segunda-feira, 26 de maio de 2014

O Trabalho Médico




Trabalho Médico
Antonio Samarone de Santana.
Academia Sergipana de Medicina.

Ao longo da história, o trabalho médico foi subdividido ou reagrupado em atividades profissionais distintas e em especializações e sub-especializações, correspondendo ao aumento de complexidade da assistência à saúde. Até aí, tudo bem, a divisão social do trabalho é característica do trabalho humano tão logo ele se converte em trabalho social, isto é, trabalho executado na sociedade e através dela.
Entretanto, o que ocorreu recentemente foi o parcelamento do cuidado médico, a divisão em pequenas operações batizadas de “procedimentos”, executados por profissionais diferentes, sem comunicação entre si, sem hierarquia, sem coordenação, tornando o médico inapto para acompanhar o cuidado como um todo, perdendo de vista o ser humano em sua individualidade. A Associação Médica Brasileira (AMB) agrupou essa fragmentação em 4.600 procedimentos distintos, por enquanto. Esta divisão imposta pelo mercado, sob o comando do capital, levou a desvalorização do trabalho médico e a sua menor remuneração. Passou a ser um trabalho de baixa complexidade, onde um pequeno treinamento pode torná-lo habilitado para a realização de suas tarefas, resumidas na execução de alguns poucos procedimentos.
Enquanto a divisão social do trabalho subdivide a sociedade, a divisão parcelada do trabalho subdivide o homem, e enquanto a subdivisão da sociedade pode fortalecer o indivíduo e a espécie, a subdivisão do indivíduo é um menosprezo das capacidades e necessidades humanas. Ao parcelar o trabalho médico em procedimentos, o mercado desvalorizou o trabalho dos profissionais, para valorizar o emprego do trabalho morto, incorporado à tecnologia e sob comando e direção do capital.
Quando a assistência destina-se a condições agudas de saúde, esses procedimentos usados corretamente, de forma rápida, apresentam uma razoável eficácia; contudo, quando se destinam ao atendimento de condições crônicas de saúde (80% do total), que exige um acompanhamento em longo prazo, envolvimento do paciente, cuidados continuados e integrais, intervenção em equipe, etc. os procedimentos médicos tem se mostrado ineficazes, quando não iatrogênicos. O que se mostrou eficaz para aumento da lucratividade do capital que comanda a saúde, tem sido limitado na redução do sofrimento humano e de impacto zero sobre os indicadores de saúde da população.