segunda-feira, 5 de agosto de 2019

SERGIPE ANTIGO (CAPÍTULO V) - CAPITANIAS HEREDITÁRIAS


(Cap. V)

Sergipe Antigo. (Ciri-gy-pe – rio dos siris).  (por Antônio Samarone)

A Capitania de Sergipe (parte um).

Um esclarecimento.

A primeira tentativa da Coroa Portuguesa na delimitação geográfica e ocupação do que viria se constituir na Província de Sergipe, foi o foral de concessão da Capitania Hereditária a Francisco Pereira Coutinho, em 26 de agosto de 1534. A confusão interessada de alguns historiadores foi denominar posteriormente esse território como Capitania da Baia de Todos os Santos.

Na verdade, os historiadores sergipanos acompanharam a versão baiana de que a Capitania doada a Coutinho era a Capitania da Bahia de Todos os Santos, atendendo aos interesses expansionistas da Bahia.  

As cinquenta léguas de litoral da Capitania de Coutinho, contava a partir do Rio São Francisco, e terminava entre os rios Pojuca e o Sabahuma, ou seja, mais de vinte léguas antes da Baia de Todos os Santos.

O próprio Coutinho na chegada fez confusão, ocupando inicialmente o território da Villa Velha já ocupado por Caramuru, que, por desconhecer os termos do foral de concessão. Caramuru não reagiu num primeiro momento. Em seguida, essa ocupação indevida de Coutinho foi o principal motivo para as desavenças, que terminaram em seu assassinato.

Na verdade...

A Capitania Geral ou Capitania da Baía de Todos os Santos foi constituída por Tomé de Souza, nos termos de sua nomeação, em 07 de janeiro de 1549. Está claro que ele deveria assumir o cargo de Capitão da povoação e terras da Baía de Todos os Santos, praticamente o Recôncavo, e de Governador Geral da dita Capitania e das demais Capitanias, inclusive a Capitania de Francisco Pereira Coutinho (Sergipe).

A Capitania da Bahia de Todos os Santos, criada por Tomé de Souza, estendia-se a uma área equivalente a seis léguas em quadra. O termo de posse de Tomé de Souza também determinou a construção de uma fortaleza e uma grande povoação, que será a cidade de Salvador. A confusão é que nessa Capitania da Bahia de Todos os Santos situava-se o Governo Geral.

Ficando esclarecido essa primeira confusão. A Capitania de Francisco Pereira Coutinho correspondia ao território de Sergipe estendido. Nada a ver com a Baía de Todos os Santos. Com o tempo a Bahia foi avançando e, no início da República, sufocou Sergipe ao território entre o Rio Real da Praia e o São Francisco. Mas isso é outra história, que abordaremos depois.

Voltemos a Capitania de Francisco Pereira Coutinho (Sergipe).

Francisco Pereira Coutinho chegou com a sua numerosa e rica expedição de sete naus, em 1537. Só que desembarcou onde não lhe pertencia, na Villa do nobre Caramuru. Coutinho tentou estabelecer-se no território, distribuiu sesmarias, fundou engenhos, até que os conflitos com Caramuru se estenderam para os Tupinambás, culminando em seu trágico naufrágio na Ilha de Itaparica, em 1547, sendo devorado num banquete antropofágico pelos índios.

Francisco Pereira Coutinho, filho de Affonso Pereira Coutinho, Alcaide Mor de Santarém, recebeu de D. João III, um feudo no Brasil, uma Capitania de cinquenta léguas, visando agradecer-lhes pelos serviços prestado na Índia.

Coutinho chegou a Bahia em 1537, numa expedição com sete embarcações. Ele acreditava que a possessão se estendia da margem direita do rio São Francisco até a Ponta Padrão, depois avançando até o recôncavo.

Eduardo Bueno, em Capitães do Brasil, informa: “por julgar que os serviços que o Rusticão (Francisco Pereira Coutinho) prestara no oriente eram dignos de recompensa, exato três meses após a assinatura da carta de doação o Rei ainda mandou dar ao donatário mil cruzados para comprar artilharia e armar os navios que ora vai para a Capitania do Brasil. Logo a seguir, Pereira vendeu tudo o que possuía em Santarém e empregou o dinheiro para armar uma frota de sete navios e arregimentar cerca de 200 colonos.”

Essa escolha do Rei causou profunda decepção em Caramuru, residente na terra a muito tempo e com grande prestígio entre os tupinambá. Caramuru acreditava que seria o donatário da Capitania. O mesmo aconteceu com a Capitania de São Vicente, onde residia João Ramalho, e a Capitania foi doada a Martim Afonso de Souza. A chegada da comitiva de Coutinho causou um profundo incomodo na comunidade de Caramuru, inclusive entre os Tupinambás.

Logo que Caramuru tomou conhecimento dos termos da doação da Capitania de Coutinho, iniciou um trabalho intenso de desestabilização do intruso. Coutinho não teve tréguas.

A herança das cinquenta léguas de Coutinho, o território de Sergipe, ficou com o seu filho primogênito Manoel Pereira Coutinho, que por faltar-lhe recursos, disposição, e pelo medo de ter o mesmo fim que o pai, não mexeu uma palha na ocupação de sua Capitania.

Após a morte de Coutinho (1547) o território de Sergipe ficou quase paralisado, eram as denominadas terras do Rio Real, passando a ser fruto de ambição dos colonos, tendo à frente o famoso Garcia d’Ávila.

É provável que o respeito a propriedade dos familiares de Coutinho, por herança, tenha preservado em parte a escravização das 36 tribos de Tupinambás da área entre os rios Real e São Francisco, atual Estado de Sergipe.

Aqui é preciso uma ressalva, o que se chamava rio Real era o atual rio Itapecuru, bem mais próximo do Recôncavo. O Território dos “Coutinhos” foi respeitado, nenhuma sesmaria foi doada pelos Governadores entre a ponta de Itapuã e a barra do São Francisco até 1573, uma das razões da tardia ocupação portuguesa de Sergipe. 

Somente em 1573, a Coroa Portuguesa comprou os direitos da herança da Capitania aos Coutinhos, por 400$000 de juros por ano, pagos com a redizima da mesma Capitania, tendo o vínculo tomado o nome de morgado do juro.

A citada Capitania recebeu o nome de “Sergipe d’El-Rey”, pela homenagem ao Rio Cirigi (aportuguesado para Sergipe) e por pertencer a Coroa, por compra aos herdeiros. Não resta dúvidas, que a Capitania de Coutinho (Sergipe) e a Capitania da Baia de Todos os Santos são realidades distintas, e que o território da Capitania de Sergipe era bem maior.

Entende-se as razões para que somente após a compra, o Rei ordenasse ao Governador Luiz de Brito a exploração das famosas terras do Rio Real. A segunda tentativa oficial de ocupação das terras de Sergipe só ocorreu em 1575. Fato que abordaremos nos próximos capítulos.

Existem fundadas suspeitas históricas do envolvimento de Caramuru na morte de Francisco Pereira Coutinho... O sergipano João Ribeiro em sua História do Brasil, levanta essa versão: também foi uma tragédia a história do donatário Francisco Pereira Coutinho. Homem já de idade, doente, tardo e irresoluto, foi um dos últimos a colonizar o seu feudo (1537); já ali encontrara um núcleo de homens livres que se assenhoreara da terra (o Caramuru e outros). Ocupou o território que não lhe pertencia.

Coutinho levantou três engenhos. Os soldados de Coutinho tratavam os índios com violência e deboche, chegando a matar o filho de um Cacique. As relações com o tempo se agravaram.

Em breve, os seus próprios sesmeiros e vassalos unidos aos índios, que entretanto e a princípio pareceram pacíficos, revoltam-se e põem em sítio apertado o velho donatário. Chega um clérigo impostor que traz um falso documento de prisão do Capitão Mor que desamparado se refugia em Ilhéus. Parece que na insubordinação dos colonos e dos indígenas havia o conselho de Diego Alvares (Caramuru), personalidade cujo prestígio próprio eclipsava a do donatário.

Continua João Ribeiro, Coutinho voltou a Bahia, um ano mais tarde, a chamado dos seus falsos amigos; mas naufragando na Ilha de Itaparica e caindo em poder dos índios, que o reconheceram, foi feito prisioneiro de guerra e, em lúgubre festim, foi morto e devorado pelos canibais, segundo a terrível usança. Essa aventura repercutiu dolorosamente na Corte de D. João III, onde outras agruras não faltavam.

Francisco Pereira Coutinho, fidalgo, guerreiro, experimentado nas expedições portuguesas na Índia, desde 1506. Tomou parte na conquista de Goa, em 1515. Coutinho foi devorado pelos Tupinambá em Itaparica. Foi a trágica morte de Francisco Pereira Coutinho, que convenceu ao Rei D. João III, a criar a Governadoria Geral do Brasil. Abordaremos tema em outros capítulos.

Voltaremos a Capitania de Sergipe, no próximo capítulo...

Antônio Samarone. 

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