segunda-feira, 29 de junho de 2015

NOSSA SENHORA DA VITÓRIA


Nossa Senhora da Vitória.

(imagem de roca, Século XIX, procedente da Igreja Nossa Senhora do Amparo, Sergipe. Museu de Arte Sacra de Sergipe).
Com a ocupação de Sergipe por tropas da União Ibérica, em 1590, Cristóvão de Barros fundou uma Arraial na foz do Rio Sergipe, que denominou de Cidade de São Cristóvão, em homenagem a Cristóvão de Moura e Távora (Lisboa, 1538 - Madrid, 1613), fidalgo português, líder do partido espanhol quando da crise de sucessão de 1580. Homem de confiança de Felipe II, Cristóvão foi um homem poderoso, Vice-Rei de Portugal, durante uma parte da União Ibérica.
A cidade de São Cristóvão sofreu sucessivas mudanças, até firmar-se no local em que hoje se encontra, à margem do rio Paramopama, afluente do rio Vaza-Barris. Portanto, contrário ao difundido, o nome de São Cristóvão não é uma homenagem a Cristóvão de Barros.
A influência espanhola na colonização de Sergipe é manifestada também pela escolha da padroeira de São Cristóvão, Nossa Senhora da Vitória. Quem é a Santa? Foi a Nossa Senhora a quem é atribuída o papel decisivo na vitória da batalha naval de Lepanto, em 1571, uma esquadra liderada pelo Reino da Espanha, sob o comando de João da Áustria, venceu o Império Otomano, no largo de Lepanto, na Grécia, pondo fim a expansão islâmica no Mediterrâneo.
Antonio Samarone. Aguardo as controvérsias...

A SAÚDE PÚBLICA EM SERGIPE (INÍCIO DA REPÚBLICA - PARTE DOIS)



A Saúde Pública em Sergipe (Início da República – parte dois)

Antonio Samarone de Santana
Academia Sergipana de Medicina

A situação sanitária do Estado de Sergipe começou a receber duras críticas através da imprensa. Em 18 de agosto de 1895, o jornal “Gazeta de Sergipe”, atacou duramente o poder público, em seu descaso com a salubridade. Cobrava-se dos representantes do povo compromissos com a saúde pública, visto que “os cargos públicos não são simplesmente meio de vida; não se aceita somente pelos proventos materiais que deles possam vir”. Solicitava-se que as autoridades dessem uma volta pela cidade para perceberem a realidade: febres dizimando a população, falta de asseio nas ruas, casos de varíola. As condições de saúde da população eram deploráveis e o Hospital de Caridade estava repleto.
A Inspetoria de Higiene alegava que nada podia fazer, a saúde pública dependia de variáveis independentes de sua autoridade. A cidade sem calçamento, sem água potável, impregnada de miasmas que exalavam dos materiais encontrados nas areias dos aterros, tudo isso estava fora do seu campo de ação. Era esse o entendimento. A partir de 24/11/1896, quando o Dr. Daniel Campos é renomeado] Inspetor de Higiene, em substituição ao Dr. Francisco Barbosa Cardoso, começaram a ocorrer pequenas modificações.
O Dr. Daniel Campos era um médico de muita influência na sociedade, Deputado Estadual por várias legislaturas, Presidente da Assembleia, Presidente interino do Estado; o cargo de Inspetor de Higiene ganhava certa importância com a sua nomeação. O Dr. Daniel Campos permanecerá no Cargo até o início do Governo Josino Meneses, quando em 13 de março de 1903, aposentou-se do serviço público.
Daniel Caetano da Silva Campos Jr, nasceu em 25 de maio de 1855 no engenho Feiticeira, município de Capela/SE, filho de Daniel Caetano da Silva Campos e Antonia Pinto da Silva Campos. Formou-se pela Faculdade de Medicina da Bahia em 17 de fevereiro de 1882 defendendo a tese “Fisionomia clínica das moléstias inflamatórias agudas complicadas de malária”. Estabeleceu-se como clínico em Aracaju, professor do Atheneu Sergipense,
Daniel Campos foi Inspetor de Higiene no primeiro governo de Oliveira Valadão (1896) e no governo Olímpio Campos (1899 a 1902), deputado estadual constituinte por várias legislaturas, presidente da Assembleia e nessa condição chegou a ocupar o cargo de governador, entre abril a julho de 1898. Foi fundador da primeira associação médica do Estado, a Sociedade de Medicina de Sergipe, em 1910. A entidade, entretanto, teve duração efêmera, sendo extinta um ano depois. Faleceu em 8 de fevereiro de 1922, em Aracaju/SE, com 67 anos.
Com Daniel Campos na Inspetoria de Higiene, o Diário Oficial começou a publicar o expediente da repartição de higiene; com avisos sobre a obrigatoriedade da vacinação para menores de 6 meses de idade (a multa era de 10$000), relação das farmácias fiscalizadas, as ações de polícia sanitária (apreensão de alimentos estragados, etc.), fiscalização de habitações (o “habite-se” era dado pela repartição de higiene). O Inspetor tentava cumprir o regulamento sanitário de 1892, inclusive, exigindo os relatórios dos hospitais de caridade (Aracaju, Laranjeiras, Estância, Rosário e Maruim).
Contudo, os esforços do Dr. Daniel Campos não foram suficientes para mudar a estrutura do poder público no campo sanitário. Reforçando esta afirmativa, vejam a opinião do próprio Presidente do Estado, Manoel P. Oliveira Valadão, em mensagem â Assembleia Legislativa: “Não devo ocultar-vos que a nossa Inspetoria de Higiene carece de ser melhorada ou, direi melhor organizada. É uma repartição desprovida de tudo, inclusive de pessoal, porque a lei que lhe deu existência apenas criou o Inspetor, comose esse por si só pudesse fazer todo o serviço e constituir o que em linguagem administrativa se chama repartição.
A estrutura da Inspetoria de Higiene expandiu-se para o interior. Em 1898, possuíam Delegado de Higiene nomeados os seguintes municípios: Japaratuba, Dr. Gonçalo de Faro Rollemberg; Laranjeiras, Dr. Antônio Militão de Bragança; Maruim, Dr. Sebastião de Andrade; Estância, Dr. Sebastião Lisboa; São Cristóvão, Dr. Antonio Miguel do Prado; Rosário, Cirurgião Benito Derisans Nabuco; Capela, Dr. Francisco Muniz; Itaporanga, Dr. Aurélio de Resende; Divina Pastora, Dr. Alexandre de Oliveira Freire; Propriá, Farmacêutico Epímaco de Azevedo Melo; Lagarto, Dr. Felino Martins Fontes; Simão Dias, Dr. Joviniano Joaquim de Carvalho; Itabaiana, Dr. Manoel Baptista Itajay; Riachuelo, Farmacêutico Cantidiano José de Oliveira, e Vila Nova, Dr. Felício de Castro. Nos municípios não citados, o cargo de Delegado de Higiene encontrava-se vago.
Em 23 de dezembro de 1899, através da lei nº 58, foi criado o Serviço de Higiene do Município de Aracaju. Entre outras competências, esse Serviço era responsável pelo asseio da viação pública e pela coleta do lixo. O Regulamento do Serviço Municipal de Higiene só foi aprovado em 14 de julho de 1913.
Com a aposentadoria, em 14 de março de 1903, do Dr. Daniel Campos, assumiu o cargo de Inspetor de Higiene o Dr. Theodureto Nascimento, no Governo de Josino Menezes. A saúde pública recebeu um novo alento, explicado pelo surgimento de uma incipiente opinião pública, pela permanência do quadro sanitário (exacerbado pela epidemia de peste bubônica), pela competência do novo Inspetor e pela formação profissional do Presidente do Estado (governador), que era um farmacêutico atuante.
Theodureto Archanjo do Nascimento, nasceu em 16 de setembro de 1866, em Lagarto/SE, filho de Miguel Archanjo do Nascimento e Josepha Maria do Nascimento. Recebeu grau de doutor em medicina pela Faculdade da Bahia em 18 de dezembro de 1886, defendendo a tese “Alcoolismo embriaguez”. Participou do movimento republicano em Sergipe. Em 1891, foi à Europa estudar o tratamento da tuberculose com o uso da linfa.
Durante a administração de Josino Menezes (1902 a 1905), o Dr. Theodureto apresentou um projeto de reforma sanitária avançado, embora ele próprio achasse inexequível, devido à situação do erário. Entre as mudanças mais importantes, ele defendeu a reforma do regulamento da Inspetoria de Higiene, a aprovação de um código sanitário, o nivelamento e drenagem do solo da capital, canalização de água para Aracaju, uma rede de esgoto, criação do desinfectório modelo, um hospital para doenças contagiosas, fornos de incineração e o tão sonhado instituto soroterápico vacinogênico. Continuaremos depois sobre o Governo Josino Menezes.

Foto: Hospital de Nossa Senhora do Rosário, Sergipe.


sábado, 27 de junho de 2015

A SAÚDE PÚBLICA EM SERGIPE (INÍCIO DA REPÚBLICA)

A Saúde Pública em Sergipe (Inicio da República).

Antonio Samarone de Santana
Academia Sergipana de Medicina

No alvorecer do regime republicano em Sergipe, ainda no Governo provisório do médico e historiador Felisbello Firmo de Oliveira Freire, as medidas sanitárias previstas no Decreto Federal nº 68, de 18 de dezembro de 1889, tornaram-se aplicáveis no Estado, por determinação do poder local. Eram medidas de combate as epidemias; notificação compulsória de algumas doenças (febre amarela, cholera morbus, peste, difteria, varíola, escarlatina e sarampo); obrigatoriedade do isolamento e da desinfecção, conforme a exigência do caso. Chamava a atenção o fato da tuberculose não se encontrar entre as doenças de notificação compulsória. Logo a seguir, em 07 de março de 1890, foi aprovado um novo código de postura do Município de Aracaju, seguindo a legislação federal.
Como forma de regulamentar a Constituição Estadual (aprovada em 18 de maio de 1892), houve também um processo de estruturação jurídica do novo aparelho público, agora independente do Poder Federal. Na área da saúde, durante o governo José Calazans, foi criado o cargo de “Inspetor de Higiene” (lei nº 15, de 29/07/1892), a quem caberia também a responsabilidade de ser o médico da enfermaria de polícia e da casa de prisão. Cargo equivalente aos atuais Secretários de Saúde.
Logo a seguir, em 30/11/1892, através do decreto nº 38, foi aprovado o primeiro “Regulamento Sanitário do Estado”, que organizou o serviço sanitário do Estado de Sergipe, criando a Inspetoria de Higiene (formada pelo Inspetor de Higiene e pelos Delegados de Higiene, um para cada município), e dando outras providências.
O regulamento acima desligou o serviço sanitário de Sergipe da administração federal, em consequência da nova visão federativa imposta pela Constituição Republicana de 1891. Era um Regulamento com 71 artigos, que entre outros pontos, tratava da vigilância sanitária, da fiscalização da medicina, farmácia, obstetrícia e arte dentária; da fiscalização das fábricas, no que elas pudessem atingir às populações vizinhas. No setor da vigilância epidemiológica, definiu a febre amarela, cólera, peste, sarampo, escarlatina, varíola e difteria como doenças de notificação compulsória. A tuberculose continuava de fora. O Inspetor de Higiene para o Estado e os Delegados de Higiene para os municípios, eram as autoridades máximas da Saúde Pública, de livre nomeação do Presidente do Estado.
O primeiro Inspetor de Higiene nomeado no período Republicano, ainda em 1892, foi o Dr. Felino Martins Fontes Carvalho, que nasceu em 29 de maio de 1859, em Riachão dos Dantas/SE, filho de Theofilo Martins Fontes e Anna Joaquina de Almeida Fontes. Formou-se pela Faculdade de Medicina da Bahia em 23 de dezembro de 1885, defendendo a tese “Considerações acerca do abortamento”, formando-se ainda em farmácia em 1904. Clinicou em Lagarto, onde fez carreira política, chegando a ocupar o cargo de Intendente (Prefeito) por dois mandatos e deputado estadual por duas legislaturas. Faleceu em 13 de junho de 1918, em Lagarto/SE, com 59 anos.
A Inspetoria de Higiene em Sergipe, como vimos acima, foi criada logo no início do período Republicano (1892). Contudo, durante muito tempo, o seu funcionamento não correspondia às necessidades sanitárias do Estado. A estrutura básica da citada repartição era composta, em seu início, exclusivamente do Inspetor, que ainda acumulava as atribuições de médico da casa de prisão e da enfermaria militar.
Somente em 1895, com lei nº 71, a estrutura da Inspetoria se ampliou com a criação do cargo de “encarregado do lazareto e desinfectador”, para onde foi nomeado o enfermeiro Canuto Severino de Araújo, grande baluarte no combate à varíola no Estado. Em 1896, através do decreto 214, a estrutura da Inspetoria ganhou um amanuense. O primeiro cidadão nomeado para ocupar esse cargo foi o senhor Alfredo Alves de Oliveira. O relatório do Inspetor de Higiene, Dr. Felino Martins Fontes de Carvalho, em 18 de agosto de 1898, assim resumiu a situação da Inspetoria:

“Em tão breve lapso de tempo não me era absolutamente possível fazer um estudo sério e detido deste tão importante e vasto, quanto variado ramo do serviço público, como é a higiene. Entretanto, fiquei logo convencido de que não era ele somente imperfeito e mal organizado entre nós; pode-se afirmar que tal instituição está em período embrionário e quase que não existe ainda em Sergipe, tão pouco é que o temos na espécie. ”
Foto: Felisbello Freire.

quinta-feira, 11 de junho de 2015

E AS NOVIDADES?

E as novidades?
Antonio Samarone
Academia Itabaianense de Letras.

Quando os amigos se encontram e estão sem assunto, uma saída é perguntar de forma desinteressada: - E as novidades? E ouvir como resposta: - “as mesmas”. Mesmo com o mundo recheado de novidades. Correu a notícia que a Finlândia, modelo na Educação, vai acabar com à escrita manual nas escolas e os alunos usarão o computador, portátil ou tablet para a produção de textos. Será o fim das aulas de caligrafia, penoso exercício de desenhar as letras. Pensei, minha formação em datilografia, na escola de Dona Tota, no Beco Novo, tinha o seu valor.
Toda mãe zelosa, mesmo sem poder, reservava um dinheirinho para matricular os filhos numa Escola de Reminghton. Em Itabaiana, a escola mais organizada era a de Dona Tota. Antonia Lima de Andrade, Dona Tota, uma negra elegante, sempre pronta, disciplinadora, educada, voz baixa e suave; mas todos morríamos de medo de deixar os exercícios pela metade. Saber datilografia era uma porta aberta para um bom emprego.
O concurso para o Banco do Brasil, emprego muito desejado, cobrava conhecimentos de português, contabilidade e datilografia. Isso mesmo, só passava quem conseguisse copiar um texto, sem erros, em 15 minutos. Ou a pessoa olhava para o texto ou para o teclado, o tempo era curto; claro, a única saída era bater olhando só para o texto. Teclados duros, altos, zoadentos, mãos trêmulas, bater uma centena de toques por minuto, era a parte mais difícil do concurso. Hoje os meninos já nascem sabendo, pegam esses teclados de telefone, em escala manométrica, batem sem olhar, na velocidade da luz.

Mas o fim da escrita cursiva, a chamada escrita à mão, passando os textos a serem digitados, ainda não é o ponto de chegada. Os novos telefones já dispõem de um dispositivo nos teclados, que transformam a fala em texto, sem muito esforço, e sem exigir que a pessoa conheça a língua. E mais, se a pessoa quiser, que a sua fala seja escrita em outro idioma; do qual o abençoado nunca ouviu falar nem conhece nenhuma palavra, o teclado também escreve. Não dá mais para responder automaticamente que não existem novidades. Concordam?

terça-feira, 9 de junho de 2015

VAGAS LEMBRANÇAS


Vagas lembranças.
Antonio Samarone
Academia Itabaianense de Letras

Nasci numa Itabaiana (1954) dominada pelo ultramontanismo, fazendo justiça a sua condição geográfica. Os triunfos do iluminismo e da secularização ainda não tinham chegado. A vida cultural era dominada pela Santa Madre Igreja. Festas, comemorações, costumes, crenças, comportamentos, nada escapava ao comando e vigilância da Igreja Romana. As mulheres eram Filhas de Maria e os homens Irmãos das Almas. Psicologicamente, estávamos sob a proteção do anjo da guarda.
As festas coletivas coincidiam com as datas religiosas. Natal, padroeiro, procissões, sábado de aleluia, Santas Missões, São João, todos os santos, vias sacras, novenas, trezenas, missas; e as festas privadas, batizados, casamentos, crismas; até o cinema era do padre. As bandas de músicas, presépios, quermesses, cânticos e manifestações folclóricas eram redirecionadas pela igreja. Nem as raras festas pagãs escapavam da vigilância religiosa.
Em decorrência da elevada mortalidade infantil e com medo do Limbo, me batizaram logo novinho. Por promessa de mamãe, fiz a primeira comunhão no dia em que completei sete anos, numa segunda-feira. Frequentei o catecismo, antes da escola, e guardava os domingos e dias santos. Passei a ser temente a Deus.
A Igreja seguia e impunha aos fieis as deliberações do Concílio de Trento (1545 – 1563), o décimo nono da cristandade, pois o vigésimo, o Concílio Vaticano I, convocado pelo Papa Pio IX, em 1869, para enfrentar o racionalismo, só reforçou a infalibilidade papa. Foi um concílio encerrado pela invasão de Roma pelas tropas italianas, lideradas por Giuseppe Garibaldi, e pela eclosão da guerra Franco-prussiana.
Meados do século XX, e a Igreja seguia divulgando a sua doutrina, suas crenças e ideologias, e dominando as consciências. Acreditávamos no purgatório, nas indulgências, no pecado (original, mortal, capital e venial), no anjo da guarda, no sacramento do casamento, na excomunhão dos hereges, nas graças de Deus (perdidas com o pecado mortal), no fogo eterno, no Limbo, na confissão e na penitência.  Venerávamos as imagens dos santos e os padres andavam de batina de 33 botões, a quem pedíamos a benção.
A missa, rezada em latim, era um sacrifício incruento de Cristo, onde deveríamos participar com o coração sincero e a fé verdadeira, com temor e reverência, contritos e penitentes, para alcançarmos a misericórdia, a graça e o auxilio oportuno. O sacrifício da missa era propiciatório pelos vivos e defuntos.
Em outubro de 1962, o Papa João XXIII abriu o 21º concílio ecumênico da Igreja Católica, o segundo a se realizar no Vaticano. O Concílio Vaticano II, com as suas mudanças. Em 13 de setembro de 1964, aconteceu a primeira missa solene cantada em português no Brasil, na Igreja Nossa Senhora do Brasil, na Urca, Rio de Janeiro. O fim de uma Era. A Igreja abandonava o Deus que concedia graça aos bons, clemência aos aflitos e condenava os maus ao fogo eterno. Deus passou a ser o “amor”, adotou a tolerância e o ecletismo, e chegamos onde estamos.
Em junho de 1963, morreu de câncer o Papa João XXIII. Foi a última manifestação da antiga fé tridentina que alcancei em Itabaiana. Aos noves anos, acompanhei com atenção a agonia final do “Papa Bom”. Os sinos da Matriz de Santo Antonio e Almas tocaram sem parar o dia todo.

Com a retirada da Igreja, abriu-se uma janela para as novidades do mundo pagão. Timidamente, passamos a amar os Beatles e os Rolling Stones; crescer os cabelos, lutar pela liberdade e pelo amor livre, como se dizia, com certo exagero (sexo, drogas e rock ‘n roll). Mas aí já é outra estória.

sexta-feira, 5 de junho de 2015

"ACADEMIAS DE LETRAS"?

“Academias de Letras”?
Antonio Samarone
Academia Itabaianese de Letras

A expansão da economia capitalista, a revolução dos meios de comunicação e dos transportes, transformaram o mundo numa Aldeia Global. Por outro lado, as tentativas de universalização da cultura, de um único modo de vida, não tiveram sucesso. Ao contrário, houve um fortalecimento e até mesmo uma valorização das culturas locais, de um saber local emergente. Em Sergipe, que primeiro enxergou a pujança desse movimento foi Luiz Antonio Barreto.
Em várias localidades de Sergipe surgiam iniciativas isoladas de produção cultural, de pessoas reinterpretando o seu dia-a-dia, através da fotografia, livros, dança, teatro, folclore, etc. A questão era o que fazer para dinamizar essa energia, potencializá-la, criar canais de divulgação, e por fim, conectar essas manifestações com o chamado mundo globalizado. Como fazer? O mais prático, foi utilizar os espaços das agonizantes Academias de Letras, improdutivas, empoeiradas, mas com reconhecimento social e uma burocracia constituída. Então, vamos juntar esses novos pensadores, criadores de cultura, de novas interpretações do mundo, em Academias de Letras.
Contudo, esse foi somente um primeiro passo. As Academias se proliferaram por vários municípios. Mas o que é uma Academia de Letras, para que serve, quais os seus objetivos, qual o seu papel na sociedade? Essa parte não está resolvida. No momento, existem vários projetos de Academia em disputa, várias visões, cada uma com os seus argumentos e suas justificativas. Consigo enxergar alguns desses projetos. Vamos lá.
1.       Academia como espaço de reconhecimento dos talentos individuais de cada localidade; um culto aos que se expressam na linguagem escrita; espaço onde devotos de uma cultura erudita trocam loas e autoelogios, tomam chá e declamam poesias. Normalmente, esses imortais vivem para os seus próprios umbigos, e o compromisso é com uma estética universal, com o belo.  
2.       Academia como um prolongamento do saber oficial professado nas universidades, quase um programa de extensão. Espaço de reunião dos que vivem para a ciência, currículos premiados, doutores e pós doutores; mandarins do saber. Sem compromissos especiais com as realidades locais, estudam e pesquisam o que fortalece suas carreiras profissionais. Combate aos charlatões (os demais).
3.       Academia como espaço aberto ao popularesco, ao relativismo cultural. Reunião de todos os que falam ou escrevem em nome da cultura popular, a única verdadeira. Independentemente do valor (que valor?). O espaço deve abrigar todos os que cantam, dançam, rimam e trovejam, quase sempre injustiçados. Nesta visão, todos somos talentosos e possuímos dons artísticos, perde-se qualquer referência.
4.       Academia como espaço de construção de novas interpretações da realidade local, da ligação do específico com o global, do popular com o erudito. Espaço de criação de uma realidade simbólica, de fortalecimento das manifestações espontâneas dos talentos locais, de abertura para novos saberes, novas expressões culturais; mas, também espaço de recuperação da memória social, da recuperação do já produzido; da retirada do limbo do esquecimento, os que vieram antes, e começaram a construir essa civilização.

Claro, devem existir dezenas de outras visões, outros modelos de Academia, mas essa minha reflexão não é nem exaustiva nem conclusiva. Pretendo apenas provocar um debate com os interessados. Hoje, 05/06/2015, a Academia Itabaianense de Letras completa o seu quadro estatuário, com a chegada de novos membros. Sejam todos bem-vindos.