Só os machos cantam... (por Antonio Samarone)
O canto das cigarras era o fundo musical da quaresma. Por onde andam as cigarras? Nunca mais... Ontem eu recebi de uma amiga, fotos de uma cigarra papocando pelas costas, e emergindo como uma cigarra nova. Elas não morrem de tanto cantar, como se dizia, elas renascem.
As cigarras voltaram, reapareceram aqui em Aracaju.
Nunca entendi de onde elas vinham, apareciam de repente, e danavam-se a cantar a quaresma inteira. Consultei uma bióloga, e recebi uma síntese:
“As cigarras têm ciclo de vida hemimetábolos (ovo, ninfa e depois adulto). Ela pode chegar a ficar até 17 anos na forma de ninfa no subsolo se alimentando de nutrientes presentes das raízes das plantas. Quando ganha o exoesqueleto ela sai do subsolo e se fixa numa árvore. Perde o exoesqueleto antigo (exúvia), e emerge adulta, já pronta pra se reproduzir. Depois que põe o ovo a fêmea morre.”
Nunca que eu soubesse...
Fui alfabetizado pela “Cartilha do Povo”. E uma das poucas histórias que eu guardei foi a disputa entre a cigarra e a formiga. A moral da história era favorável a formiga, que optava pelo trabalho. A cartilha emulava o trabalho. Depois Raul Seixas inverteu, numa canção belíssima: “a formiga só trabalha porque não sabe cantar”. Acho que faz mais sentido.
Entre as cigarras só os machos cantam. Não me perguntem porquê...
O canto das cigarras provoca sono. O canto que Anacreonte achava melodioso, e Homero comparou a doçura dos lírios era o da cigarra. Acho que Homero exagerou. Ou as cigarras gregas são mais afinadas.
Na quaresma, as cigarras eram um divertimento da molecada perversa. Trepávamos em árvores para a captura, apertávamos nos lados, embaixo das asas, para que eles não parassem de cantar. O abestalhado que mantivesse a cigarra cantando por mais tempo era o vencedor. Talvez por isso que elas desapareceram.
Antonio Samarone.
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