sábado, 24 de agosto de 2013

A Violência do Trânsito em Sergipe



Antonio Samarone



Analisando o Mapa de Violência, publicado o ano passado, constatei que em 2010, o Brasil ocupava o 6º lugar em violência no trânsito no Mundo, com uma taxa de óbitos de 21,5 óbitos/cem mil habitantes, em números absolutos, significou 40.981 óbitos. O País campeão em acidentes foi o Catar, com a taxa de 30,1 óbitos/cem mil habitantes.

No mesmo período, os dados de Sergipe sobre a violência no trânsito são assustadores: o Estado aparece com uma taxa de óbitos de 30,5 óbitos/cem mil habitantes, bem superior à média nacional e acima do Catar. Analisando Sergipe no ranking dos países, seríamos o campeão mundial em acidentes de trânsito. Em 2010, faleceram 631 pessoas em Sergipe, por acidente de trânsito, com dois óbitos por dia; uma epidemia inaceitável. Entre 2000 e 2010, numa década sangrenta, faleceram 4.839 pessoas em Sergipe, por acidente de trânsito. Para cada óbito, estima-se que pelo menos quatro pessoas fiquem com sequelas definitivas.

Sergipe passou de uma taxa de acidentes de 19,9 óbitos/cem mil hab. em 2000, para 30,5 óbitos/cem mil hab. em 2010. Numa década, atingimos patamares de violência no trânsito bem superiores a São Paulo (16,8 óbitos/cem mil hab.) e ao Rio de Janeiro (14,4 óbitos/cem mil hab.). Em 2010, Sergipe já ocupava o 5º lugar nacional em óbitos por motocicletas: foram 296 óbitos registrados pelo Ministério da Saúde. No computo geral, Sergipe é o 9º colocado nacional em óbitos por acidentes.

Como chegamos a esta tragédia silenciosa em Sergipe? Claro, o crescimento geométrico da frota de motocicletas, substituindo a inexistência e/ou precariedade do transporte público, contribuiu de forma decisiva para o crescimento das taxas de acidentes, mas não foi só isso. Essa frota também cresceu em outros estados do Nordeste, sem a mesma explosão de óbitos que tivemos em Sergipe.

O uso da motocicleta como transporte de massas, em substituição ao transporte coletivo, é amplamente incentivado pelo Governo brasileiro através da concessão de subsídios e isenções de tributos. As montadoras estão quase todas localizadas na Zona Franca de Manaus. Recentemente, o Governo de Sergipe dispensou o ICMS e taxas do DETRAN de todas as motocicletas até 125 cilindradas, isso abrange mais de 95% da frota. Ressalte-se que os ciclomotores, veículos até 50 CC, já são isentos.

A questão está à espera de estudos e avaliações para que se compreendam as causas e se apontem as medidas necessárias para a superação deste genocídio, que mata e mutila basicamente os jovens. Resolvemos a mortalidade infantil nos últimos 20 anos, com a melhoria do saneamento básico, higiene, alimentação e assistência médica; e passamos a carnificina para os adultos jovens, desperdiçando o nosso boom demográfico, tão favorável ao crescimento econômico.

Levanto também como suspeita para a epidemia de acidentes em Sergipe, o fato de o Estado não possuir uma política de mobilidade, de ter tratado o órgão estadual de trânsito, ao longo do tempo, como moeda de troca política. O abandono do transporte público tornou a opção pela moto quase obrigatória. A ausência de ações de controle da velocidade nas rodovias estaduais... As ações para o cumprimento da lei seca são iniciativas quase pessoais, de bons profissionais da Polícia Militar; o Governo apenas tolera.

A "Década de Ação pelo Trânsito Seguro" (2011-2020), adotada pela ONU, na qual governos de todo o mundo se comprometem a tomar medidas para prevenir os acidentes no trânsito, passou longe de Sergipe, não se fala nisso por aqui. Os acidentes de trânsito são a nona causa de mortes no mundo e ferem de 20 a 50 milhões de pessoas a cada ano. 

Não vejo sinais de mudanças em Sergipe nos próximos anos. 

domingo, 11 de agosto de 2013

Transporte Coletivo em Aracaju, qual o destino?

Antonio Samarone



Apontar o transporte coletivo como alternativa para a crescente redução da fluidez em Aracaju, identificado pelos proprietários de automóveis como o principal problema da mobilidade, tem se transformado num aparente consenso. Na última campanha para Prefeito todos diziam a mesma coisa sobre o tema, à diferença entre os principais candidatos era se o modelo deveria ser BRT ou VLT.

Se todos são a favor, por que as coisas não andam? Vamos pensar um pouco: o item mais reclamado na qualidade do transporte público é sua lentidão e impontualidade, em resumo, os ônibus não passam, não chegam no horário, à oferta do serviço é insuficiente e irregular. Uma dura realidade em Aracaju, os ônibus se deslocam em uma velocidade média de 14 Km/h, uma viagem que deveria durar 20 minutos leva uma hora. Claro, não estou subestimando os outros problemas, é só para facilitar o raciocínio.

A decisão política de priorizar o transporte coletivo precisa enfrentar o conflito do uso dos espaços públicos. Os ônibus não podem disputar as vias com os veículos particulares, o que fazer? Os custos do Metrô tradicional e a realidade de Aracaju afastam esta alternativa; o BRT do Prefeito, o chamado metrô de superfície é uma boa saída, entretanto, bate de frente com a falta de recursos, nesta modalidade as vias são exclusivas, estações de embarque e desembarque, são necessários investimentos expressivos, que não existe, Aracaju ficou de fora do PAC mobilidade. Resta o BST, o Sistema Rápido de Transporte que requer apenas faixas exclusivas para os ônibus. Se a velocidade média, por exemplo, passar dos atuais 14 km/h para 28 Km/h, terá o dobro de viagens da realidade atual, com a mesma frota. O sistema pode regularizar os horários de saída e chegada, e equacionar um grande problema.

Encontrar espaços para a construção das faixas exclusivas para os ônibus passa a ser o problema. O que fazer de imediato? Segregar faixas, das existentes, para os ônibus e reduzir as faixas disponíveis para os veículos particulares como consequência? Por exemplo, como operar essa mudança nos corredores da Avenida Barão de Maruim/Desembargador Maynard e no da Avenida Beira Mar? Qual seria a reação dos proprietários de veículos? Outra opção, utilizar as faixas usadas para estacionamentos e liberá-las para os ônibus, onde for o caso. 

A sociedade está disposta a ficar sem estacionamentos nas vias públicas? Experiências recentes não foram bem sucedidas. Restam: 

1 - a cobertura dos canais, como está ocorrendo nas Avenidas Canal 4 e Canal 5, no Augusto Franco, onde surgirão espaços novos nas vias, podendo adequá-los ao uso do transporte coletivo, a questão passa a ser de investimentos; 2 - a supressão dos canteiros centrais, mesmo criando novos espaços, enfrentará a resistência dos ambientalistas; 3 - a construção de novos corredores, solução em longo prazo e dependente de altos investimentos e de desapropriações, judicialmente complicadas nos espaços urbanos. Enfim, entre o discurso de priorização do transporte público e a sua execução, existe uma distância significativa.

Outra pendência decisiva em Aracaju é a licitação do transporte coletivo, como executá-la sem embaraços judiciais. As duas últimas administrações de Aracaju tentaram sem sucesso. O Prefeito João Alves Filho anunciou a formação de um consórcio intermunicipal, e realizar o processo de licitação por este caminho. As experiências nacionais em operar este tipo de consórcio são reduzidas. A lei 11.107/2005 e o decreto 6.017/2007 definem as condições de funcionamento desses consórcios. É necessário um protocolo de intenções, aprovados pelos parlamentos municipais; um contrato entre os municípios, um estatuto e a criação de uma nova instituição, com orçamento e pessoal próprios, uma nova Estatal, que será gerida de forma colegiada. Esta nova empresa é que irá realizar o certame licitatório.

Convenhamos, é um longo e tortuoso caminho que deverá ser percorrido na escuridão, pois ninguém dispõe de experiência neste modelo de gestão. Talvez por isso, a lei 12.587/2012 - que aprovou a Política Nacional de Mobilidade -, tenha previsto um caminho mais simples, cada município realiza sua licitação, e com autorização do Estado, estabelecem um convênio para a gestão do sistema de transporte, comum aos municípios. Observação, o consórcio requer também o consentimento do Estado. Em todo caso, desejo boa sorte a administração municipal nessa empreitada licitatória.

Claro, o debate sobre a mobilidade que queremos em Aracaju está apenas começando. Nossa qualidade de vida depende da solução de várias outras questões na mobilidade, entretanto, o transporte coletivo é um tópico estruturante, por isso sua importância. O adiamento desta solução reforçará a atual tendência, imposta pelo mercado. Em Aracaju, assistimos a consolidação do “modelo asiático”, com o predomínio do transporte clandestino e do uso das motocicletas e ciclomotores como transporte de massas, com a as conhecidas consequências para a sociedade, para a saúde pública e para a família das vítimas.