A Cultura na quinta Bienal de
Itabaiana. (por Antônio Samarone)
A Bienal de Itabaiana é um grande
sucesso de público. Legiões de jovens superlotam os corredores. Todos curiosos,
ávidos pelo consumo cultural. Gente de todos os cantos e recantos. Parece uma
romaria do Padre Cícero. O que explica esse novo poder de atração da cultura
popular, do objeto cultural?
Claro, não estou falando da
cultura como um sistema completo e coerente de explicação do mundo. Não! Falo
da cultura mercantilizada.
A globalização da cultura convive com as culturas locais fragmentadas, sem muitos conflitos. Muitas vezes nem se cumprimentam. Para o mercado, a única medida é o consumo.
A globalização da cultura convive com as culturas locais fragmentadas, sem muitos conflitos. Muitas vezes nem se cumprimentam. Para o mercado, a única medida é o consumo.
A que se deve o sucesso da Bienal
de Itabaiana, a Meca da cultura sergipana?
Primeiro a ausência do Poder
Público. A Bienal de Itabaiana não usa recurso público. Quando o Poder Público patrocina
a coisa não anda, a politicagem toma conta. Só leva gente se contratar shows com
artistas famosos, com cachês suspeitos. A parte da cultura local é esvaziada,
mesmo trazendo palestrantes e atrações de fora.
Uma nota: a completa ausência dos
doutores das universidades na Bienal de Itabaiana. Nem a sombra dos
departamentos de letras... O saber acadêmico tem outras preocupações! Um
detalhe: ninguém sente falta.
Acredito que o sucesso da Bienal de
Itabaiana se deve, principalmente, ao indiscutível espírito comercial dos Itabaianenses.
Uma gente que sabe comprar e vender. Uma gente que vende de ouro a castanha. Vender
cultura fica fácil. Em outras palavras, o tino comercial de Honorino Júnior, Carlos
Elói e Jamyson Machado é o carro chefe da Bienal. Não é atoa que transferiram a
Bienal para um Shopping Center.
A alma da bienal de Itabaiana é o
espírito comercial da cidade. Não é fácil vender livros de autores locais,
pouco conhecidos. Um Best Sellers nas livrarias de Aracaju vende cem exemplares.
Na Bienal de Itabaiana os autores locais mais famosos chegam a vender seiscentos
livros. A feira tem mais de duzentos escritores e quinhentos títulos.
Escritores, poetas, trovadores,
cordelistas de toda a redondeza. Do alto Sertão ao baixo São Francisco. Do Raso
da Catarina, Serra Negra e Uauá. Escritores das escolas municipais dos povoados
e das academias de letras. Tudo gente daqui, sem fama, sem a divulgação de
grandes editoras. Quase tudo local. Todos vendendo.
Um amigo, um intelectual cabuloso,
me perguntou em tom de ironia: e a qualidade desses escritos? Eu cheguei à
impaciência, que qualidade, o mercado está se lixando para esse preciosismo. Os
critérios mudaram: o capitalismo absorveu a cultura, destruiu as fronteiras
simbólicas entre a alta e a baixa cultura, a arte e o comercial, o espírito e o
divertimento.
Uma escritora do povoado Cajazeira me ofereceu dois livros de poesias. Não comprei por somiticaria.
O sucesso da Bienal se deve também
a disseminação das academias de letras pelo interior. Existem academias em todos
os cantos. Isso incentivou a que todos escrevessem alguma coisa, perdeu-se a timidez.
O sujeito se tornou imortal, entrou numa academia, por que não escrever alguma
coisa? O relativismo cultural desinibiu os letrados. Os consumidores tornaram-se
produtores de conteúdo.
Uma professora da rede municipal
de Itabaiana me mostrou vaidosa o seu primeiro livro, ilustrado por um aluno.
Um livro bonito. Parabéns, professora...
Com essa crise econômica, só
quatro estabelecimentos prosperam em Sergipe: bodegas, vendendo bebidas alcoólicas;
farmácias, vendendo medicamentos; igreja de crente, distribuindo fé; e academias
de letras distribuindo cultura. A produção cultural é farta. A dificuldade é
arrumar quem compre tantos livros, tirar o produto no mercado. A Bienal de
Itabaiana resolveu essa pendência.
E por que outros municípios em
Sergipe não realizam essas feiras culturais com sucesso, nem Aracaju? Perceberam,
não é por falta de livros, nunca se escreveu tanto. O que falta é o espírito comercial.
Vender! Com jeito e sabedoria vende-se de tudo.
Portanto, a minha conclusão,
provisória, é que o sucesso da Bienal de Itabaiana deve-se sobretudo ao espírito
comercial aguçado do seu povo.
Antônio Samarone.
Nenhum comentário:
Postar um comentário