Memento mori
(por Antonio Samarone)
Amanheci na Igreja dos Capuchinhos, no Bairro América, para submeter-me a imposição das cinzas. Talvez o mais humano dos rituais cristãos. Um cego procurando a luz na imensidão do Cosmo.
Aceitar a imposição das cinzas é um reconhecimento da fragilidade da condição humana. Um ritual do cristianismo primitivo.
A única verdade absoluta: “Tu és pó e ao pó retornarás.” Crentes e ateus submetem-se a esse destino. É um sinal de penitência, arrependimento e conversão.
Na Roma antiga, quando um general vencia uma batalha, percorria a cidade em triunfo, saudado pelos cidadãos e acompanhado de um escravo que sussurrava em seu ouvido uma expressão em latim: “memento mori”, Lembra-te de que morrerás.
O ateu materialista, puro-sangue, deu lugar ao agnóstico, ao cético. Hoje, luta é pelo ré encantamento do mundo. A fronteira entre o crente e o descrente estreitou-se.
O Frade capuchinho, para minha surpresa, não falou da morte. Nem da condição humana. Disse que era a entrada da quaresma e mudou de toada. Pregou sobre a vida! Glorificou o lema da Campanha da Fraternidade: “Ecologia Integral – Deus viu que tudo era muito bom”. Igreja sai em defesa do planeta.
A teologia da libertação voltou, pela via ambiental. Enquanto o César americano, cheio de soberba, prega o avanço sobre a terra, a exploração sem limites dos combustíveis fósseis. Nega a crise climática! Rompe com o acordo de Paris. A Igreja do Papa Francisco clama em defesa da natureza.
“Estou corajoso para falar ao meu Senhor, eu que sou pó e cinza” (Gn 18, 27).
Antonio Samarone (Secretário de Cultura de Itabaiana)
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