quarta-feira, 30 de novembro de 2022

QUAL É A CAPITAL MAIS VERDE DO BRASIL

Qual é a Capital mais verde do Brasil?
(por Antonio Samarone)

Em trabalho publicado sobre a cobertura vegetal das regiões centrais das 27 capitais brasileiras, os pesquisadores João Carlos Nucci e Mariane Félix da Rocha, da Universidade Federal Fluminense, concluíram:

"Brasília (DF) alcançou a primeira posição, com 31,83% de cobertura vegetal na área mapeada, e Aracaju (SE) ficou em último lugar, com 6,38% de cobertura vegetal, em sua área central."

Por que Aracaju ostenta essa lanterna vergonhosa? A um olhar desatento, Aracaju engana, pela cobertura dos manguezais remanescentes, nas franjas dos rios, riachos e marés.

O frondoso manguezal da Praia 13 de Julho, é um tributo da natureza ao mar de estrume humano ali lançados, pela DESO. É bonito, mas fede a ovo podre.

Por que não gostamos das arvores? Se diz em Aracaju, que elas quebram as calçadas e soltam as folhas. Não se trata apenas da ausência de prioridade política, é uma questão com raízes culturais profundas.

Não se chama as árvores pelo nome, quase não se conhece, é tudo pé de pau. É uma herança colonial.

Entra prefeito e sai prefeito, todo ano um programa de arborização é lançado, e nada funciona. O foguetório é grande, os resultados inexpressivos. A maior parte da mudas plantadas, não suportam a ausência de manutenção.

Parte do empresariado de eventos resiste a arborização do Parque da Sementeira. Querem um espaço de shows e eventos. O último plantio expressivo na Sementeira foi na primavera de 2005, com Marcelo Déda.

Quando se cobra um Jardim Botânico em Aracaju, setores da construção civil entram em pânico. “A terra urbana vale ouro, para se encher de mato”, me disse um desses influentes especuladores imobiliário.

Os terrenos vazios do Aracaju são de “engorda”, objeto da especulação.

O que ameniza é o que resta de Mata Atlântica, no Morro do Urubu e os remanescentes dos manguezais.

A questão ambiental é um entrave para o desenvolvimento do Aracaju. A arborização e a despoluição da bacia do Rio Sergipe, são pontos inadiáveis.

Antonio Samarone. (médico sanitarista)


 

SERGIPE E A CANTIGA DA PERUA

 Sergipe e a cantiga da perua.
(Antonio Samarone)

Com a edição do AI-2 e do AI-3 (1966), a ditadura estabeleceu restrições ao STF, extinguiu os partidos políticos e tornou indiretas as eleições para governador e prefeito das capitais.

O último prefeito eleito de Aracaju foi Godofredo Diniz (1963) (foto).

Entre os prefeitos biônicos do Aracaju, surpreende a indicação de nomes fora da política: o economista Aloísio Campos (1968 – 71) e o médico Cleovansostenes Pereira de Aguiar (1971 – 74).

Em 1974, o governador José Rollemberg Leite vai longe, escolheu mais um técnico: o engenheiro civil recém formado, João Alves Filho, aos 30 anos. João Alves ainda era um desconhecido na política. Fez uma gestão que mudou a cara do Aracaju.

Em 1982, no restabelecimento das eleições diretas para Governador, ocorreu uma novidade política, fora das tradições de Sergipe. O Governador Augusto Franco, chefe político absoluto do estado, elegeria até um “poste” em sua sucessão, resolveu indicar o engenheiro João Alves como candidato, preterindo as peludas raposas políticas do PDS, antiga ARENA, seu grupo.

Augusto Franco, senhor de baraço e cutelo, escolheu um nome sem origem nos engenhos, negro, desconhecido, sem tradição familiar, para governar Sergipe.

Claro, teve eleições, mas naquele tempo o voto era em sua maioria encabrestado.

Naquela eleição de 1982, Augusto Franco teve mais votos para Deputado Federal que os candidatos a governador pela oposição somados, Gilvan Rocha (MDB) e Marcélio Bonfim (PT).

João Alves se elegeu e virou o maior líder político de Sergipe, no pós ditadura. Governou o estado por três vezes, a Prefeitura da capital por duas e chegou a Ministro.

Não tardou o rompimento de João Alves (PFL) com o PDS de Augusto Franco. No restabelecimento das eleições diretas para os Prefeitos das Capitais (1985), João se alia ao MDB de José Carlos Teixeira e Jackson Barreto.

Com essa aliança, José Carlos Teixeira virou o último prefeito biônico do Aracaju e Jackson Barreto o prefeito mais votado do Brasil.

Acho que o passagem de Augusto Franco pelo governo de Sergipe, precisa ser estudada. O último oligarca assumido, com cara e jeito de oligarca, mas que fez um governo acima dos últimos populistas que chefiaram o estado.

Ele ter escolhido João Alves em 1982, foi uma opção pela gestão e um freio na politicagem. Ou não? João Alves de administrador, logo virou político. O lema do seu primeiro governo foi “mãos à obra” e a prioridade o Projeto Chapéu de Couro.

Quem quiser saber os detalhes, a biografia de João Alves já foi escrita por Débora Pimentel, confreira da Academia de Medicina. Confesso que ainda não li.

Com a morte precoce de Marcelo Déda, Sergipe retomou a tradição do período populista (1945 – 64), o reino da politicagem.

Vamos aguardar a “nova geração” de Mitidieri.

Não começou bem. Soube por um Vereador influente, que o Prefeito do Aracaju está encontrando dificuldades na aprovação de um empréstimo do BRICs, necessário para o desenvolvimento da cidade. As dificuldades são picuinhas políticas e o grupo de Mitidieri é maioria na Câmara.

Sei que vão desmentir, que não é nada disso, etc. Mas onde há fumaça há fogo.

Sergipe precisa de gestões competentes.

Antonio Samarone (médico sanitarista)

VOCÊ SABE COM QUEM ESTÁ FALANDO

 Você sabe com quem está falando?
(Por Antonio Samarone)

Romualdo (Ramu) é um liberal bem informado, democrata, tolerante à diversidade, acredita no livre mercado, no empreendedorismo e votou em Simone Tebet, no primeiro turno. No segundo, ele desconversa.

Para os padrões sergipanos, Ramu é um empresário bem sucedido, no ramo de padaria, delicatessen e posto de gasolina. Um crente do capitalismo.

Ramu é liberal na economia e nos costumes. Só teme o comunismo. Não enxerga esse “risco” no Brasil, mas teme o fantasma. “Nunca se sabe”, diz ele precavido.

Para quem gosta de enquadramento: Romualdo compõe o reduzido “centro democrático”. Não confundir com o nocivo “Centrão”. Não vê com simpatia as manifestações bisonhas dos camisas amarelas, muito menos o futuro governo Lula.

Ramu, acha que qualquer governo é um peso para a sociedade, que o poder resume-se em ordenar despesas, prender e soltar, nomear e demitir. “Os governos parasitam a sociedade.”

Em Sergipe, nunca existiu fronteiras entre o público e o privado. O bom governo é o que cisca para fora, ou seja, o que libera uma laminha para os correligionários. O que não come sozinho.

Nesse quadro, a elite provinciana tem mantido os seus interesses e a sua dominação.

A autoridade é demonstrada na carteirada, no jeitinho e no patrimonialismo: “você sabe com quem está falando?”. Para os amigos tudo, para os inimigos a lei.

Romualdo, me indicou um livro do seu conterrâneo, Pascoal Nabuco.

Em Sergipe, temos um capitalismo de compadres. Pascoal Nabuco, que conheceu os “meandros” do poder, destrincha essa realidade em seu livro “Visão Política de Sergipe (1946 a 2016)”. Esse compadrio vem de longe.

“A maior virtude do SUS é tratar igualmente a todos. A vez é de quem chegou primeiro, sem distinção. Em Sergipe, o apadrinhamento invade até os hospitais: sem conhecimentos, a sua vez demora, ou nunca chega.” Diz o irônico Romualdo.

Eu queria acrescentar à descrença no Estado de Ramu, uma inconfidência: em Sergipe, a chamada esquerda não foge desse quadro. O vicio patrimonialista é atávico, ancestral, incrustado na cultura.

Romualdo foi meu aluno, no Arquidiocesano do Padre Carvalho.

Antonio Samarone (médico sanitarista)

TABA ÇAMGUE

 Taba Çamguê.
(por Antonio Samarone)

O Prefeito Adailton Souza, está inaugurando uma Praça no Povoado Zanguê, Zona Rural de Itabaiana. Uma gestão de excelência. Antes, praciante era sinônimo de quem morava na cidade. Hoje, o povo do Zanguê vira praciante. Terá a sua praça!

Os povoados em Itabaiana, além de praças, estão recebendo água encanada, esgoto, escola, posto de saúde e ruas pavimentadas. Em síntese: qualidade de vida.

Zanguê, segundo Sebrão Sobrinho, deriva do nome da tribo Çamguê. Poderia ter sido Sanguê, Banguê (já teve engenhos), Manguê (já foi mar), Ganguê (já foi tribo), mas os portugueses chamaram de Zanguê. Terra boa, sítios excelentes.

“Zanguê é um enorme boqueirão, por onde se despeja o poético Jacarecica em busca do rio Sergipe. Uma planície descensionária.” – Sebrão.

O Povoado Zanguê, no vale do Jacarecica, limita-se com o Bom Jardim ao Sul e com a Cova da Onça ao norte. Foi o berço do Arraial de Santo Antonio e Almas de Itabaiana. Foi lá que construíram a Igreja Velha e onde hoje funciona a barragem do Jacaracica I, onde instalou-se a Agrovila.

“O rio Jacarecica nasce na fazenda Silvestre, no pé da Serra do Pinhão e faz barra no rio Sergipe, no engenho Santana, em Riachuelo.” – Sebrão.

No povoado Candeias, onde meu pai nasceu, o Jacarecica recebe o riacho Piripiri, de vários banhos.

Entre o Zanguê e às Candeias, estava o centro da produção agrícola: a farinha, inhame, aipim, batata, ovos, cebola e alho. Na franja do Malhador (grande malhada). Tudo levado pelos tropeiros até Roque Mendes, onde embarcava em veleiros para abastecer Aracaju.

A Capela do Zanguê foi obra de frades alemães, não sei de quando.

O Zanguê deu gente importante. O professor Cícero, pai de João de Deus e Fabiano. Seu Antonio de Anginho, o patriarca do Beco Novo, era de lá. A família de Zé Crinspim, alfaiate e escritor, também do Zanguê.

O filosofo Tonho Grampão, tem raízes no Zanguê.

O Zanguê, em minhas lembranças, foi o berço dos professores. Matiapoan, o celeiro dos intelectuais.

O povo do Zanguê se arranchava no Beco Novo. Na primeira infância, eu frequentava o Taboleiro dos Caboclos e a Fazenda Grande, caminhos do Zanguê.

Se eu tiver disposição, vou ver essa novidade urbana: uma praça para o lazer dos tabaréus no Zanguê.

Antonio Samarone (médico sanitarista)

GENTE SERGIPANA - JOSÉ QUIROZ


 Gente Sergipana – Zé Queiroz (86 anos)
(Por Antonio Samarone)

A Academia Itabaianense de Letras homenageou com a sua principal comenda, José Queiroz da Costa. Queiroz é a encarnação da alma itabaianense.

Como é a natureza do itabaianense? Pode responder: do jeito de Zé Queiroz

Zé Queiroz é filho único de Antonio Sacristão e Dona Rosinha, neto de Seu Cazuza, um comerciante de tecidos, assassinado misteriosamente em praça pública. Nunca se descobriu o assassino.

Zé Queiroz já nasceu esperto, sempre foi protagonista. Foi ponta esquerda do Cantagalo, com o apelido de Zé Gatinha. Um jogador veloz.

Foi o orador da primeira turma do Ginásio Murilo Braga. Funcionário do Banco do Brasil, que já foi um excelente emprego.

Os feitos de Zé Queiroz são imensos. Itabaiana deve a ele o penta campeonato, os dois cinemas (Santo Antonio e Popular) e a rádio Princesa da Serra. O desenvolvimento de Itabaiana tem a digital de Zé Queiroz.

Foi Deputado Constituinte, nota dez. Nunca votou contra os trabalhadores. No entanto, a carreira política era incompatível com a sua personalidade. Queiroz nunca foi de conchavos e arrumações. Sempre disse o que pensava, e isso em política é quase um suicídio.

Contudo, a maior contribuição de Zé Queiroz para Itabaiana foi imaterial. Ele foi um exemplo de sucesso e a sua autoestima era contagiante. A alma itabaianense condicionou a personalidade de Queiroz, que realimentou o nosso jeito: uma gente independente, empreendedora, recheada de narrativas, ironias, espertezas e sabedorias.

O itabaianense é original, acha-se o centro do mundo. E talvez seja!

Queiroz foi um intransigente, nunca abriu mão, quando se considerava certo. Defendia o que pensava, com competência e de forma destemida. Nunca deu o braço a torcer.

Mesmo quando errava, no final dava certo.

Claro, Queiroz também tem os defeitos dos itabaianense, e outros, mas são os defeitos dos bem intencionados. É a nossa herança judaica. Não somos nem melhores, nem piores, apenas diferentes.

O itabaianense é um bairrista incorrigível, um provinciano pretensioso, que tem orgulho das próprias fragilidades. Zé Queiroz contribuiu muito para o fortalecimento dessa autoestima.

A alma Itabaianense herdou muito da competência e da auto estima de Zé Queiroz. Somos gratos!

Minhas homenagens a Zé Queiroz da Costa.

Antonio Samarone (médico sanitarista)


ORA BOLAS...

 Ora bolas!
(por Antonio Samarone)

Hoje, o Brasil estreia em mais uma Copa do Mundo. A minha lembrança mais antiga é de 1962, o bi campeonato. Itabaiana, como qualquer aldeia, fez festa com o título. Ouvia-se os jogos pelo rádio. Eu só lembro das comemorações.

A bola da Copa 2022, “Al Rihla”, tem até chip, para que se possa acompanhar a sua trajetória. A bola é vigiada pela internet das coisas.

A partir de 1962, o futebol virou uma obsessão para os meninos pobres. Todos queríamos ser Pelé ou Garrincha. Só que Mané tinha as pernas tortas. A bola virou o sonho de todos.

Não falo da bola de couro curtido, sem chances. Em Itabaiana não se vendia essas bolas. Comprava-se a bexiga em São Paulo e Mestre Dé encouraçava. Revestia-a de couro de segunda. Quando molhava, a bola pesava uma tonelada. Após cada jogo, passava-se sebo na bola e esvaziava-se. O sebo para evitar o ressecamento e o esvaziamento para se evitar que a bola ficasse oval.

Os gomos da bola de couro eram costurados à mão, com uma sovela. No local do pito, colocava-se uma tampão. As bolas continuavam de couro até 1970, ano do tri. A bola de couro feita em Itabaiana era quase de pedra. Dura e pesada.

A molecada do Beco Novo jogava na rua com bolas de meias. Isso mesmo, enchia-se um meia usada de pano, amarrava-se a boca, e estava consumado o objeto de desejo.

Depois apareceram as bolas de borracha. As danadas pulavam sem parar, eram bolas vivas. Se essa bola atingisse as costas de uma atleta, a marca ficava por semanas. Se atingisse o rosto, era nocaute.

Apareceram as bolas de plástico, chamava-se bolas Pelé. Foi um avanço tecnológico. Leves e maneiras. As peladas eram jogadas com pés descalços e com a bola Pelé. Foi um paraíso para a molecada. O dono da bola tinha um privilégio, era sempre titular. Qualquer contrariedade, o dono ia embora com a bola.

Experimentei jogar com uma bola de couro aos 15 anos, no campo de Mané Barraca. Os irmão de Benjamim, que moravam em São Paulo, mandaram um bola de couro para ele. Passamos a adular Benjamim: “meu amigo, vamos Jogar, leve a bola!”

Nesse tempo já existiam bolas de couro industrializadas. Eram numeradas pelo tamanho: bola numero dois, três, quatro e cinco. As bolas número cinco ainda podiam ser oficiais e não oficias. A bola de couro de Benjamim era oficial, numero 5. Uma glória. A única bola de verdade estava Beco Novo.

Os meninos das outras ruas babavam de inveja. Isso, sem exagero, a baba escoria pelo canto da boca. Eu vi!

Antonio Samarone. (médico sanitarista)

A PRINCIPAL DOENÇA DE SERGIPE É A POLITICAGEM

 A principal doença de Sergipe é a politicagem.
(por Antonio Samarone)

Um estado pequeno, pobre, desigual, não suporta a sangria realizada pelos bandos partidários. O poder público, ironicamente chamado de “máquina”, foi tomado como butim, pelos vencedores da guerra eleitoral.

Historicamente, Sergipe passou do mando dos coronéis, para o reino dos “cabos eleitorais”. Um Império das raposas políticas. Os parcos recursos são leiloados entre eles.

Enquanto isso, Sergipe afunda no desemprego, na violência, na improvisação e no obscurantismo.

O “fenômeno” Valmir de Francisquinho foi a sua imagem de bom gestor, de ter consertado Itabaiana. Só pararam Valmir no tapetão. Outro bom gestor, Edvaldo Nogueira, foi afastado antes da disputa, pela fama de não cumprir “acordos”.

Entenderam? “Acordos” entre aspas...

O povo, ao seu modo, entendeu que está fora do orçamento público. No segundo turno, Rogério Carvalho não perdeu pelas alianças que fez. Não! Perdeu porque a versão disseminada, foi a dele ter destruído a saúde. Pegou! Rogério limitou-se a dizer que era o nome de Lula. Brigou por isso. O povo queria gestores.

A minha tese foi comprovada em Pernambuco. Raquel Lyra derrotou a neta de Arraes, apoiada por Lula, pela máquina e pelo PT, com a boa imagem de gestora. Ela foi Prefeita de Caruaru por duas vezes, com grande sucesso. Semelhante a experiência de Valmir em Itabaiana.

O governador eleito Fábio Mitidieri está cercado de comensais. O seu sucesso depende desse obstáculo. A chamada nova geração, tanto pode mudar e realizar um governo a serviço da sociedade, ou pode permanecer sob o domínio dos conchavos e acomodações.

Sergipe precisa de uma imprensa livre, pelo menos parcialmente. Se as análises políticas, de uma boa parte dos jornalistas, permanecerem previamente contra ou a favor, dependendo de quem pague a conta, dos interesses da politicagem, estamos perdidos.

Quem poderá se constituir como força política, a partir de 2023?

Enxergo 4 possibilidades:

1. O grupo no governo, liderado por Fábio Mitidieri, por razões óbvias;

2. Edvaldo Nogueira, prefeito da Capital, permanecendo como bom gestor;

3. Valmir de Francisquinho, líder no agreste, permanecendo a boa gestão em Itabaiana e mantendo a influencia nos demais municípios da região;

4. O PT, mesmos saindo fragilizado em Sergipe com a derrota eleitoral, vai governar o Brasil.

Não enxergo viabilidade política em Sergipe dos grupos bolsonaristas. A base de extrema direita é grande, mas muito heterogênea. E os líderes não pensam em Sergipe.

A superação desse azedume maniqueísta, do fanatismo, do fake news, do ódio e da violência depende da mudança dos paradigmas político. Os novos líderes precisam entender que o poder publico precisa de boa gestão, transparência e planejamento.

Antonio Samarone (médico sanitarista)

GENTE SERGIPANA - MARIETA BARBOSA


 Gente Sergipana – Marieta Barbosa.

O Conselho Estadual de Educação prestou uma justa homenagem à professora Marieta Barbosa. Uma vida dedicada a educação.

Marieta sonhou mudar o mundo. Acreditou que o socialismo era uma utopia possível. Acreditou no fim das desigualdades sociais, da violência e da intolerância, sobretudo, acreditou que a educação era o caminho.

Não usou o talento e o conhecimento para amealhar fortuna. Não fez da educação um rendoso negócio. Empenhou-se em melhorar a escola pública.

Conheci Marieta Barbosa menina, aluna do saudoso Colégio Arquidiocesano, do monsenhor Carvalho. Em plena ditadura, esse colégio de padres era um exemplo de cidadania. Foi lá que abrigaram-se os alunos expulsos pelo governo militar dos colégios públicos, em Aracaju.

O monsenhor Carvalho acolhia a todos, era um educador moderno. Mesmo obediente a uma diocese conservadora, ele zelava pela liberdade no colégio. Foi lá que eu conheci Marieta, como professor de ciências e biologia.

Marieta, ainda menina, já era ativa, personalidade forte, nariz arrebitado e já envolvida num movimento de rebeldia juvenil dentro do colégio. Chegaram a publicar um jornalzinho.

Nasceu ali uma amizade de mais de meio século. Quando comecei namorar Betânia, minha esposa, por coincidência amiga de Marieta, a minha sogra só permitia as saídas, acompanhados de Marieta, que inspirava confiança nos mais velhos.

Marieta casou cedo! Pensamos: perdemos uma guerreira. Nada! Marieta continuou envolvida. Sempre comprometida em defesa dos excluídos. Vi os filhos de Marieta engatinharem (Lucas e Bruno).

Ontem, na solenidade, em seu discurso de alma aberta, ela revisitou a sua longa e profícua vida, recheada de realizações e emoções. Não vou cansá-los com a transcrição. Creio que o discurso tenha sido gravado e, em breve, se tornará público.

Ficamos emocionados com a firmeza de Marieta na solenidade. No momento, ela enfrenta uma tempestade ameaçadora à sua sobrevivência. Mesmo assim, não abriu mão da luta e dos sonhos.

Fronte erguida, diante dos familiares, amigos, admiradores e colegas de trabalho, Marieta teceu um hino à vida, dentro dos limite da condição humana.

Encerou dizendo que se soubesse cantar, a canção escolhida seria a de Violeta Parra: “Gracias a la vida/ Que me ha dado tanto/ Me ha dado la marcha/ De mis pies cansados/ Con ellos anduve/ Ciudades y charcos/ Playas y desiertos/ Montañas y llanos/ Y la casa tuya/ Tu calle y tu patio.”

Uma canção dos tempos da esperança.

Marieta Barbosa é um exemplo de humildade e grandeza. O meu respeito e admiração são eternos.

Antonio Samarone (médico sanitarista)

sexta-feira, 18 de novembro de 2022

GENTE SERGIPANA - REGES MEIRA

Gente Sergipana - Reges Almeida Meira (72 anos)
(por Antonio Samarone)

Natural de Itabaiana, nascido em 17 de novembro de 1950. Filho de Pedro da Jabá e dona Zuzu, neto de Joãozinho de Norato e dona Melinha.

Em 1957, por desavença política com Euclides Paes Mendonça, para evitar perseguições, Pedro da Jabá mudou-se com a família para Aracaju. Foi o passo decisivo, pois em Aracaju estabeleceu-se na Rua Santa Rosa e virou o rei da jabá, tornando-se o único importador no Estado.

Pedro da Jabá virou um homem rico, compôs uma geração de itabaianenses que dominou o comércio de Sergipe desde a década de 1950 (Pedro Paes Mendonça, Mamede Paes Mendonça, Gentil Barbosa, Oviedo Teixeira, Albino Silva da Fonseca; Noel Barbosa, Zé de João de Rola).

Reges Meira viveu uma adolescência de filhinho de papai, tendo de tudo. Isso não o fez descuidar dos estudos. Fez o primário no Colégio Dom José Thomaz; o ginásio no Jackson de Figueiredo e o científico no Ginásio de Aplicação.

Em 1970, Reges Meira entrou na Faculdade de Medicina de Sergipe, e para surpresa de Aracaju, ganhou um “dodge dart” amarelo de presente.

Nos primeiros períodos decidiu acompanhar o Dr. Oswaldo Leite no serviço de radioterapia. Aprendeu muito com a experiência do velho mestre. Quando se formou em 1975, Reges Meira foi fazer residência médica em radioterapia (3 anos), no Sírio Libanês em São Paulo, no serviço do renomado professor Mathias Octávio Roxo Nobre.

Após a residência médica, o Dr. Reges Meira foi administrar o serviço de radioterapia do Hospital de Cirurgia. Isso durou de 1977 à chegada ao poder do Partido dos Trabalhadores. em 2009. O contrato do SUS com a radioterapia do Cirurgia foi rompido unilateralmente.

Reges Meira ficou sem condições de continuar exercendo as suas funções no hospital. Para sobreviver, foi fazer medicina no PSF de Campo do Brito, Frei Paulo e Carira.

Dr. Reges Meira foi Presidente da SOMESE.

Antonio Samarone (médico sanitarista)
 

MÉDICOS E LOUCOS


 Médicos e Loucos.
(por Antonio Samarone)

A “loucura” do Dr. João Vieira Leite.

Um caso tenebroso da medicina, no início do século XX: o tratamento da “loucura” do Dr. João Vieira Leite, médico e Governador de Sergipe (por poucos dias).

O Dr. João Viera Leite é filho do Coronel Sisenando de Souza Vieira e D. Adelaide Leite Vieira, nascido no engenho São Félix, cidade de Santa Luzia do Itanhy, a 04 de setembro de 1867. Irmão do famoso médico Dr. Berílio Leite, que fez história na Estância.

Dr. João Vieira Leite colou grau em medicina pela Faculdade da Bahia, em 27 de outubro de 1890, defendendo a tese “Apreciação dos métodos operatórios gerais adotadas na operação cesariana”.

Em seu retorno à Sergipe, montou a sua clínica na praça da Matriz em Estância, sendo bastante aceito. Foi diretor e grande benfeitor do Hospital Amparo de Maria.

Entre seu retorno a Sergipe em 1890 e 1901, o Dr. João Vieira teve carreira meteórica como médico e como político. Um personagem destacado da vida sergipana.

Foi Intendente municipal em Estância (Prefeito), Deputado Estadual nas legislaturas 1894-95, 1896-97, Presidente da Assembleia Legislativa, e nessa condição, Governador de Sergipe por 44 dias, após a deposição de José Calazans (1894).

Até quando ocorreu uma grande tragédia: o Dr. João Vieira, ainda moço, com apenas 35 anos, começou a apresentar um comportamento “estranho”, “esquisito”, o que não demorou muito tempo para que a comunidade suspeitasse de que o facultativo estivesse ficando maluco. E nessa condição de louco, foi levado à força, pela família, para o Rio de Janeiro, em busca de tratamento.

O Dr. João Vieira resistiu a ida para o Rio de Janeiro. Não houve acordo. O ex-governador de Sergipe foi apeado numa camisa de força e, sob intensa violência, embarcado para a sua última viagem.

Durante a viagem, que durava de cinco a oito dias, o Dr. João Vieira foi enclausurado num apertado compartimento do “Vapor Manaus, da Cia. Esperança Marítima”, transformado em solitária. João Vieira reagiu a repressão insana.

Após muita violência, tortura física e mental, de bater-se insistentemente com cabeça nas paredes, de muita luta para liberta-se, muita automutilação. João Vieira, médico, governador de Sergipe, foi abatido pelas práticas psiquiátricas da época.

Em 21 de janeiro de 1902, nas proximidades do porto de Vitória, no Espírito Santo, antes de chegar ao seu destino no Rio de Janeiro, o Dr. João Vieira não resistiu aos sofrimentos e faleceu de forma absurda, resistindo à violência da internação e lutando por liberdade.

Dr. João Vieira Leite, um esquecido mártir da psiquiatria.

Antonio Samarone (médico sanitarista)

quarta-feira, 16 de novembro de 2022

ARACAJU, A SULTONA DAS ÁGUAS


Aracaju, a sultana das águas.
(por Antonio Samarone)

Aracaju tem uma história marcada pela rebeldia política.

Nas primeiras eleições depois da ditadura do Estado Novo (1945), Luiz Carlos Prestes foi o senador mais votado em Aracaju e o desconhecido Yedo Fiuza (PCB), o mais votado para Presidente da República.

Na década de 1960, Aracaju acordava todo 03 de janeiro com um foguetório. Era o aniversário do Cavaleiro da Esperança.

Aracaju derrotou o PSD dos coronéis em 1954, com Leandro Maciel, elegeu José Conrado de Araújo Prefeito, em 1959.

Aracaju elegeu para o Senado, o médico Gilvan Rocha em 1974, o mineiro Eduardo Dutra em 1994 e o gaúcho Alessandro Vieira em 2018. Aracaju sempre votou livremente e quase sempre de forma rebelde.

Em 1985, Aracaju deu a Jackson Barreto a maior votação do Brasil, para Prefeito. Consagrou Marcelo Déda Prefeito pelo voto, em 2000.

Aracaju elegeu o pão-de-açucarense Edvaldo Nogueira Prefeito, por três vezes.

No segundo turno da ultima eleição, Aracaju voltou a surpreender: Elegeu Lula e derrotou o candidato a governador do PT. Não é fácil explicar a elevada votação de Fábio Mitidieri em Aracaju. Vários políticos apareceram querendo ser o pai da criança.

O senso comum atribuiu a vitória à máquina (estado e prefeitura). Não acredito! O eleitorado de Aracaju já votou várias vezes contra a máquina. Claro, a máquina pesa, mas não é suficiente.

O que sinto é que o envolvimento direto do atual prefeito de Aracaju, na linha de frente da campanha, legitimado pela boa gestão, teve um peso decisivo. Em Aracaju, mesmo os adversários, reconhecem a qualidade da gestão da cidade.

O que falta a Edvaldo de carisma, sobra em competência administrativa. Claro, a atual gestão precisa melhorar, se modernizar, abrir-se a participação da sociedade, colocar as questões ambientais e culturais na ordem das prioridades e redefinir a mobilidade.

O atual modelo de mobilidade vem da primeira gestão de João Alves (1978). São quase 50 anos.

Em Aracaju, a cultura é relevante, tem tradição, não pode ser um apêndice.

Aracaju é cercada por rios poluídos. Ou se enfrenta essa questão, ou a qualidade de vida e o turismo padecem. A praia formosa fede a enxofre, não suporta as toneladas de resíduos “in natura”, ali derramados.

A DESO cobra caro para tratar o esgoto, mas não cumpre com a sua responsabilidade.

Votei no primeiro turno em Valmir e no segundo em Rogério (PT). Entretanto, torço para que a nova geração que está chegando ao poder, nos livre dos traumas das últimas gestões.

Sergipe precisa de gestão de qualidade, para voltar a se desenvolver.

Antonio Samarone (médico sanitarista)

terça-feira, 15 de novembro de 2022

O JIHADISMO VERDE E AMARELO

 O jihadismo verde e amarelo.
(por Antonio Samarone)

As portas dos quartéis estão tomadas por pessoas pedindo um golpe, uma ditadura. Quem é essa gente? É um partido político, um sindicato, um movimento, uma seita?

Em que eles acreditam? Vão além da política? É uma nova seita, um culto? Claro, tem uma inspiração neofascista, mas isto só não explica tudo.

Por enquanto é um movimento de extrema direita, diferente do Ku Klux Klan e dos Supremacistas Brancos, nos EUA. No Brasil, eles se consideram “patriotas”, com tudo de negativo que o conceito significa. São “patriotas” dispostos a tudo: morrer ou matar pela causa. Qual é a causa?

São negacionistas? São os mesmos que negavam a vacina, o distanciamento social, defendiam o tratamento preventivo, rejeitavam as máscaras e que agora negam as eleições, os poderes constitucionais, o TSE e o STF? O que eles pensam?

Uma constatação: existe uma profunda dissonância cognitiva.

Eles acreditam em seus desejos, por mais absurdos que pareçam. É um negacionismo eleitoral, na mesma linha do negacionismo da vacina. Eles acreditam que o Alexandre de Moraes foi preso, que existe um golpe em andamento, que as forças armadas podem fechar o país e que estão chegando os contêineres com as armas. É o chamado terraplanismo.

A pergunta continua sem respostas: quem são os manifestantes que pedem abertamente uma ditadura? Quantos são e a quem representam? Ainda existe uma direita democrática, que aposta na democracia?

É uma direita religiosa de jihadistas tupiniquins, centrada nos princípios integralistas: “Deus, Pátria, Família e Liberdade?

É uma seita milenarista esperando um milagre, que algo grande está para acontecer. Na verdade, eles estão descolados da realidade.

Os símbolos fascistas entram aos poucos, como se fossem uma transgressão engraçada, uma rebeldia aceitável. A saudação romana já é praticada abertamente. Deixou de ser uma direita envergonhada, perdeu o pudor.

Chama a atenção, a ausência nas manifestações dos camisas amarelas, dos deputados e senadores recém eleitos. Ninguém aparece, nem os que fizeram discursos políticos radicalizados durante a campanha.

Eles não assumem a defesa de um golpe. O radicalismo era apenas eleitoral. Eles são muito apegados aos mandatos, têm pessoalmente o que perder.

Durante a campanha eleitoral, a disputa pela bandeira bolsonarista foi intensa. Cada um se apresentava como sendo os verdadeiros bolsonaristas.

Os políticos eleitos em Sergipe com a bandeira da extrema direita, estão em silêncio sobre as manifestações dos camisas amarelas. Não sabem se ganham ou perdem prestígio envolvendo-se na defesa do golpe.

As motociatas no interior do Brasil foram treinamentos para essas manifestações. Esse movimento nem é espontâneo, nem começou agora e está sendo regiamente financiado. Em Sergipe, todos sabem quem paga a conta do golpismo.

A questão não é só política, transcende, e mostra-se como um problema de Saúde Pública. Ninguém marcha, canta hinos militares, presta continência a um pneu, somente por insatisfação política. Assuma-se ou não, a histeria coletiva é visível.

A vitória de Lula ameniza politicamente, mas, além de não resolver a polarização tóxica, fortalece o subterrâneo das teorias conspiratórias. A extrema direita no Brasil é uma ideologia militante que tem bases na sociedade.

Lula fará um governo sequestrado pelo congresso, poder judiciário, tutela militar, mercado e mídias corporativa. A grande imprensa fará um jornalismo de guerra, contra o futuro governo.

Mesmo fazendo um governo moderado, Lula enfrentará uma resistência irracional dos camisas amarelas. O governo será sabotado!

A força de Lula é o seu prestígio internacional. As tarefas são o cumprimento imediato das promessas da campanha, o desarmamento das milícias e a desbolsonarização das instituições, sobretudo das forças de segurança.

Não se governa com o cutelo no pescoço.

Não existe acordo possível. O Brasil continuará dividido. A divergência principal ficou clara nessas manifestações: é entre democracia ou ditadura! Mesmo sendo uma democracia tutelada, desigual, limitada, não podemos aceitar a violência com forma de convivência.

Esses “patriotas” são os chamados “cidadãos de bem” que saíram do armário, é a antiga maioria silenciosa, que não aceitam a inclusão social. Eles acreditam que lutam pelo Brasil.

O paradigma dos patriotas é de alguém que pode morrer ou matar por suas crenças. O exemplo do meme do patriota abraçado ao para-brisa do caminhão é perfeita. Estes “patriotas” não irão desaparecer com a vitória de Lula.

A reivindicação de golpe pode ou não ser atendida agora. Os militares estão avaliando a viabilidade. Independente, a militância negacionista continuará, com novas pautas.

Concordo com a carta aberta de Boaventura de Souza Santos: o principal objetivo da extrema direita no Brasil é impedir que o Presidente Lula termine pacificamente o seu mandato.

Antonio Samarone (médico sanitarista)

segunda-feira, 14 de novembro de 2022

UMA CONVERSA INDIGESTA

 Uma conversa indigesta.
(por Antonio Samarone)

O Brasil envelhece rapidamente. Entre as consequências, a demência, isto é, a perda da memória, é a mais relevante. Em casos avançados, esquecemos quem somos, ou seja, a gente não se reconhece.

Entenderam? A gente experimenta a morte ainda em vida.

Não estamos preparados para o envelhecimento, a família não sabe cuidar dos seus dementes e o Sistema de Saúde não oferece cuidados para os velhos. O Brasil não reconhece o problema, não está em pauta.

Mesmo sem relação social, sem fala, sem vontades, sem reconhecimento, o carinho da família e dos cuidadores ainda é percebido. O afeto, o carinho, o respeito consola a alma, reduz o sofrimento, alivia a existência. A medicina apenas alivia os sofrimentos físicos, geralmente com efeitos colaterais.

O demente é o que se chamava antigamente de esclerosado. Um grave problema de Saúde Pública, mas não está na pauta. O problema é estigmatizante, ninguém assume, nem a vítima, nem a família.

Mesmo sem doenças, o próprio envelhecimento reduz a nossa memória, apequenando a capacidade cognitiva. O Alzheimer, uma doença incurável e que não existe prevenção, é a causa mais frequente das demências.

O Alzheimer pode durar até vinte anos. As pessoas mais cultas, mais inteligentes, apenas demoram a perceber a doença. Os outros é quem percebe, com a tradicional sentença: fulano não é mais o mesmo, está irreconhecível. Você também deixa de reconhecer os íntimos: quem é?

Não é fácil reconhecer que estamos precisando de ajuda, encontrar quem vai cuidar da gente, decidir se vale a pena continuar vivendo. Quem vai nos representar quando perdermos a autonomia, quando virarmos uma samambaia.

Alimentação saudável e exercícios físicos servem para prevenir todos os riscos, de todos os males, não evita a demência, mas retarda. Seremos dementes saudáveis. Mesmo sem outras doenças, o Alzheimer atrofia o cérebro e torna a vida inviável. É a morte a longo prazo.

Ia esquecendo, a teimosia, a meditação, novos aprendizados ajudam no enfrentamento das demências. Antes que vocês perguntem, o que diabo é meditação? Simples, é ficar um tempo sem pensar, experimentando as sensações, deixando a mente desocupada, para o descanso do cérebro.

Claro, se a gente mantém o cérebro em atividade, experimentando novos aprendizados (participar de um coral, aprender música, línguas estrangeiras, escovar os dentes com a mão esquerda, andar para trás), retarda as demências. Não impede, mas empurra com a barriga.

Participo de uma confraria que se reúne semanalmente, onde se pode contar a mesma historia varias vezes, nem você se lembra que já contou, nem outros se lembram que já ouviram. A reunião é um exercício para a memória.

A depressão, frequente na velhice, geralmente por crise existencial, apressa as demências. A gente descobre que os nossos sonhos não aconteceram e que o tempo está acabando. A passividade domina a vida. Reaja, vamos procurar fazer coisas novas. Mesmo tarefas prosaicas: um amigo está cuidando dos gatos de rua.

Sei que essa conversa incomoda muita gente, que prefere não abordar esses assuntos. Lamento, não podemos jogar os problemas embaixo do tapete.

“Se você não concordar, não posso me desculpar, não canto para enganar, vou pegar a minha viola e vou tocar em outro lugar.” – Vandré.

Antonio Samarone (médico sanitarista)

UMA CONVERSA INDIGESTA


Uma conversa indigesta.
(por Antonio Samarone)

O Brasil envelhece rapidamente. Entre as consequências, a demência, isto é, a perda da memória, é a mais relevante. Em casos avançados, esquecemos quem somos, ou seja, a gente não se reconhece.

Entenderam? A gente experimenta a morte ainda em vida.

Não estamos preparados para o envelhecimento, a família não sabe cuidar dos seus dementes e o Sistema de Saúde não oferece cuidados para os velhos. O Brasil não reconhece o problema, não está em pauta.

Mesmo sem relação social, sem fala, sem vontades, sem reconhecimento, o carinho da família e dos cuidadores ainda é percebido. O afeto, o carinho, o respeito consola a alma, reduz o sofrimento, alivia a existência. A medicina apenas alivia os sofrimentos físicos, geralmente com efeitos colaterais.

O demente é o que se chamava antigamente de esclerosado. Um grave problema de Saúde Pública, mas não está na pauta. O problema é estigmatizante, ninguém assume, nem a vítima, nem a família.

Mesmo sem doenças, o próprio envelhecimento reduz a nossa memória, apequenando a capacidade cognitiva. O Alzheimer, uma doença incurável e que não existe prevenção, é a causa mais frequente das demências.

O Alzheimer pode durar até vinte anos. As pessoas mais cultas, mais inteligentes, apenas demoram a perceber a doença. Os outros é quem percebe, com a tradicional sentença: fulano não é mais o mesmo, está irreconhecível. Você também deixa de reconhecer os íntimos: quem é?

Não é fácil reconhecer que estamos precisando de ajuda, encontrar quem vai cuidar da gente, decidir se vale a pena continuar vivendo. Quem vai nos representar quando perdermos a autonomia, quando virarmos uma samambaia.

Alimentação saudável e exercícios físicos servem para prevenir todos os riscos, de todos os males, não evita a demência, mas retarda. Seremos dementes saudáveis. Mesmo sem outras doenças, o Alzheimer atrofia o cérebro e torna a vida inviável. É a morte a longo prazo.

Ia esquecendo, a teimosia, a meditação, novos aprendizados ajudam no enfrentamento das demências. Antes que vocês perguntem, o que diabo é meditação? Simples, é ficar um tempo sem pensar, experimentando as sensações, deixando a mente desocupada, para o descanso do cérebro.

Claro, se a gente mantém o cérebro em atividade, experimentando novos aprendizados (participar de um coral, aprender música, línguas estrangeiras, escovar os dentes com a mão esquerda, andar para trás), retarda as demências. Não impede, mas empurra com a barriga.

Participo de uma confraria que se reúne semanalmente, onde se pode contar a mesma historia varias vezes, nem você se lembra que já contou, nem outros se lembram que já ouviram. A reunião é um exercício para a memória.

A depressão, frequente na velhice, geralmente por crise existencial, apressa as demências. A gente descobre que os nossos sonhos não aconteceram e que o tempo está acabando. A passividade domina a vida. Reaja, vamos procurar fazer coisas novas. Mesmo tarefas prosaicas: um amigo está cuidando dos gatos de rua.

Sei que essa conversa incomoda muita gente, que prefere não abordar esses assuntos. Lamento, não podemos jogar os problemas embaixo do tapete.

“Se você não concordar, não posso me desculpar, não canto para enganar, vou pegar a minha viola e vou tocar em outro lugar.” – Vandré.

Antonio Samarone (médico sanitarista)

GENTE SERGIPANA - MOZART FONSECA


 Mozart Fonseca de Oliveira (94 anos) – Gente Sergipana.
(Por Antonio Samarone)

Mozart é um Itabaianense de quatro costado, filho do rábula Antonio Agostinho e sobrinho de João Pereira, único ceboleiro que alcançou o generalato no Exército brasileiro.

Casado com Lourdes Oliveira, minha professora de desenho no Murilo Braga. Tínhamos aulas de música e desenho no Ginásio. Não aprendi por desleixo, más as professoras eram competentes.

Seu Mozart foi um comerciante bem-sucedido nos ramos de padaria e autopeças. Ele sucedeu a Aurelino Paes Mendonça na padaria e depois vendeu a Heleno Bacalhau. Seu Mozart apresentou um programa cultural na rádio Princesa da Serra, por muitos anos.

Mozart Fonseca um homem polido, culto e portador da virtude da paciência.

Mozart Fonseca foi o eterno Presidente da Associação Olímpica de Itabaiana nos tempos de glória, na época do penta campeonato. Zé Queiroz e Mozart Fonseca comandavam o tricolor as serra, nos anos de vitórias.

Seu Mozart é um fidalgo, um gentleman, coisa rara em Itabaiana, uma terra de rústicos e gente cascuda.

Ontem, Seu Mozart compareceu à reunião da Confraria de Itabaiana. Memória perfeita, bom humor, uma presença que nos envaidece.

Antonio Samarone (médico sanitarista)

QUE A TERRA LHE SEJA LEVE

 Que a terra lhe seja leve!
(Antonio Samarone)

A velhice chegou para o professor Antunes. Não adiantou esconder a idade, pintar os cabelos, fazer plásticas, comida natural, Yoga, meditação, não sair das academias, se achar com o “espírito Jovem”.

O choque foi grande, Antunes não se preparou para a morte e ela bateu a sua porta sem anunciar. O espelho começou mostra-lhe as rugas, pelancas e olhos fundos. Uma dor chata nas costas, tosse e expectoração sanguinolenta.

Procurou um amigo médico, colega da noite, e a suspeita foi terrível: “Antunes, tudo indica que o seu caso é grave, procure um oncologista.” E não deu outra, a biopsia constatou: câncer de pulmão.

Antunes desabou emocionalmente. Sempre soube que se morria, mas nunca suspeitou que fosse com ele. Não gostava nem de tocar nesse assunto.

Antunes sonhava em morrer de repente, para não sofrer e nem dar trabalho aos outros. Ocorre que somente 10% dos humanos recebem essa dádiva. Os 90% restante, morrem sofrendo e dando trabalho, muito trabalho.

O professor Antunes ensinava matemática na rede pública. Nunca casou, envelheceu borboletão. Não foi o que você pensou, Antunes gostava de gente, sua relação de amigos, ex alunos, colegas de profissão era numerosa.

Antunes só não era chegado aos parentes, gente pobre, que ele antevia apenas interesses e falsidades. Queriam se aproveitar da sua boa vida, apartamento pago, nome limpo na praça. Acho até que tinha um carrinho de passeio.

Antunes morava no Augusto Franco, um bairro perto de tudo e cheio de atrativos sociais. Eu conheci o professor Antunes no bar de Zé Buraqueiro, na feira do Augusto Franco. Torcedor do Confiança e do Vasco.

Antunes pertencia a legião dos festeiros superficiais, um homem de baladas. A farra não precisa de motivação, basta o tempo livre. Sempre seguiu atrás de qualquer trio elétrico.

Antunes não sabia que morrer no Brasil era um castigo duplo. A assistência aos pacientes terminais é uma das piores do mundo, agrava os sofrimentos. Mesmo o que sujeito tenha como comprar os serviços, eles não são bons.

A fralda aproxima os destinos entre ricos e pobres.

O maior sofrimento de Antunes foram os 97 dias agonizando, sofrendo, sem esperança, só esperando a hora. Antunes foi internado para morrer num hospital mais ou menos. Com prestigio e apadrinhamento, conseguiu um leito pago pelo IPES.

Entretanto, sem minimizar o sofrimento físico, o emocional foi maior: Antunes não recebeu nenhuma visita nos 97 dias de martírio, ninguém teve tempo de visitá-lo. Nem mesmos aqueles chatos, que vão visitar só para sair alarmando que o acamado está mau, sair dizendo o fulano morre a qualquer hora.

Antunes, por coincidência, morreu no sábado do Pré-Caju.

Antunes não recebeu um padre, um pastor, uma freira, parentes (esses ele não queria), amigos, nada! Antunes morreu só, dando muito trabalho e não recebendo os cuidados merecidos por qualquer cristão.

Visitar os doentes é uma obrigação cristã esquecida, quase em desuso! Só os moribundos importantes conseguem essa graça. Parece que a Pandemia afastou as visitas.

No velório até que apareceu gente, mas de nada adiantava. Os comentários eram unânimes: morreu tão jovem! Na verdade, Antunes parecia jovem, mas já se aproximava dos 70 anos. Não se soube de nenhuma lágrima, não foi pranteado.

Antunes foi sepultado no São João Batista, numa tarde calorenta. Quando o coveiro fechou a sepultura, com a massa do cimento ainda mole, perguntou o nome completo do defunto para registrar, ninguém sabia ao certo, uns diziam que era Antunes Santos outros que era Antunes Souza.

Na dúvida, ficou registrado: “aqui jaz professor Antunes.”

Antonio Samarone. (médico sanitarista)

GENTE SERGIPANA - GUSTINHO

Gente Sergipana – Gustinho
(por Antonio Samarone)

No inicio da década de 1960, Gustinho, Tavinho e Chupeta engraxavam sapatos no canteiro defronte a Prefeitura de Itabaiana. Meninos pobres e travessos, que tinham em comum o talento para o futebol.

Gustinho, José Augusto Bispo dos Santos, tinha o futebol no DNA. Sobrinho de dois craques consagrados, Debinha e Evangelista. Apenas Gustinho, fez carreira bem sucedida no futebol.

O pai de Gustinho, Joãozinho Baú, era um mestre sapateiro, especialista em bolas de futebol e chuteiras. Antes das chuteiras Olé, o chique era calçar uma chuteira da lavra de Joãozinho Baú.

Gustinho nasceu em Itabaiana, em 09 de março de 1949.

Gustinho foi um artista da bola. Nunca frequentou escolinhas, nasceu sabendo. Aperfeiçoou nas peladas de rua. Foi titular do meio de campo do Itabaiana por mais de 20 anos, tem parte na glória do futebol itabaianense.

Gustinho, Zequinha e Bené formaram o melhor meio de campo da historia do futebol sergipano. Tudo bem, concordo que Ailton, Zé Pequeno e Naninho disputam essa mesma glória.

Além de boleiro, Gustinho é um grandes contador de histórias. Dos que eu alcancei em Itabaiana, Gustinho, Fred de Etelvino e Terêncio de Vieira Lima foram os campeões das resenhas, dos causos, das piadas, das gozações, das ironias, sarcasmos e irreverências. São formadores da cultura itabaianense.

Gustinho é um grande “showmen”!

Onde Gustinho senta, logo junta gente para ouvi-lo. Ele é a memória humorística da comunidade. Sabe contar causos, imita vozes, gestos e chistes. Gustinho é um mestre em narrativas orais, na cultura falada.

Por sorte, recentemente encontrei-o em Itabaiana e parei para ouvi-lo. Rapidinho, recordei histórias antigas e ouvi novas. Ele continua criativo e engraçado.

Minha homenagem ao talentoso Gustinho, um poeta da bola e um craque da prosa.

Antonio Samarone. (médico sanitarista)
 

CEM ANOS DA MARCHA SOBRE ROMA

 Cem anos da marcha sobre Roma.
(por Antonio Samarone)

Só os profetas enxergam o óbvio.

A extrema direita não aceitou o resultado das urnas e está disposta a impor a sua vontade política por outros caminhos. Para eles, as instituições perderam a credibilidade. O STF é visto como tendencioso.

Por mais que a grande imprensa omita, trata-se de uma manifestação de massas pelo fim da democracia. A esquerda liberal finge que nada está acontecendo.

Assistimos a uma demonstração de forças da extrema direita. Os camisas amarelas estão em marchar contra a democracia.

Eles acreditam que somente um ordem autoritária pode salvar o Brasil. Foram bater as portas dos quartéis. Pedir, sem pudor, uma ditadura.

Um dilema fascista é eleições ou violência. A derrota eleitoral deixou a violência como única alternativa. Eles não estão pedindo novas eleições, simplesmente querem que os militares assumam.

Sem ilusões, o fascismo está em marcha no Brasil.

Não significa que terão sucesso imediato, mas continuarão na luta pelo fim da democracia, agora sem subterfúgios, querem uma ditadura.

A análise liberal entende a ameaça fascista como uma falha moral dos indivíduos, ou falha disso ou daquilo. Na verdade, a causa do fascismo é econômica, constitui-se numa alternativa do capitalismo.

O fascismo não é somente uma anomalia moral, ele é parte do jogo de mercado.

Não existe incompatibilidade entre inteligência, cultura e polidez com o fascismo. O fascismo não anda sempre de coturno.

Nos últimos cem anos, a ascensão fascista nunca foi contida institucionalmente. Sem resistência, o fascismo se impõe. Mesmo que Bolsonaro não possua talento para liderar o golpe, outro aventureiro surgirá. O ovo da serpente está sendo chocado.

Um líder menos tosco, sem palavrões, empreendedor, pode assumir a liderança da extrema direita com mais força. Por exemplo, o governador eleito de São Paulo.

O bolsanarismo pode ser mais forte sem Bolsonaro.

A classe política é um tumor a ser extirpado. Nos grupos de WhatsApp de direita, o discurso anti política retornou, como sendo um deformidade. A saída política para o Brasil saiu de pauta, eles esperam um salvador da pátria.

Quem tentar construir uma narrativa política será tachado de politiqueiro. Fora a política, é o brado pós derrota eleitoral.

A crença liberal na possibilidade de convivência pacifica com o fascismo é irreal. O Estado fascista não tolera os adversários, ele os combate e os destrói.

Não se combate o fascismo com “picanha para todos”. O futuro governo Lula navegará por mares tormentosos. A classe operária não está indo ao paraíso.

A esquerda liberal, respeitadora da ordem, receosa em perder regalias, não está preparada para resistir ao avanço do fascismo.

Nos resta, “Os Gaviões da Fiel”!

Antonio Samarone. (médico sanitarista)

domingo, 6 de novembro de 2022

A ENFERMAGFEM EM SERGIPE


 A Enfermagem em Sergipe.
(por Antonio Samarone)

A medicina científica chegou a Sergipe pelas mãos de Augusto Leite, após a criação do Hospital de Cirurgia. Enfrentou dificuldades para encontrar um pessoal de enfermagem capacitado.

Desde o inicio do funcionamento do Hospital de Cirurgia (02/05/1926), uma das grandes preocupações do Doutor Augusto Leite foi na qualificação dos profissionais da Enfermagem. O que fazer? Naquele momento não existia ainda em Sergipe “Enfermeiras” (registered nurse), só o pessoal prático. Dr. Augusto optou pelo razoável naquelas circunstâncias, entregou o serviço às “Irmãs de Caridade”.

No século XIX, as Santas Casas de Misericórdia contratavam religiosas, as irmãs de caridade, para a direção dos serviços hospitalares e também para os serviços de enfermagem. Eram auxiliadas por enfermeiros leigos.

Não havia enfermeiros instruídos e habilitados em Sergipe, no início do século XX.

Florence Nightingale ("the Angel of the Crimea"), lançou as bases dos modernos serviços de enfermagem. Já em 1860, Florence fundará a Nithghtingale School for Nurses.

No Brasil, por ocasião da Guerra do Paraguai (1864-70), Ana Justina Ferreira Néri uma mulher nordestina, viúva, incorporou-se no exército brasileiro como enfermeira, para acompanhar os filhos.

Ana Néri é a patrona das enfermeiras brasileiras.

Os serviços de enfermagem do Hospital de Cirurgia foram entregues as “Irmãs Missionárias da Imaculada Conceição”. Úrsula, Bernadina, Beralda, Theodata, Jolenta, Inocência, Amália e Clara foram de grande competência e operosidade. Essas religiosas alemãs, com o estimulo do Dr. Augusto Leite, criaram a primeira escola de auxiliares de enfermagem de Sergipe.

Catarina de Fischer (Irmã Jolenta), nasceu a 19 de abril de 1899 em Westfalen, na Alemanha. Filha de Elizabeth Fischer e Caspar Fischer. Em 1926 chegou ao Brasil, para morar em regime de internato no Hospital de Cirurgia. Aqui já se encontrava a Irmã Clara. Com a idade, passou a residir no Hospital São José, junto com as Irmãs Concepcionistas, irmandade a que pertenceu. Faleceu ao 90 anos, em 09 de julho de 1989, em Aracaju.

No Hospital Santa Isabel as Irmãs de Caridade também realizavam as funções de enfermeiras. Serafina Guinard (Irmã Santa Juliana), filha de Joan Batista Guinard e Melaine Lamberton Guinard, nasceu em Saint Roman, na França. Tornou-se freira em 25 de janeiro de 1873. Em 1904 veio para o Brasil, chegando em Sergipe 09 de janeiro de 1905, indo realizar seu trabalho religioso e de enfermagem no Hospital Santa Isabel, permanecendo até a sua morte em 02 de agosto de 1937.

A situação dos serviços de enfermagem em Sergipe, por volta da década de 1920, foi bem relatado pelo prático José Ribeiro do Bonfim, (“enfermeiro treinado por Augusto Leite), num livro de reminiscências:

“O enfermeiro de então era, além disso, também condutor de ambulância, cavador de sepulturas e sepultador dos cadáveres do hospital. Não havia trabalho que o enfermeiro não estivesse presente. Tinha que estar à frente das baldeações das enfermeiras (Irmãs de Caridade), ao lado da Irmã Joana que, trepada nuns tamancos, de hábito arregaçado e empunhando uma vassoura, esfregava um assoalho que não havia força humana que o fizesse alvejar”.

Entre as primeiras enfermeiras diplomadas atuando em Sergipe, destaco: Opelina Rollemberg, Acaciamaria da Conceição Oliveira, Valquíria Ferreira de Oliveira, Georgina Ferreira de Oliveira, Carmem de Aguiar Novaes, Maria Edna Silva, Maria Almira de Menezes e Gueisha Albuquerque Silva.

Antonio Samarone (médico sanitarista)

sábado, 5 de novembro de 2022

AJOELHOU TEM QUE REZAR


 Ajoelhou tem que rezar.
(por Antonio Samarone)

Sou Antonio por promessa de mamãe. Se o primeiro filho fosse homem e nascesse saudável, ela colocaria o nome de Santo Antonio e faria a primeira comunhão no dia que ele completasse sete anos.

Dito e feito: 15 de dezembro de 1961, caiu numa sexta-feira. As sete da manhã estava eu perfilado, de roupa branca, para receber o corpo de Cristo.

O drama foi a confissão. O que dizer? Quais eram mesmo os meus pecados? E se eu falasse bobagem, dissesse coisas que não fossem considerados pecados e o padre me desse uma xinga.

Mamãe me treinou antes: conte isso, isso, isso e aquilo. A bronca é que com o nervoso, eu esqueci. Não disse nada. Não abri a boca. No final, o padre me benzeu e disse: ide em paz, os seus pecados estão perdoados.

Nunca contei isso, tinha medo de ser considerado bobinho para a idade. Sete anos, não são sete dias, e não saber contar os pecados.

Eu não sabia!

Eu me pelava de medo do confessionário. Daquele biombo sagrado, sombrio, fechado com uma cortina de renda, daquele quadrado quadriculado ao lado do ouvido do padre. Não via direito o padre, era na penumbra e ele com uma batina preta. Se ele cochilasse ninguém sabia.

Esse trauma perdurou por mais seis ou sete confissões, até a entrada em vigor das resoluções liberalizantes do Vaticano II. Eu era travado para as confissões.

Ontem visitei a catedral de Estância e me lembrei da primeira comunhão, ao passar por esse confessionário da foto.

O confessionário era o centro da igreja tridentina. O padre controlava o rebanho pela confissão. O Concilio Vaticano II inventou a confissão coletiva, ou melhor, a auto confissão.

Os confessionários estão vazios, não assustam mais. Não são mais necessários, hoje contamos tudo alegremente, pelas redes sociais.

Antonio Samarone (médico sanitarista)

NEM FREUD EXPLICA

 Nem Freud explica.
(por Antonio Samarone)

Um grupo de pessoas que não aceitou a vitória de Lula, resolveu reagir. Aqui em Aracaju, acamparam em frente ao quartel do 28 BC, à espera de um comando dos militares. Eles clamam por um golpe. Aqui, o irreal sempre tem precedência ao real.

As massas são influenciáveis e crédulas, intolerantes, agem dentro da lógica afetiva e com uma capacidade intelectual limitada. Mesmo pessoas razoáveis, regridem, quando envolvidas pela alma das multidões.

Nas massas, desaparecem as singularidades. Os indivíduos sentem-se invencíveis, o que lhes permitem entregar-se aos instintos. Sentem-se no anonimato, desaparece o sentimento de responsabilidade.

O indivíduo pertencente a uma massa psicológica, se comporta e pensa diferente, acompanha o coletivo, se torna irreconhecível. Torna-se capaz de grandes vilanias e grandes sacrifícios.

Basta lembrarmos o suicídio em massa dos membros da seita de Jim Jones. Mais de 900 seguidores da seita Templo do Povo tomaram veneno, a mando do reverendo Jim Jones.

“O fato de pertencer a uma massa organizada, o ser humano desce vários degraus na escala da civilização. Em seu isolamento era talvez um indivíduo culto; na massa, é um bárbaro, um ser instintivo. Possui a espontaneidade, a violência, a ferocidade, o entusiasmo e o heroísmo dos seres primitivos” – Le Bon

Na frente do 28 BC ocorreram fatos inusitados. Um sergipano poderoso, podre de rico, experiente, frio, sempre pragmático, estava lá, ingenuamente clamando pelo golpe. Perdeu o senso crítico no meio da massa.

Eu sabia, mas nunca tinha visto o fenômeno de perto.

Nada se pode demovê-los desses delírios. Alguns marcham em ordem unida, prestam continência, se ajoelham e rezam, cantam o hino nacional, falam coisas sem nexo e em línguas estranhas. Estão lá na certeza de que a qualquer momento rufarão os tambores anunciando o fim da democracia.

Somos um país estranho...

Na visão freudiana, trata-se de um delírio coletivo, com consequências imprevisíveis. Muitos, quando saírem do transe, não se lembrarão do que fizeram. O apagamento mental é frequente nesses casos. Ninguém será punido! É o Brasil.

“Na multidão, todo sentimento, todo ato são contagiosos, e isso em grau tão elevado que o indivíduo muito facilmente sacrifica seu interesse pessoal ao interesse coletivo.” - Freud

Um colega da época da faculdade, fechou o consultório, aparou o barba, fez aquele bigodinho de Hitler e está há 72 horas defronte ao 28 BC. Não arreda pé! Faz a saudação romana até na padaria. Tem mais armas armazenadas em um sítio no Mosqueiro, que Roberto Jefferson tinha no apartamento, com destaque para uma submetralhadora israelense, comprada em Itabaiana.

Em seu apartamento, o meu colega de universidade possui uma foto emoldurada dos Romanov, fuzilados pelos Bolcheviques. Ele sente náuseas quando ouve a palavra comunismo e acredita que Lula, Joe Biden e Emmanuel Macron são vermelhos. De Alckmin, ele desconfia.

Sou amigo do mal-assombrado acima. A família me pediu para não o citar nominalmente. Não o farei. Antes, desse fanatismo bolsonarista, desse surto, eu nunca tinha identificado nele nenhuma anomalia relevante. Os criminosos nazistas, segundo Hannah Arendt, eram sujeitos comuns.

Eu sei, isso vai passar. No Brasil, até o fascismo tem ares carnavalescos. O líder deles não se leva a sério.

Antonio Samarone. (médico sanitarista)

O DESCOBRIMENTO DE SERGIPE

 O descobrimento de Sergipe.
(Por Antonio Samarone)

Zarpou do Tejo, em maio de 1501, uma frota de caravelas para o reconhecimento da Terra de Vera Cruz, descobertas por Cabral. A expedição oficial de 1501, que descobriu Sergipe, foi comandada por Afonso Gonçalves. Os navios pertenciam ao Rei.

Américo Vespúcio embarcou nessa expedição como o cosmógrafo e cronista.

A expedição de 1501, pouco conhecida entre os historiadores sergipanos, explodiu no Velho Mundo, por conta da divulgação das cartas impressas pelo Florentino Américo Vespúcio – Mundus Novus e a Lettera. Na primeira (1503), dirigida a Lorenzo di Pier Francesco dei Medicis, ele descreveu a expedição de 1501.

A primeira carta de Américo Vespúcio, Mundus Novus, foi editada em Paris, no ano de 1503. A Terra imensa e a sua gente, descritas por Vespúcio, não eram outras senão o Brasil e as suas tribos nativas.

Américo Vespúcio deu nome a América, por suas cartas. Por que a homenagem não foi a Caminha, que escreveu antes? A carta de Caminha não teve repercussão à época, por só ter sido conhecida em 1817, por Ayres do Cazal. A carta ficou 300 anos perdida nos arquivos de Lisboa.

Ao longo da Costa brasileira, a expedição de 1501 efetuou inúmeras escalas, reconhecendo portos, cabos, baias, ilhas, montes e rios.

O que nos conta Américo Vespúcio sobre o descobrimento de Sergipe:

Navegaram dois meses e três dias sem ver terra, e a 7 de agosto de 1501, lançaram ancoras na costa brasileira. 64 dias da saída de Bezeguiche. Chegaram na Praia dos Marcos, no Rio Grande do Norte.

A Expedição de 1501 chegou ao Rio São Francisco (o Parapitinga dos índios) em 04 de outubro de 1501, por isso o nome. Estava descoberto Sergipe, por Américo Vespúcio. Acho que a data deveria ser festejada.

Como uma nova geração vai governar Sergipe a partir de janeiro de 2023, sugiro um monumento ao nosso descobridor Américo Vespúcio, onde acharem mais adequado.

Em Sergipe, a expedição de reconhecimento demorou 17 dias. A descoberta de Sergipe é anterior a da Baia de todos os Santos. A frota de Cabral, passou apenas 8 dias em Porto Seguro, zarpando para as Índias, em 1º de maio de 1500. Descobriram apenas a Ilha de Vera Cruz, da carta de Caminha. Não se conhecia o restante do Brasil.

A descrição que o São Francisco em sua foz avança mar adentro, está nas cartas de Vespúcio. Depois virou um verso famoso de Luiz Gonzaga: “Riacho do Navio corre para o Pajeú, o Rio Pajeú vai se bater no São Francisco, e o São Francisco vai bater no meio do mar.”

Só chegaram à Baia de Todos os Santos em 01 de novembro. Por isso o nome.

Entre o São Francisco e Pirambu, a expedição enfrentou a força das águas, e no sacolejo, os barris começaram a vazar, por isso a marujada denominou de enseada do Vaza Barris (Vaz’a baril).

A denominação estendeu-se ao Rio Irapiranga ou Rio da Canafistula, ou Rio Cássia, que desagua após o Rio Cotinguiba (atual Rio Sergipe), tornando-se o atual Rio Vaza Barris. Isso mesmo, o rio que nasce nas serras do Uauá, onde em suas margens, Antonio Conselheiro construiu Canudos.

Vespúcio relatou a descoberta do rio do Pereira, que deve ser o Codindiba (Cotinguiba), que se junta ao Rio Cerigi e desagua no oceano. Conta que avistaram a oito ou dez léguas uma montanha notável, denominada Serra de Santa Maria da Gracia, a famosa Serra de Itabaiana.

Os navios de Vespúcio saíram de Sergipe carregados de vagens medicinais da canafístulas, das proximidades da Ilha Mem de Sá, em Itaporanga, onde a planta ainda é abundante.

Em 21 de outubro de 1501, a expedição chegou na divisa com a Bahia e avistaram o Rio Real, que recebeu esse nome em homenagem a Dom Manuel. O Rei era o aniversariante no dia.

Na Baia de Todos os Santos a expedição chegou a 1º de novembro (por isso o nome) e permaneceu por 27 dias, onde puderam observar o modo de vida dos Tupinambás, que assenhoreavam aquela costa até o Rio São Francisco.

A expedição de 1501 efetuou escala em 42 lugares da costa brasileira, encerrando a viagem em fevereiro de 1502, na Lagoa dos Patos, no Rio Grande do Sul.

Alguns historiadores estendem essa viagem até a Patagônia, atribuindo a Vespúcio o descobrimento do Uruguai, da Argentina e até das ilhas Malvinas.

Falta a Sergipe a autoestima para valorizar os fatos históricos que lhes engrandecem. Quem quiser saber mais detalhes dessa expedição e do descobrimento de Sergipe, o historiador alagoano Moacyr Soares Pereira, aprofunda os estudos em seu livro: “A navegação de 1501 ao Brasil e Américo Vespúcio.”

Antonio Samarone (médico sanitarista)

quinta-feira, 3 de novembro de 2022

O DESCOBRIMENTO DE SERGIPE

 O descobrimento de Sergipe.
(Por Antonio Samarone)

Zarpou do Tejo, em maio de 1501, uma frota de caravelas para o reconhecimento da Terra de Vera Cruz, descobertas por Cabral. A expedição oficial de 1501, que descobriu Sergipe, foi comandada por Afonso Gonçalves. Os navios pertenciam ao Rei.

Américo Vespúcio embarcou nessa expedição como o cosmógrafo e cronista.

A expedição de 1501, pouco conhecida entre os historiadores sergipanos, explodiu no Velho Mundo, por conta da divulgação das cartas impressas pelo Florentino Américo Vespúcio – Mundus Novus e a Lettera. Na primeira (1503), dirigida a Lorenzo di Pier Francesco dei Medicis, ele descreveu a expedição de 1501.

A primeira carta de Américo Vespúcio, Mundus Novus, foi editada em Paris, no ano de 1503. A Terra imensa e a sua gente, descritas por Vespúcio, não eram outras senão o Brasil e as suas tribos nativas.

Américo Vespúcio deu nome a América, por suas cartas. Por que a homenagem não foi a Caminha, que escreveu antes? A carta de Caminha não teve repercussão à época, por só ter sido conhecida em 1817, por Ayres do Cazal. A carta ficou 300 anos perdida nos arquivos de Lisboa.

Ao longo da Costa brasileira, a expedição de 1501 efetuou inúmeras escalas, reconhecendo portos, cabos, baias, ilhas, montes e rios.

O que nos conta Américo Vespúcio sobre o descobrimento de Sergipe:

Navegaram dois meses e três dias sem ver terra, e a 7 de agosto de 1501, lançaram ancoras na costa brasileira. 64 dias da saída de Bezeguiche. Chegaram na Praia dos Marcos, no Rio Grande do Norte.

A Expedição de 1501 chegou ao Rio São Francisco (o Parapitinga dos índios) em 04 de outubro de 1501, por isso o nome. Estava descoberto Sergipe, por Américo Vespúcio. Acho que a data deveria ser festejada.

Como uma nova geração vai governar Sergipe a partir de janeiro de 2023, sugiro um monumento ao nosso descobridor Américo Vespúcio, onde acharem mais adequado.

Em Sergipe, a expedição de reconhecimento demorou 17 dias. A descoberta de Sergipe é anterior a da Baia de todos os Santos. A frota de Cabral, passou apenas 8 dias em Porto Seguro, zarpando para as Índias, em 1º de maio de 1500. Descobriram apenas a Ilha de Vera Cruz, da carta de Caminha. Não se conhecia o restante do Brasil.

A descrição que o São Francisco em sua foz avança mar adentro, está nas cartas de Vespúcio. Depois virou um verso famoso de Luiz Gonzaga: “Riacho do Navio corre para o Pajeú, o Rio Pajeú vai se bater no São Francisco, e o São Francisco vai bater no meio do mar.”

Só chegaram à Baia de Todos os Santos em 01 de novembro. Por isso o nome.

Entre o São Francisco e Pirambu, a expedição enfrentou a força das águas, e no sacolejo, os barris começaram a vazar, por isso a marujada denominou de enseada do Vaza Barris (Vaz’a baril).

A denominação estendeu-se ao Rio Irapiranga ou Rio da Canafistula, ou Rio Cássia, que desagua após o Rio Cotinguiba (atual Rio Sergipe), tornando-se o atual Rio Vaza Barris. Isso mesmo, o rio que nasce nas serras do Uauá, onde em suas margens, Antonio Conselheiro construiu Canudos.

Vespúcio relatou a descoberta do rio do Pereira, que deve ser o Codindiba (Cotinguiba), que se junta ao Rio Cerigi e desagua no oceano. Conta que avistaram a oito ou dez léguas uma montanha notável, denominada Serra de Santa Maria da Gracia, a famosa Serra de Itabaiana.

Os navios de Vespúcio saíram de Sergipe carregados de vagens medicinais da canafístulas, das proximidades da Ilha Mem de Sá, em Itaporanga, onde a planta ainda é abundante.

Em 21 de outubro de 1501, a expedição chegou na divisa com a Bahia e avistaram o Rio Real, que recebeu esse nome em homenagem a Dom Manuel. O Rei era o aniversariante no dia.

Na Baia de Todos os Santos a expedição chegou a 1º de novembro (por isso o nome) e permaneceu por 27 dias, onde puderam observar o modo de vida dos Tupinambás, que assenhoreavam aquela costa até o Rio São Francisco.

A expedição de 1501 efetuou escala em 42 lugares da costa brasileira, encerrando a viagem em fevereiro de 1502, na Lagoa dos Patos, no Rio Grande do Sul.

Alguns historiadores estendem essa viagem até a Patagônia, atribuindo a Vespúcio o descobrimento do Uruguai, da Argentina e até das ilhas Malvinas.

Falta a Sergipe a autoestima para valorizar os fatos históricos que lhes engrandecem. Quem quiser saber mais detalhes dessa expedição e do descobrimento de Sergipe, o historiador alagoano Moacyr Soares Pereira, aprofunda os estudos em seu livro: “A navegação de 1501 ao Brasil e Américo Vespúcio.”

Antonio Samarone (médico sanitarista)

CARTAS DO EXILIO


 Cartas do exílio.
(Por Antonio Samarone)

Eu sou dos tempos das cartas.

Reabri o baú e encontrei um chumaço de cartas antigas, que enviava para mamãe, quando estava estudando no Sul maravilha.

Transcrevo uma delas:

“Alô Mamãe...

Pode ficar tranquila que eu sei o que estou fazendo. A minha participação política na luta junto com os oprimidos é a coisa mais importante de minha vida. A senhora que acredita tanto em Jesus Cristo, não esqueça a vida dele.

Nesse fim de semana que passou fui a São Paulo, passear e assistir a Festa dos Trabalhadores, no primeiro de maio. Foi muito bonito.

Eu entendo a preocupação da senhora e de papai. Geralmente as mães pensam que os filhos são crianças o tempo todo. Eu fico contente em saber que a senhora se preocupa comigo, mas acho que não tem necessidade, a senhora já tem muita coisa para se preocupar.

Como eu tinha acertado, estou mandando 20 (vinte mil cruzeiros), dez mil para a casa e dez mil para Antonio Carlos. Acho que a senhora vai receber o dinheiro antes da carta, porque José Augusto trabalha no Banco e avisa logo que o dinheiro chegar.

Quando receber o dinheiro mande dizer.

Eu queria saber como está a escola de Marquinhos, ele está ficando muito de castigo?

Acho que a senhora podia falar com a professora, como no tempo que a senhora não deixava a professora Helena de Branquinha me bater. Aquilo ainda hoje eu agradeço a senhora. Não é para ter vergonha, é ir lá, com jeito e educação, e falar com a professora. Fala para ela que se o menino for castigado atrasa a inteligência.

Quanto a minha ida a São Paulo, fique tranquila. É quase certo a minha volta para Sergipe. Mas com a política, nunca deixarei de mexer.

Por aqui tudo bem, estou com muita saúde e muita disposição para estudar.

Despeço-me mandando um abração para todos aí em Casa.

Rio de Janeiro, 04 de maio de 1982.”

Antonio Samarone. (médico sanitarista)

GENTE SERGIPANA - ANA CÔRTES


 Gente Sergipana - Ana Côrtes.
(por Antonio Samarone)

Na seção 590 da 2ª Zona do Aracaju, no Colégio Americano Batista, naquela urna, faltou um voto para Lula. Não foi um voto qualquer, foi o voto da combativa líder popular e intelectual Ana Côrtes (77 anos).

No dia 30 de outubro de 2022, domingo, Ana Côrtes saiu para votar acompanhada do esposo Bosco Rollemberg e do filho Marquinhos. Enfrentou a fila e na hora, nada! Ana não lembrou do treze (13). Tentou uma, duas, várias vezes. Não houve jeito, mesmo com a colinha na mão, treinando antes, Ana não lembrou e ninguém conseguiu lembrá-la.

A fila inteira, os mesários, os curiosos por perto, o seu anjo da guarda (Bosco), Marquinhos, todos torcendo: lembra Ana! É treze, treze de Lula, dos trabalhadores, dos oprimidos, treze da luta que você dedicou uma vida, sofreu, foi torturada.

Eu sei, Ana Côrtes sempre foi 65 (PC do B), mas é tudo a mesma coisa. 65 é 13X5, ou seja, 13 cinco vezes.

Ana Côrtes faz parte dos imprescindíveis - “Pero los hay que luchan toda la vida: esos son los imprescindibles”, do poema de Bertolt Brecht. Mas não lembrou do treze, não houve jeito. Faz parte da condição humana.

Estava ali uma líder destemida, consciente, lutadora, impedida de votar em Lula por uma limitação do corpo, do cérebro, da memória. As proteínas beta-amiloide e tau fosforilada apagaram o treze. É o que diz a medicina.

O povo nordestino votou por você, minha amiga Ana Côrtes.

Eu conheci Ana Côrtes no movimento sergipano pela anistia, nas lutas sociais, na gestão das políticas públicas da assistência social. Sempre ativa, fronte erguida, voz firme e coerente. Por onde você passava, Ana, uma energia de dignidade lhe acompanhava.

Ana Maria Santos Rollemberg Côrtes, nasceu em Frei Paulo, em 1945. Filha de Chiquinho do Sal e dona Caçula, numa família de dez irmãos. Casada com Bosco Rollemberg.

Ana Côrtes, foi presidente do Diretório Acadêmico da Faculdade de Serviço Social em 1967, graduou-se na Faculdade de Serviço Social em 1968.

Ana viveu na clandestinidade como operária metalúrgica em São Paulo e na zona canavieira de Pernambuco de 1969 a 1974; foi presa política no DOPS em Recife 1974.

Com a redemocratização em 1986, Ana dirigiu a Secretaria de Assistência Social com forte atuação nos bairros mais pobres. Já em 2001, foi coordenadora do programa “Toda Secretaria é da Criança”, da Prefeitura de Aracaju (PMA).

Ana Côrtes foi presidente do Sindicato das Assistentes Sociais, membro do Conselho Fiscal do Conselho Federal das Assistentes Sociais e Secretária de Assistência Social entre 1986 e 2002, na Prefeitura de Aracaju.

Ana, a sua história elegeu Lula, elegeu a democracia, elegeu a liberdade, elegeu a vida. Como diz a sua filha Joana, em um belo poema: Ana é uma mulher que sempre cuspiu fogo e querosene.

Antonio Samarone (médico sanitarista)

terça-feira, 1 de novembro de 2022

ANAUÊ

 Anauê!
(por Antonio Samarone)

Anauê significa em Tupi (você é meu), era a saudação dos integralistas no Brasil. Uma imitação da saudação romana dos fascistas.

Recebi de um colega médico pelo WhatsApp, um vídeo onde Roberto Jeferson cheio de ódio, prega o golpe. Eu sei, não se pode levar Roberto Jeferson a sério, logo agora, que o partido dele, o PTB, só elegeu um deputado federal. Isso mesmo, um! O Partido dele acabou pelo voto.

O grave é esse material asqueroso está sendo distribuído por gente normal, que se diz cristão e civilizado. Por um médico que se considera humanista.

O bolsonarismo não foi uma criação de Bolsonaro. A antiga maioria silenciosa, após as manifestações de 2013, assumiu a militância de extrema direita. Somos um país desigual, onde prevalece os privilégios. A herança escravocrata é forte.

O bolsonarismo elegeu uma bancada de 235 deputados do Centrão. Os esquemas do orçamento secreto funcionaram. Sem contar o perfil da maioria eleita para o Senado. Se facilitar, eles revogarão a Lei Áurea. A barbárie avançou!

A esquerda insiste no discurso de “união” das famílias brasileira. Não se faz história com ingenuidade.

Toda a esquerda (a federação do PT, PSOL, PDT e PSB) elegeu apenas 124 deputados federais. Lula ganhando, terá uma governabilidade precária e onerosa aos cofres públicos.

Para os otimistas: São Paulo elegeu Ricardo Sales, isso mesmo, o que pregou a passagem da boiada, com 640 mil votos; enquanto o doutor em filosofia, professor titular da USP, músico, escritor, Vladimir Safatle, recebeu apenas 17 mil votos.

Ontem, Bolsonaro recebeu o apoio dos governadores do Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais. Lula recebeu o apoio de Ciro Gomes, se é que podemos chamar aquilo de apoio.

“A política exige a coragem tacanha e malvada das brigas de rua... A política é a arena dos vícios, não das virtudes. A única virtude que exige é a paciência.” - Mussolini.

Outra coisa, a força política de Lula é pessoal, ele não transfere. Veja o resultado das eleições para governador, senador e deputado federal nos estados.

Eu sei, é preciso ser pessimista no pensamento e otimista nas ações. Isso é frase feita! Antes Lula era acusado de comunista, já era demais, agora a acusação é de satanismo.

General Mourão, o vice que andava com o escudo do Flamengo na lapela, derrotou Olívio Dutra, um símbolo da esquerda. Não vou cansá-los com dezenas de outros exemplos.

No domingo, eu fui advertido por familiares para não ir votar de vermelho, que não era prudente, que era necessário se evitar a violência e não sei o que mais. Já chegamos a esse ponto. Eu preferi correr o risco.

Mesmo que Bolsonaro perca o segundo turno, o bolsonarismo continuará forte e arrogante. Já cansei de ouvir: “por que você não vai para a Venezuela.” Ou seja, o Brasil é deles. Eu cá comigo, eu volto para a República de Itabaiana.

O Bolsonarismo continuará forte, mesmo com a derrota do Mito. Mas existe um risco maior: Bolsonaro ganhar. Não subestimem! O já ganhou é uma porta aberta à derrota. O 2º turno é uma nova eleição, ou se vai para as ruas pedir votos, convencer os indecisos, ou se ressuscita a militância de esquerda, ou as milícias tomarão conta.

O fascismo não é um Partido, é um credo político onde o ódio é a medida de todas as coisas.

Antonio Samarone (médico sanitarista)

OS GALHARDETES ESTÃO NAS RUAS

 Os Galhardetes estão nas ruas.
(por Antonio Samarone)

O Fake News não é uma mentira. É o apagamento dos limites entre o verdadeiro e o falso, o real e o virtual, o bom e o mal, a razão e a paixão. É o fim da referência ao milenar binômio verdade/mentira, onde a mentira tinha pernas curtas.

É a chamada pós verdade, isto é, o fim da verdade! A verdade é uma ilusão, como afirmava Nietzsche. Essa conversa que a verdade nos libertará, acabou.

Não existem mais verdades factuais, que possam ser usadas para desmontar as mentiras. O relativismo é absoluto, cada um acredita em seu sistema de referências. Por mais absurda, as fake news terão um infinidade de crentes e repassadores, infensos a qualquer argumentação em contrário.

O fim das grandes narrativa deu início a pós-modernidade. O fascismo é a ação pela ação, não precisa de narrativas. O fascismo é guiado pelo irracionionalismo.

Não é difícil entender o ódio aos artistas, acusados de privilégios, de beneficiários da lei Rouanet. No dizer de Umberto Eco: “Pensar é uma forma de castração. Por isso, a cultura é suspeita na medida em que é identificada com atitudes críticas”.

As fake news são dirigidas às crenças atávicas, preconceitos, pulsões primitivas, fora do comando racional. Os fake news brotam de instintos obscuros e pulsões insondáveis, selecionadas por algoritmos, atingindo as profundezas da psique humana. Não são simplesmente mentiras.

O fascismo adapta-se a cada realidade, na Itália de Mussolini era nacionalista, no Brasil atual é um aliado do neoliberalismo extremo. A pauta de costumes é uma nuvem de fumaça, a motivação central é econômica.

“Com o fascismo se pode jogar de muitas maneiras, sem que se mude o nome do jogo.” – Umberto Eco.

No primeiro turno, eles fizeram maioria no Parlamento, pelo voto livre do povo brasileiro, como disse ontem o reeleito Arthur Lira, Presidente da Câmara Federal.

O segundo turno é uma nova eleição. Não precisa ser cientista político para compreender a marcha dos governadores.

O combate ao sistema de fake news com argumentos e demonstrações racionais é ineficaz. O “terraplanismo” viraliza facilmente, ao contrário da extinta verdade.

Com o fim da verdade, tudo é possível, tudo é respeitável, tudo é verossímil.

Antonio Samarone (médico sanitarista)

A EPIDEMIA DOSN ESQUECIDOS

 A Epidemia de Esquecidos.
(por Antonio Samarone)

Perguntei a um filho, pelo professor Alípio, em foi sucinto: “o velho não regula mais, perdeu a memória, está com Alzheimer avançado.”

Alípio foi o cirurgião mais talentoso de sua época, um professor adorado por sua didática, educação e bom humor. Fora da sala de aula, o Dr. Alípio não dava um bom-dia, sempre de cara amarrada. Na sala, era um homem show, um espetáculo. A sala de aula era o seu palco.

Não fiquei satisfeito com a resposta do filho e insisti: sim, além do Alzheimer, como anda a vida do velho? Ele foi grosseiro: “o meu pai não existe mais. Nem morreu, nem está vivo. Acabou!

A memória sobre o brilhante professor, acabou com o fim da sua memória biográfica. Nem o Dr. Alípio se reconhece, nem a sociedade o reconhece. Literalmente, um vivo/morto.

O Alzheimer é uma doença neurodegenerativa progressiva que provoca demência. Por razões óbvias, a perda da memória apressa a perda de autonomia. A sociedade é cruel com quem não produz.

A medicina reconhece outras patologias que levam a perda da função cognitiva e da memória. As demências Vascular; por Corpos de Lewy; pela Doença de Parkinson; a Fronto temporal; a de Huntington; a Alcoólica; de Creutzfeldt-Jakob e, mais recentemente, as sequelas da Covid-19.

Entretanto, o Alzheimer, por ser a mais frequente, virou a doença símbolo das demências.

Eu comecei com um esquecimento seletivo. Encontro com pessoas conhecidas, sei quem é, lembro-me dos detalhes do fulano, só não me lembro do nome. É um constrangimento. E quando se trata daqueles chatos que perguntam: “Tá lembrado de mim?” Aí o constrangimento aumenta.

A acho que a saída é as pessoas andarem com o seu “CR Code” à mostra, para que possamos identificá-los com o celular.

Voltando ao professor Alípio, hoje não se fala mais nele, foi esquecido ainda vivo.

Em minha infância, a caduquice não levava ao esquecimento, pelo contrário, era como se o velho voltasse a ser criança, para que o fardo da velhice se tornasse mais leve. E assim era visto.

O Seu Pepita de Dona Bobina, foi o caduco padrão de minha infância. A cidade o respeitava, com uma observação sagrada: “o seu Pepita está caducando, ninguém mexe com ele.”

Eu achava a caduquice a antessala do paraíso, uma preparação para a eternidade. Uma forma serena de desapego com vida.

O caduceu era uma insígnia de autoridade, o bastão dos deuses, o cajado dos pastores, a varinha das fadas e o condão de Asclépio.

A velhice chegava com o “arrastar os pés e o tremer das mãos”. Os velhos eram poucos, mas divinamente rabugentos, cheios de razões e de verdades. Os velhos metiam medo: “o velho pega!”, me advertia mamãe. Era um preconceito respeitoso. Só a caduquice as abrandava.

Hoje não se presta a atenção aos velhos. Eu passei a vida esperando a hora da rabugice, tenho contas a acertar! Mas estamos na Era do esquecimento. Os velhos não contam mais, foram transformados em idosos, uma forma domesticada de velhice.

Hoje todos tem razão e a verdade foi extinta.

Rabugice Já!

Antonio Samarone (médico sanitarista)