quarta-feira, 16 de abril de 2025

MEMÓRIA ALDEÃ - HISTORIA DO BOM JARDIM.


 Memória Aldeã – A história do Bom Jardim.
(por Antonio Samarone)

O único historiador sergipano a narrar as histórias das pequenas comunidades, dos povoados, foi Sebrão Sobrinho. Como surgiram essas povoações? Alguns foram antigos quilombos, aldeias indígenas ou engenhos desativados.

Em Itabaiana, foram quilombos: Barro Preto, Carrilho, Tabocas e Dendezeiro. Foram aldeias (tabas): Maitapoam, Caraíbas e Flechas. Sebrão acreditava que todos os povoados nasceram como tabas indígenas. Desconhecia os quilombos, reforçando a crença que em Itabaiana não tinha negros.

No Brasil Colônia, as terras foram distribuídas aos fidalgos pelo sistema de sesmarias. Via de regra, os beneficiados não as exploravam pessoalmente. Arrendavam para a criação de gado ou plantação de cana. O trabalho dominante era escravo. As sesmarias mediam-se em léguas.

O sistema de sesmaria chegou ao fim em 1822. A lei da terra, que introduziu a lógica mercantil, é de 1850. Passaram-se 28 anos sem normas jurídicas para a propriedade da terra. Predominavam as posses.

Nesse período, as ocupações de sesmarias improdutivas, dos espaços entre as sesmarias e as terras devolutas se acentuaram. As ocupações criaram os minifúndios, a cultura de subsistência e pequenos aglomerados populacionais (os povoados).

Essa realidade histórica, explica a distribuição de terras em Itabaiana. A ausência de latifúndios em torno da Villa. Os minifúndios conduziram a agricultura de subsistência, a produção de alimentos, sobretudo da farinha de mandioca. Nesse tempo, Itabaiana torna-se o celeiro de Sergipe.

Essa ocupação populacional do Pé da Serra de Itabaiana foi reforçada pela Peste de Cólera de 1855. Diante da Peste, a solução sensata era fugir. Sabia-se que a medicina era impotente e um par de botas constituía o mais seguro dos remédios. Desde o século XIV a Sorbone aconselhara aos que podiam que fugissem logo, para longe e por longo tempo.

Em Itabaiana, durante a pandemia de Cólera de 1855, atuou o Dr. Manoel Simões de Mello, que pouco pôde fazer, uma vez que a população daquele município, tendo em vista o abandono das autoridades, fugiu para as matas e serras vizinhas, não se encontrando quase ninguém no centro da Villa.

Assim nasceu o Bom Jardim: ocupação da terra pelas brechas da lei, acelerada pela fuga da Peste. Recebi de Seu Onésimo José de Jesus, um bom-jardinense raiz, uma versão consistente da história do povoado, que usei como principal fonte desse texto.

Trabalhadores sem-terra, residente na Villa, liderados por Vitório José de Jesus, por volta de 1850, ocuparam terras abandonadas no pé da Serra de Itabaiana. A terra era boa, clima ameno e água cristalina. Na chegada, os ipês estavam floridos. O nome estava evidente: Bom Jardim.

Vitório José estabeleceu-se na nova terra com a família. A esposa, Vitória Maria do Espírito Santo, e dez filhos: Felipe, Teófilo, Manoel, João José, Antonio Alexandre, Cândido, José Bispo, Josefa, Maria e Lourença. O texto de Seu Onésimo traça uma genealogia detalhada dos descendentes do fundador.

A escola só chegou ao Bom Jardim no século XX. Em 1910, aparece a primeira professora, Dona Lolosa, que veio do Aracaju. Ficou pouco tempo. Em 1915, trouxeram uma professora de Itabaiana, Maria Teodora, que ensinou por quatro anos.

Uma comunidade de devotos, gente rezadeira, religiosa. As missas começaram a ser rezadas pelo padre Vicente Valetim da Cunha, na casa de seu Brasiliano Bispo, onde também aconteciam as aulas de catecismo.

Dessas missas surgiu a ideia em se colocar um Cruzeiro no alto da Serra. A solenidade de instalação do Cruzeiro foi uma festa, comandada pelo Frei João, com mais de trezentos participantes. Gente de todos os povoados serranos. O Cruzeiro permanece lá até hoje.

Uma comissão de moradores solicitou ao Governo do Estado, Manoel Dantas, por intermédio do Intendente de Itabaiana, Cazuza de Queiroz, uma professora estadual. Foi enviada a Professora Laura Maria dos Santos, vinda do Aracaju. O senhor Lucas Evangelista cedeu a sua casa para a professora morar e se mudou para um povoado vizinho.

Em 1931, os netos de Seu Vitório, o fundador do povoado, resolveram construir uma capela, com apoio total do Padre Antonio Freitas, o pároco da Villa. A capela foi consagrada ao Sagrado Coração de Maria e solenemente inaugurada em 05 de fevereiro de 1936. A capela é belíssima (foto). Sebrão cita a existência de uma afinada Banda de Pífano, a filarmônica local, que acompanhava as festas religiosas.

Precedida por uma Santa Missão, pregada pelo Frei André, a padroeira foi entroniza na primeira capela da Paróquia de Santo Antonio e Almas, em 05 de fevereiro de 1936, sob a benção do Cônego Jugurta Feitosa Franco. A capela (foto), reformada em 1986, pelo Arcebispo Luciano Duarte. Completou 89 anos. Hoje, a capela pertence à Paróquia Nossa Senhora do Carmo,

Na década de 1950, foi construída uma escola estadual (hoje escola municipal Luís Floresta). Várias professoras marcaram passagem pelo Bom Jardim: Ester dos Santos, Maria Senhora de Jesus, Dona Zuleide.

Nessa época, década de 1950, Euclides Paes Mendonça, em seu ímpeto desenvolvimentista, construiu uma estrada trafegável para Itabaiana. Hoje essa estrada é asfaltada. Foi um grande progresso.

Na década de 1970, com a ajuda do Monsenhor Carvalho, foi instalada a luz elétrica, com ligação domiciliar. A comunidade conta com Unidade de Saúde, Escola Municipal de qualidade, água encanada, salão comunitário, associação de moradores atuante, bares e restaurante, com a famosa comida caseira. Aos domingos, vale a pena ir tomar o café da manhã no Bom Jardim.

O belo povoado tem memória do seu passado, orgulho do que o construíram, lembranças dos seus líderes e benfeitores, vaidade pela qualidade de vida. É o velho segredo: No Bom Jardim não tem ricos nem miseráveis, tem cidadãos. Camponeses ciosos da sua condição.

Acredito que no novo destino turístico de Itabaiana, o Bom Jardim será um polo atrativo, uma Trancoso, de Porto Seguro. Por onde andam os empreendedores? Tirem a grana do mercado financeiro. O Ecoturismo é o futuro.

Antonio Samarone – Secretário de Cultura de Itabaiana.

Um comentário:

  1. Não conhecia esse detalhe do cólera, faz todo o sentido. Que seu texto ressoe por todos os cantos, o Bom Jardim quer mostrar seus dotes e receber quem lhe quiser bem!

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