quinta-feira, 4 de dezembro de 2025

O DIREITO DE MIJAR


 O Direito de Mijar.
(por Antonio Samarone)

A Constituição Federal, de 1988, em seu artigo 5º, estabeleceu os direitos fundamentais. O direito de ir e vir, lazer, transporte, liberdade de expressão, inviolabilidade, de expressão, de resposta, de propriedade... , etc. Quase uma centena.

E o direito de mijar? Nada! Vamos apresentar uma emenda coletiva, de iniciativa popular.

A necessidade incontida de mijar, sem um local disponível, é um sofrimento que só sabe quem precisa. Nas festas públicas, ensopados de cervejas, os brincantes mijam atrás dos postes, dentro de garrafas PET ou em um canto escuro.

A lei obriga a existência banheiros provisórios. Um horror: quentes, inseguros, sem privacidade, malcheirosos, sem papel higiênicos e piso sujo. Um inferno!

Se alguém soltar o barro nesses banheiros, ficam interditados para o resto da festa. O mau cheiro chega ao palco.

No dia-a-dia, os idosos, diabéticos, os que sofrem de algum tipo de incontinência, padecem em via pública, em busca de um simples sanitário.

Os bares e restaurantes são obrigados a ofertarem esse serviço a clientela. Como transeunte, tente usá-los. Será recebido com uma cara feia. No mínimo.

A maioria desses banheiros estão fechados, a pessoa que precisar, vai pedir a chave ao gerente, que deixa claro, com a má vontade, que está lhe fazendo um grande favor. Na Bahia, os turistas pagam uma taxa do mijo.

Antes, as Prefeituras construíam banheiros nas praças, mercados e logradouro. O difícil era a manutenção. A sujeira e a depredação eram regras. O que fazer?

A Prefeitura de Itabaiana recorreu à Inteligência Artificial, e implantou banheiros públicos, que se limpam sozinhos. Liberam bom ar. O papel higiênico é automático, o cristão basta não se mexer muito.

Vejam a foto. A máquina é automática.

O mais interessante, o banheiro fala. O abençoado para na porta, o banheiro ordena: aperte o botão. A porta se abre, o banheiro parece que nunca foi usado. Cem por cento limpo e cheiroso.

O banheiro comanda: pode começar. O sujeito, desconfiado, olha para ter a certeza que não tem uma câmara escondida. E relaxa. Terminado o serviço, o banheiro detona a descarga. E ainda pergunta, satisfeito? Você não sabe se responde ou apenas balança a cabeça confirmando.

Terminada a necessidade, o banheiro avisa: você ainda tem 15 minutos. Tem que fique, só admirando.

Não adianta querer mijar fora do vaso. O banheiro não deixa. Nada de depredações, nada de escrever bobagens nas paredes (como nos antigos banheiros públicos), cuspir no chão, nem falar alto. O banheiro é uma lição de higiene.

Soube, que já existem caravanas, que veem fazer compras em Itabaiana, só para aproveitar o sanitário inteligente e mijarem sossegados. E ainda, sair contando para os descrentes.

Tem gente que vai aproveitar o Natal em Itabaiana, só para soltar o mijo preso.

A Revolução Francesa esqueceu de incluir em seus “Direitos Humanos”, o direito de mijar, a hora que precisar, protegido dos olhares indiscretos.

Antonio Samarone – Secretário de Cultura de Itabaiana.

quarta-feira, 3 de dezembro de 2025

O CORETO DE ROUPA NOVA

O Coreto de roupa nova.
(Por Antonio Samarone)

Os Coretos nasceram na China. Originalmente, um local ao ar livre para apresentações musicais, sobretudo os cânticos.

Quando o homem começou a cantar, já dançava, soprava flauta, pintava e esculpia. Todas voltadas para a sobrevivência. Só o canto é sublime. Canta-se para seduzir os deuses.

Os antropólogos conhecem as dificuldades para as mulheres sertanejas entoarem as “excelências”, em velórios e sepultamentos. Os cânticos sacralizam os velórios, encantam os deuses e aproxima a eternidade.

Os Templários subiam as fogueiras cantando. Quem canta, seus males espantam.

“A ferida de Ulisses, feita pelo javali no monte Parnaso, foi sarada pelo filho de Autólicus, cantando a fórmula que fazia cessar a hemorragia.” – Câmara Cascudo.

No Brasil, os coretos datam do período colonial. Entretanto, a sua disseminação deveu-se ao movimento Tenentista, na ânsia de difundir o nacionalismo. As bandas marciais precisavam de um espaço para os seus dobrados.

A Revolução de 1930, trouxe os coretos. O de Itabaiana (foto) é de 1934, construído na gestão do Intendente Othoniel Dorea. Um coreto quase centenário, 91 anos.

Com o tempo, os coretos caíram em desuso. Foram meio esquecidos.

Esse ano, em Itabaiana, os velhinhos da Praça da Igreja tomaram as dores do coreto. Protestaram: não é justo a prefeitura colocar na praça, sanitários comandados pela inteligência artificial, que até fala, e deixar o velho coreto abandonado.

A Praça está sendo ajardinada nos moldes de Versalhes, superando os jardins suspensos da Babilônia. Já é a Praça mais bela de Sergipe.

Pedido atendido: o coreto foi embelezado e entrará o ano novo de roupa nova.

Por falar em Natal, Itabaiana acenderá as luzes na sexta-feira, dia 05, depois da missa das 19 horas, na Matriz de Santo Antonio e Almas. Vale a pena.

Antonio Samarone – Secretario de Cultura de Itabaiana.
 

terça-feira, 2 de dezembro de 2025

PEDRO DA JABÁ

Pedro da Jabá.
(por Antonio Samarone)

A carne salgada e seca é milenar, não foi inventada no Nordeste. Aqui, virou carne do sol. Nos Pampas, a carne seca, salgada, com cura úmida e prensagem, virou Jabá (charque), que teve excelente aceitação no Nordeste.

A jabá pode ser consumida crua, conservada fora da geladeira e combina com farinha. A farofa de jabá de Zefinha de Catulino, já é servida nos melhores restaurantes de Paris.

Nas feijoadas, o único prato exclusivamente brasileiro, cabe de tudo, mas só não pode faltar a jabá. Pode faltar até pé e orelha de porco, mas a jabá é imprescindível.

A paçoca é uma iguaria.

Jabá ou jabaculê também é sinônimo de propina. O tradicional “jabá com abóbora”, oferecido por Rosalvo Alexandre aos jornalistas, em Aracaju, no final do ano, era uma sátira provocativa bem recebida.

Itabaiana, já foi um centro distribuidor do charque. A banca de Joãozinho de Norato era a mais sortida da feira. Joãozinho era casado com Dona Melinha, filha de Nicolau do Fumo.

Joãozinho de Norato morreu “de repente”, num domingo de 1959, no mesmo dia em que o Itabaiana foi campeão da Zona Centro. Guardei na memória esse dia.

Joãozinho e Melinha tiveram uma prole numerosa. Melinha, era irmã da minha avó, Maria do Céu.

Aqui entra o nosso personagem. Pedro da Jabá, que por 30 anos, monopolizou a distribuição da jabá em Sergipe.

Pedro Almeida Meira (Pedro da Jabá), nasceu em Itabaiana, no povoado Alto do Coqueiro (atual Moita Bonita), em 30 de janeiro de 1924, filho de Francisco Antonio Meira e Maria Francisca de Jesus.

Pedro, tirou a sorte grande, casou-se, em 1947, com Zuzu (Maria Amélia), filha de Joãozinho de Norato. Com pouco tempo, envolveu-se com o sogro no negócio da Jabá. Com o talento empreendedor nato, Pedro começou a crescer.

Pedro se meteu em política, apoiando Jason Correia, do PSD. Euclides Paes Mendonça, da UDN, virou chefe politico e botou Pedro para correr de Itabaiana.

Aracaju, foi um paraíso para os negócios de Pedro. Com a morte do sogro, herdou o negócio da jabá. Montou a Casa do Charque, na Avenida José do Prado Franco. Depois montou filiais na Rua Santa Rosa e na Avenida Coelho e Campos. Se tornou o Rei da Jabá.

Pedro da Jabá importava toda a produção do Sul do País. Passou a integrar uma plêiade de comerciantes itabaianenses, regionalmente bem sucedidos, a partir da década de 1950.

Lembrando alguns: Oviedo Teixeira, Mamede Paes Mendonça, Albino Silva da Fonseca, José Francisco da Cunha (Zé de Luiz de Rola), Pedro Paes Mendonça, Gentil Barbosa e Noel Barbosa. Faltou alguém?

Em meados do século XX, com a chegada da BR – 235, Itabaiana tornou-se um polo comercial. Um salto no desenvolvimento. A mudança foi impulsionada pelos caminhoneiros e talento mercantil dos ceboleiros. O itabaianense é bom de balcão, ou seja, sabe vender o “peixe”.

Sem bairrismo, o tino comercial do itabaianense, até hoje, é mola propulsora da economia sergipana. Pedro da Jabá foi pioneiro, deixou o exemplo.

Pedro da Jabá e Dona Zuzu deixaram muitos filhos: Reges Meira (médico oncologista), Regivalda, Rivanda, Renato, Ronaldo (Chita, meu colega das peladas de praia, no sítio Bonanza) e Ronmildo. Deixou uma centena de netos e bisnetos.

Pedro da Jabá cresceu por méritos, e compõe a galeria de ceboleiros que iniciaram a caminhada, que desembocou na grandeza econômica de Itabaiana.

Um nome que não pode ser esquecido. Pedro da Jabá, faleceu em 12 de março de 1997, aos 73 anos. Está sepultado no Cemitério de Santo Antonio e Almas.

Antonio Samarone – Secretário de Cultura de Itabaiana.
 

sábado, 29 de novembro de 2025

O BECO DO OUVIDOR


 O Beco do Ouvidor.
(Por Antonio Samarone)

Em meados do século XX, Itabaiana era geográfica e economicamente dividida.

1) A Praça da Igreja, ruas do Sol e das Flores, e adjacências, onde moravam os ricos e remediados.

2) O grande Beco Novo, onde viviam os pobres de todos os gêneros e um ou outro rico. Claro, a cidade não era só isso, existiam outras tribos: os pobres das ruas do Fato, Cacete Armado e Nova; e os remediados, das praças de Santa Cruz e da Feira e rua da Vitória.

O Beco Novo, era a antiga entrada da cidade, para quem vinha do Aracaju, por Riachuelo ou Laranjeiras, e era a trilha de fuga de Santo Antonio, quando fugia da Igreja Velha.

As famílias no Beco Novo eram numerosas.

Os meninos pululavam aos magotes, jogando bola de meia, brincando de cipó queimado e de roda (Eu sou pobre, pobre, pobre de marré deci). Vivíamos, de calção e pés descalços, a procura de peraltices. Alguns se destacavam pela valentia: os filhos de Euclides Barraca e os de Rosalvo do Cabo Quirino. Eu, era do time dos "morfinas'.

O Beco Novo era uma rua comunitária, as distinções casa/rua eram nulas. A molecada entrava casa adentro, de qualquer um, sem pedir licença. As portas eram escancaradas.

O primeiro trecho do Beco estreito, nascia na rua do sol e cruzava a rua da Pedreira (onde Conselheiro, passou uns dias, em 1874).

O segundo trecho, findava no Beco do Ouvidor, onde nasci, que depois foi rebatizado como Monsenhor Constantino. Nesse trecho, moravam famílias tradicionais do Beco Novo: Dona Bilô, Antonio de Anjinho, Armelindo, Antonio Angico, Cabo João Mole, Seu Agenor, sapateiro, Dona Branquinha e Dona Gemelice, a melhor rezadeira do pedaço. Lembro-me das festas de roda junina na casa de Seu Sancho, onde se cantava “quebra, quebra gobiraba..”

O terceiro trecho, findava na rua Padre Felismino. Moravam Palmeirinha, Dona Sula, a mãe dos Geobas, Nilo Alfaiate, Antonino de Liberato, Tonho de Gustavo (recém falecido), Dona Graça, que fazia peido velho, e Zé de Artemiro, pai do Vereador João Candido.

O quarto e último trecho, ia até a rua Miguel Teixeira. No meio do trecho, funcionava o Clube do Trabalhador, organizado pelos comunistas, antes de 1964. Nos carnavais, os alto-falantes alegravam a rua com os frevos de Capiba. Quase em frente, moravam Miguel Fagundes e Seu Bebé dos Passarinhos.

No restante, até o Tabuleiro dos Caboclos, ficavam os três campos de futebol. A ocupação era menor. Dos famosos, lembro-me Seu Pierrô e Divo.

O preconceito, dizia que Santo Antonio dera as costas para o Beco Novo, pois a rua terminava no fundo da matriz. Mamãe achava o contrário, que a posição do Santo era de proteção ao Beco, mesmo por quê, era Santo Antonio dos Pobres.

A única procissão que passava no Beco Novo, era a de São Cristóvão, organizada pelo motorista João de Balbino. Depois Santo Antonio assumiu a proteção dos motoristas, tornando-se na atual Festa dos Caminhoneiros.

No perpendicular Beco do Ouvidor, só existem casas voltadas para o sol. O outro lado, era o muro de Zeca Mesquita, de ponta a ponta. Aliás, permanece assim. Na esquina, eram os quartos de aluguel de Manesinho Clemente. Cinco ou seis, todos ocupados pelas Damas da noite.

Na sequência, uma vila perpendicular, com sanitário comum; a casa do funileiro Zé de Alaíde (Fóbica) e a minha, essa da foto, com 4 metros de largura. Eu passava horas numa preguiçosa, na casa vizinha, assistindo à arte de furar ralos.

Na sequência, moravam uma filha de Seu Justino (Finha), casada com Orlando do Bom Jardim. Depois, mais uma vila, essa recuada do alinhamento, onde Dona Jovem fazia a vida. Uma famosa prostituta, acusada de transmitir lepra para a clientela. Morreu no leprosário do Conjunto Jardim.

Quase no meio do trecho, Seu Marinho, o eletricista da companhia de luz, com uma filharada incontável. Seu Marinho, trabalhava de bicicleta, com a escada no ombro. Ele, e Belmiro. O outro eletricista, era seu Álvaro, já idoso. Eram os únicos eletricistas da cidade.

Depois chegaram outros eletricistas: Jua, irmão de Pulga de Cós, Teixeirinha, Zé, irmão de Amorosa e o irmão de Tereza do Hospital.

No final do Beco do Ouvidor, pela ordem: Pedrinho, dentista, Seu João Mena, o pai de André, um marceneiro especialista em tamboretes de três pés; Cosme, funileiro, Seu Russo, o pai de Nilson, craque do Itabaiana. No mais, a memória apagou. O Alzheimer ameaça a todos.

Seu Justino, sapateiro, foi quem primeiro teve radiola e liquidificar no Beco Novo. Passaram a fazer “vitamina de banana” em casa. Um luxo. Quase uma ostentação.

O Bar Brasília, servia lanche de vitamina e pão com quitute fiambre, em especial, para os bancários do Banco do Brasil.

A famosa vitamina, com banana, leite e Toddy batidos, em forma cremosa, é filha do liquidificador. Uma iguaria esquecida. Os mais sofisticados pediam vitamina de abacate. No filme o “Exorcista”, a vítima vomitava uma gosma, parecida com vitamina de abacate.

Possuir um liquidificador, era um sinal de prosperidade familiar. Como era possuir um rádio de pilha Sharp, encouraçado, potente, sinal claro. No Beco Novo, o primeiro rádio Sharp, foi de Dedé de Olga, causando inveja e admiração.

Nesse tempo, Itabaiana era culturalmente guiada pelo Concílio de Trento. A música estava sob a batuta do Maestro Antonio Silva, da Filarmônica Nossa Senhora da Conceição, que está completando 280 anos.

Antonio Samarone – Secretário Municipal de Cultura.

quarta-feira, 26 de novembro de 2025

OS TELEFONEMAS DE LAMPIÃO

Os Telefonemas de Lampião.
(por Antonio Samarone)

Que me perdoem os doutores do cangaço, mas quero tirar a limpo uma estória que ouço desde menino. O médico e escritor Ranulfo Prata, escreveu um manifesto pedindo a cabeça de Lampião, em 1933.

Ranulfo se apresentou como porta-voz da angústia dos seres humildes, dos párias e pés-rapados, na verdade, falava em nome dos senhores dos latifúndios.

Lampião chegou a Sergipe por volta de 1929, saindo de sua toca, no Raso da Catharina.

O Raso é um deserto encravado entre Jeremoabo e a Várzea da Ema, com uma “flora de espessa trama de dilacerantes espinhos e folhagem urticante.

No livro/manifesto “Lampião”, Ranulfo transcreveu um diálogo insólito:

“Fazia meses que Lampião vivia em guerra aberta com a Bahia, mas em paz com Sergipe. Do Saco do Ribeiro, telefonou ao delegado de polícia e chefe da cidade de Itabaiana, Othoniel Dórea, chamando-o de colega.

- Colega, por quê? Indaga, intrigada, a autoridade.

Explica o Capitão:

- Pruque você é cego de um oio, cumo eu.

Dorinha morreu com a fama de valente, por peitar Lampião. O certo, é que Lampião seguiu o seu caminho.

Aqui, temos um impasse: Lampião telefonou de onde?

O telefone só chegou à Itabaiana em 1955, depois da chegada da luz elétrica de Paulo Afonso. Imagine no povoado Saco do Ribeiro.

“O telefone desembarcou em Itabaiana, funcionando numa central, no sobrado onde Aprígio Ferreira Passos morava, na esquina da Fausto Cardoso, com a atual Ivo de Carvalho.” – pag. 242, do livro Euclides Paes Mendonça, do mestre Vladimir Carvalho.

Essa versão do telefonema entre Lampião e Dorinha circula até hoje, como verdadeira, mesmo sem existir linhas telefônicas à época, nem na cidade de Itabaiana, nem no povoado Saco do Ribeiro. O que vale é a lenda!

Na bem documentada visita à Capela, onde Lampião foi ao cinema, a comunicação com as autoridades do Aracaju, foi feita pela via do telégrafo. O telegrafista era o famoso jornalista Zózimo Lima.

Vou pedir socorro ao pesquisador Robério Santos.

Antonio Samarone. Secretário Municipal de Cultura.
 

quinta-feira, 20 de novembro de 2025

QUINTINO DE LACERDA E A CONSCIÊNCIA NEGRA.


 Quintino de Lacerda e a Consciência Negra
(Por Antonio Samarone)

Comemora-se hoje, 20 de novembro, o dia da Consciência Negra, em homenagem a Zumbi dos Palmares, morto em 1695. A data foi instituída em 2011, pela Lei Federal 12.519 e, em 2023, tornou-se feriado nacional.

O Brasil é surpreendente. O dia da Consciência Negra Municipal, em Itabaiana, é 08 de junho, dia do nascimento de Quintino de Lacerda (08/06/1829), instituído pela Lei Municipal 965, de 2001, ou seja, 10 anos antes, da consciência nacional.

A mesma lei, elevou Quintino de Lacerda a herói abolicionista municipal, em Itabaiana.

Em Itabaiana, Quintino era escravizado por Antonio dos Santos Leite, no povoado Flechas. Ele foi vendido em 1874, aos 35 anos, para Antonio Lacerda Santos, em São Paulo. Foi escravo de ganho de Lacerda, de quem se tornou amigo e herdou o sobrenome. Alforriado em 1882.

Quintino liderou a fundação do Quilombo de Jabaquara, em Santos–SP, lutou pela abolição, ganhou fama e se tornou o primeiro Vereador negro do Brasil, em 1895.

O itabaianense, Quintino de Lacerda, faleceu em 10 de agosto de 1898, em Santos, aos 69 anos. O seu féretro foi conduzido por uma multidão.

Doutor Petronio Domingues, professor de história da UFS, em seu polêmico texto “João Mulungu: a invenção de um herói afro-brasileiro”, publicado em 2015, numa revista de Curitiba, também nega o heroísmo abolicionista do itabaianense Quintino de Lacerda, acusando-o de ter furado uma greve, em 1891, no Porto de Santos, e de ter oferecido serviços ao Governo de Floriano Peixoto, na Revolta da Armada, em 1893, tornando-se “Major Honorário do Exército".

O Dr. Petronio ressalva que, mesmo assim, Quintino se tronou um cidadão respeitado pela patuleia, granjeando prestígio político, tornando-se uma liderança popular e negociadora.

Desconsiderando os saberes acadêmicos, Itabaiana continuará homenageando o seu líder abolicionista. Em 14 de novembro de 2025, a semana passada, a Câmara Municipal aprovou a criação da Medalha Quintino de Lacerda.

A Comenda será concedida, anualmente, as personalidades negras, naturais ou residentes em Itabaiana, que tenham prestado relevantes serviços a sociedade.

Sobre o polêmico João Mulungu, outro herói negro sergipano, também itabaianense, nascido em 1840, no Engenho Piedade:

Entre a ciência do mundo acadêmico, os achismos do Conselho Estadual de Cultura ou a militância da Casa de Cultura Afro-Sergipana, coordenada pelo doutor honoris causa pela UFS, Severo d’Acelino, fui convencido que Severo está certo.

A Câmara de Vereadores de Itabaiana vai entronizar uma estátua de Quintino, em sua sede. Merecida!

Minhas simples homenagens aos dois itabaianenses, heróis negros: Quintino de Lacerda e João Mulungu e ao contemporâneo líder negro sergipano, Severo d’Acelino.

Antonio Samarone – Secretário Municipal de Cultura.

domingo, 16 de novembro de 2025

A MARCA DO SAGRADO

A marca do Sagrado...
(por Antonio Samarone).

“O Universo é assimétrico e estou persuadido de que a vida, como nós a conhecemos, é resultado direto dessa assimetria do Universo ou de suas consequências indiretas.” Louis Pasteur

Somos mesmo, a medida de todas as coisas?

A ciência descobriu que toda a diversidade da natureza está interligada e possui uma origem comum. As religiões, procuram religar essa variedade, com uma explicação divina. A ciência busca um código secreto da natureza.

Aristóteles propôs que esse código fosse uma quinta substância, a quintessência, eterna e incorruptível, distinta dos quatro elementos (terra, água, ar e fogo) que compunham as substâncias encontradas na Terra.

A ciência é uma narrativa humana.

O medo das trevas é o medo do escuro (do frio, do silêncio e do buraco negro). Na infância, brinquei de quem ia mais longe, em direção ao escuro. Eu sei, Deus já tinha criado a luz (fiat lux), mas só estava garantida durante o dia. As noites precisavam de luzes artificiais. Os meninos de hoje perderam esse medo.

A fuga da vida rural era em boa parte uma fuga dessa escuridão do campo. Bem ou mal, as cidades eram iluminadas, no início com lampiões, hoje com led.

Claro, existe uma ordem oculta mediando a natureza. A busca permanente dessa verdade, alivia o sofrimento, trata-se de uma “pró-cura”. As evidências cartesianas são ilusões. Somos capazes de acreditar em algo, mesmo sem qualquer evidência.

Precisamos de um consolo para a finitude: acreditar na vida pós-morte é um elixir poderoso. Essa crença atenua a ansiedade, gerando um conforto temporário, até o descanso eterno.

Por segurança, muita coisa precisa ser ressacralizada.

Antonio Samarone.