilégios, as diferenças sociais, mostram suas garras com mais nitidez. Baldock também precisou trabalhar logo cedo para ajudar em Casa.
Baldock passou no vestibular de Engenharia Química, e foi morar na lendária “República Cebolinha”, na Rua de Maruim 488, por onde passaram dezenas de itabaianenses em busca da cidadania. Dr. Luiz Carlos, Fontes, Guilhermino, Zé Valdo, Elio Lima, Zé Nivaldo, Eu, Adilson, João Patola, entre outros, numa experiência de vida singular. A comunidade da República era frequentada por diversos conterrâneos, Maceta, Mãe Gorda, Jorge de João Marcelo, etc. Em certo momento, fins da década de 1970, a República Cebolinha se transformou na embaixada informal de Itabaiana, servindo de sede para a torcida organizada do Itabaiana, presidida neste período por Maceta.
Baldock não se adaptou bem com a engenharia química, veio embora para Itabaiana, sem dar a menos satisfação a UFS. Isso lhe custou caro, pois foi selecionado em 2º lugar num concurso da Petrobrás, um sonho para muita gente, e na hora da convocação, a Empresa deve ter consultado a UFS, e com a informação do abandono, ele simplesmente foi cortado. Os tempos eram outros.
Voltou para Itabaiana, e foi dar aulas no Murilo Braga, e ficar aguardando outro sonho de menino pobre, passar no concurso do Banco do Brasil. Não demorou, Baldock foi aprovado, e tomou posse no prestigioso cargo de bancário do BB, em Remanso, no estado da Bahia. Isso mesmo, Remanso coberto pelo Lago de Sobradinho...
Tempos depois é transferido para Itabaiana, e passa levar a confortável vida de funcionário do Banco Brasil. Só que as coisas mudam, o Banco entra em crise, e aparece o terror do enxugamento, da redução de funcionários, da demissão voluntária. O clima no Banco torna-se insuportável, e mais uma vez Baldock surpreende a todos, pede demissão, e transforma-se num pequeno comerciante de embalagens, coisa que as pessoas de fora, pensa que todo itabaianense já nasce sabendo, é do sangue, todos são bons comerciantes.
Passa um tempo na Prefeitura, vai me ajudar na SMTT de Aracaju. Um dos grandes pepinos de minha passagem pela SMTT foi a relação com as Empresas de ônibus. Entre outras atribuições, a SMTT era responsável pela comercialização da meia passagem estudantil, da emissão da carteira de estudante, etc, enfim, uma área susceptível de malandragens. Eu precisava de alguém direito e competente, onde buscar? Não pensei duas vezes, vir a Itabaiana buscar meu compadre Baldock. Acertei em cheio.
Depois ele volta para a Prefeitura de Itabaiana, para assumir o honroso cargo de Tesoureiro Municipal. Atualmente, nosso empossado é proprietário do e Bar e Restaurante Mãe Gorda, na Praia do Robalo em Aracaju. Para mim um presente, pois moro a menos de 300 metros, quando quero matar a saudade das coisas de Itabaiana, sempre encontro o anfitrião, mais Demacon, Djalma Lobo, Betinho de Zé de Prima, Nivaldo de Joãozinho Vermelhinho, Sardão, Gilson de Chico Bateria, entres outros ceboleiros menos votados, todos cheios de estórias.
O Homem. Além da inteligência e bom humor, Baldock é uma homem solidário com os amigos. Na década de 1970, rondava os bares de Itabaiana uma figura enigmática conhecida como Polonês, dizia-se ser um fugitivo do exército da Polônia, quase engenheiro, chegou a Itabaiana contratado por Euclides Paes Mendonça, para construir a antiga Sede da Câmara de Vereadores, um prédio com dois pavimentos, ao lado do Tanque do Povo.
O Polonês caiu doente, sozinho, e foi Baldok quem tomou a frente, conseguindo uma vaga no Hospital de Cirurgia, em Aracaju, para que seu amigo não morresse à míngua. O Polonês não resistiu, faleceu, e Baldock é chamado pelo hospital, para saber se alguém ia assumir o sepultamento, ou eles passariam o corpo, como indigente, para fins de estudos na Faculdade de Medicina. Baldock, sem um centavo no Bolso, assumiu o sepultamento. Contratou uma funerária, botaram o homem numa Kombi e rumaram para Itabaiana. Primeira dificuldade, onde velar o corpo.  Foi procurar Clodomir, que ajudou na missiva cristã. No outro dia, Baldok, mais três ou quatro bêbados, iniciam um cortejo até o Cemitério de Santa Cruz, a época particular, e sepultaram com dignidade um homem decente, competente, que a vida empurrou para as sarjetas de Itabaiana.
Baldok é autor de dois bons livros de causos. Herdeiro do velho humor irônico de Itabaiana, legítimo sucessor de Alberto Carvalho, Filomeno, Maceta, Fred de Etelvino, Emerson de Viera Lima, etc. Os livros também revelam, aos mais atentos, uma parte de nossa formação econômica e social. Ex – a origem dos caminhoneiros, e a memória das profissões artesanais, tão presente, em certo período de nossa estória. Seja bem vindo a nossa Academia.

Antonio Samarone de Santana
Academia Itabaianense de Letras.

Um comentário:

  1. Adorei! Criatura muito querida por todos seus amigos de fato.
    Estou precisando visitá-lo no Bar e Restaurante Mãe Gorda.

    Abração.

    ResponderExcluir