terça-feira, 28 de setembro de 2021

O INFARTO DA ALMA



O Infarto da Alma.
(por Antonio Samarone).

Em tempos de farinhadas, o meu avô Totonho de Bernardino, recrutava a família para ajudar na labuta. Os meninos iam juntos. Dormíamos no sítio à luz dos candeeiros e acordávamos com o cantar festivo dos galos.

Era uma festa!

Eu não parava de me danar. Quando não tinha nada para fazer, saia fechando e abrindo as portas, sem propósitos, só para não ficar parado.

O meu avô sentenciou: “esse menino é da pá virada, não pára, vai ser trabalhador.” Eu era um vocacionado para as traquinagens. Irrequieto, impulsivo e buliçoso.

Quando a peraltice era exagerada, podia ser taxada como um defeito de caráter moral, má criação, falta de quem desse cobro.

A medicina depois botou o seu carimbo: essas crianças sofrem de hiperatividade. Era a doença hipercinética da infância. Com o tempo, os meninos criavam juízo e a traquinagem ia diminuindo.

Essas crianças, além da hiperatividade, não tinham muito foco, disciplina, não se concentravam, não prestava a atenção em nada.

No geral, tinham dificuldades na escola, por completa falta de atenção e interesse. Hoje, a medicina estendeu a hiperatividade para os adultos e fez dobradinha com a desatenção (a falta de foco).

Segundo a medicina, a hiperatividade leva a uma desatenção patológica.

Em 1968, o DSM – II classificou a traquinagem como “Reação Hipercinética da Infância”. O CID – 9, batizou de Síndrome Hipercinética. DSM é um sistema de classificação de transtorno mentais da psiquiatria americana e o CID é o Código Internacional de Doenças.

Em 1970, o DSM – III avançou e fez a ligação da hiperatividade com a desatenção: a traquinagem passou a ser o “Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH). Esse mesmo, que o Dráuzio Varela está divulgando na Globo.

A ênfase maior atualmente é na desatenção. A falta de foco reduz o desempenho e a produtividade. A hiperatividade produtiva é desejada.

Essa falta de atenção, sobretudo nas escolas, sempre foi motivo de debates profundos entre pedagogos, professores e psicólogos.

Como melhorar o aprendizado? A desatenção reduz a competividade e isso é muito grave, numa sociedade centrada no desempenho.

A falta de atenção dos alunos, a pedagogia do meu tempo resolvia à base dos castigos físicos e punições acadêmicas. A reprovação era a mais leve.

Sei que os doutores da psiquiatria não concordam, mas o cientista americano Leon Eisenberg (1922 – 2009), dizia ter sido o inventor do TDAH. Sendo ou não verdade, a Industria Farmacêutica é eternamente agradecida a quem inventou.

A Indústria Farmacêutica produz para o “déficit de atenção”, com ou sem hiperatividade, a tradicional “Ritalina”. Com a mesma droga, o metilfenidato, também está à venda o “Concerta”. (o nome é ótimo).

Para os hiperativos desatentos mais modernos, tem o “Venvanse”. A droga é a Lisdexanfetamina, de liberação lenta e longa. O “Concerta” e o “Venvanse”, custam cerca de R$ 250,00 a caixa.
Não sei se já foi liberado no Brasil, mas ainda existe o “Adderal”, um mix de anfetaminas.

Qual é a questão?

Sendo ou não a hiperatividade e a desatenção uma doença ou um transtorno, o doping funciona e aumenta a competitividade dos usuários. De qualquer usuário! Com a ressalva de todas as drogas, causam dependência.

No clássico “Mal-estar da Civilização”, o grande Freud alertou para a única inconveniência da saída química: é a dependência e os efeitos colaterais.

Essas drogas produzem um “neuro-enhancement”, no dizer de Chul Han.

A minha hiperatividade, vista pelo meu avô com um bom presságio, hoje me levaria para os ambulatórios da saúde mental, como cliente de médicos, psicólogos e da indústria farmacêutica.

“Cada época possui as suas enfermidades fundamentais” – Chul Han.

Escapei!

Antonio Samarone (médico sanitarista)


 

domingo, 26 de setembro de 2021

A FÉ EM ANTONIO.


A fé em Antonio.
(por Antonio Samarone)

Fui batizado no dia do Natal e fiz a primeira comunhão no aniversário de sete anos. Tudo por promessa de mamãe, uma “Filha de Maria”, devota de Santo Antonio. Sou o primogênito, de uma família católica.

Em Itabaiana, só o bairrismo é maior do que a fé em Antonio, padroeiro e fundador da cidade. Nascemos Villa de Santo Antonio e Almas de Itabaiana.

Eu fui duplamente premiado com o nome do Santo, também por promessa. Recebi o nome dele de batismo, Fernando, e nome do Frade menor da ordem franciscana de Coimbra, Antonio. Ao nascer, fui Antonio Fernando. Depois, recebi a vulgar alcunha de Samarone. Essa é uma estória comprida e sem graça.

A minha alma só atende por Antonio Fernando, continua cumprindo a promessa.

Antes de virar Crente, mamãe sempre tinha promessas atrasadas, mas sempre pagou. Ela prometeu vestir luto fechado durantes as quaresmas, se ficasse curada da enxaqueca crônica, que lhe acompanhava desde menina. O crédito dessa promessa serviu também para a família.

Em Itabaiana, somos todos Antonio. Como diz o eterno canto: “O que seria de mim, meu Deus, sem fé em Antonio.”

O maior poeta português também recebeu o nome em homenagem ao Santo: Fernando Antonio Nogueira Pessoa. Ele, por ter nascido em 13 de junho. Fernando Pessoa venerava Santo Antonio e carregava no bolso uma estampa dele, mesmo não sendo religiosos.

As imagens de Santo Antonio que sobraram na Igreja Matriz de Itabaiana, carregam um resplendor de prata sobre a cabeça, flores e a cruz na mão direita. Na mão esquerda uma novidade, o menino Jesus está nu. Não carrega o cetro e coroa de Rei, das imagens convencionais.

É o Santo Antonio dos pobres. Não conheço a origem, vou perguntar ao doutor Vladimir.

O Santo também é guerreiro e casamenteiro, mas em Itabaiana ele é dos pobres e protege os caminhoneiros. Não sei se ainda existe o “pão de Santo Antonio”.

Santo Antonio nasceu em Lisboa (1195) e morreu em Pádua (13 de junho de 1231). Morreu de ergotismo, enfermidade antiga, causada por uma toxina produzida por fungos do centeio. A doença passou a se chamar Fogo de Santo Antonio.

Santo Antonio foi canonizado em 1232, pelo Papa Gregório IX.

Santo Antonio pregou aos sarracenos. Viajou à África moura em 1220, com o sonho de ser martirizado. Antecipou a saga de Dom Sebastião, em três séculos.

No Brasil, Santo Antonio é Vereador perpetuo em Igarassu, Pernambuco; ganhou a patente de Soldado na Paraíba e no Espírito Santo; Tenente em Pernambuco; Capitão na Bahia, Goiás, Minas e Rio de Janeiro; Coronel em São Paulo; e General do Exército Brasileiro, desde 1890, nomeado pelo Marechal Deodoro.

Em Itabaiana, lhes devemos atenções! Ele fugia da Igreja Velha, no Vale do Jacarecica, e escondia-se às sombras das quixabeiras, na Caatinga de Ayres da Rocha, onde a cidade se estabeleceu. Itabaiana fez parte da sesmaria doado a esse fidalgo, por ocasião da ocupação de Sergipe, em 1591.

Faço um apelo as autoridades de Itabaiana (civis, militares e eclesiásticas), vamos replantar a quixabeira, arrancada por ignorância e desleixo.

Antonio Samarone (médico sanitarista).


 

sexta-feira, 24 de setembro de 2021

GENTE SERGIPANA - FALECEU O PROFESSOR GRILO.


Gente Sergipana – Faleceu o Professor Grilo.
(Por Baldochi e Samarone)

José Arnaldo da Silva (Grilo) foi um menino traquino. Um adolescente irreverente, observador e crítico, sem nunca ter perdido a leveza do sorriso. Foi o aluno do Murilo Braga recordista em suspensões, sem nunca ter sido reprovado.

Grilo era inteligente e sagaz!

Certa feita a suspensão foi de trinta dias. A diretora, a mestra Maria Pereira, fez uma admoestação: “Meu filho, o meu desejo é que você um dia seja professor, para entender a sua indisciplina.”

O desejo da diretora foi atendido: Grilo foi um grande professor de história.

Em seu primeiro dia de aula, houve um mal-entendido: Zé Gorducho, o porteiro do Murilo Braga, barrou o novo professor Grilo, alegando que só era permitido a entrada de professores. Grilo esclareceu: "mas eu sou professor!" Zé gorducho deu uma boa risada: "Se você for professor, eu sou o diretor do Colégio."

Zé Gorducho não sabia que o irreverente Grilo tinha se formado e estava habilitado para ensinar no Colégio. Grilo relevou o incidente.

Nascido e criado em Itabaiana, na Rua Batista Itajay, a Rua de Seu Borrachinha. Grilo era Filho de Seu Bidó e Dona Anita. Irmão de Zé de Bidó, Vigia, Bidó, Dinda e Zé Marcos. Ainda falta uma irmã, que esquecemos o nome.

Grilo foi nosso amigo de infância, por quem sempre tivemos afeto.

Um grande caráter!

Grilo na juventude foi um frequentador contumaz da Serra de Itabaiana e dos banhos no Poço das Moças.

Grilo se casou com Joseiza e tiveram três filhos: Douglas, Diego e Danilo.

O professor Grilo nunca faltou a um sepultamento em Itabaiana. Era solidário com os mortos, mesmo com os desconhecidos.

Meu amigo Grilo, o seu lugar está garantido no Paraíso. A sua alma gigante transbordava em seu pequeno corpo. Um grande amigo, marido, pai e professor.

Você foi uma parte boa da nossa geração e das nossas lembranças. Acompanhamos a sua vida. Baldochi bem mais, pois na juventude vocês moravam na mesma rua.

Nossos sentimentos!

Baldochi & Samarone.