sexta-feira, 27 de abril de 2018
HOMENAGEM A ALBERTO CARVALHO
Homenagem a Alberto Carvalho (texto de Mirian Carvalho)
Na minha mesa tá faltando ele...
Meu pai era das palavras, dos livros, das letras, “ livros mudaram minha vida, mudaram minha alma...”. Desde sempre me vi rodeada por tudo isso, seja vendo-o ler incessantemente ou “naquela mesa onde ele sentava sempre” e conversava contente com toda gente que chegava por lá. E contava piadas, das melhores! Mas suas ações, ah suas ações, o tornaram protagonista da canção “se todos fossem iguais a você, que maravilha viver...”.
Em cada canto da nossa casa havia música, não tive como não me apaixonar por Chico, Vinícius, Charles, Elizeth, por Emílio ou Clara Nunes... eram tantos e tão bons, que a gente ia se aproximando, e não era preciso apresentações, a gente ia se olhando e se gostando. Até imbricar-se...
Dentre as histórias da nossa casa, havia a identificação com Cinema Paradiso, quando ele recordava da vida em Itabaiana com tio Petrônio, este a recortar as cenas dos filmes e meu pai a vender balas para não perder nenhuma sessão. Ele vibrava com a singeleza desse filme, com as músicas de Zorba, o Grego, com o piano de Golpe de Mestre e com tudo de Ennio Morricone. Comovia-se com a força de Casablanca, com a genialidade de Charlie Chaplin, Woody Allen, Fellini e com Ladrões de Bicicleta.... e assim, adentrei numa atmosfera que só me fazia apaixonar por um outro mundo, para me desligar desse aqui.
Mais tarde eu cantava “Eu sei que vou te amar” e ele declamava “Soneto de Fidelidade”, e numa dessas nos juntamos com músicos amigos para gravar esse momento em estúdio e ele simplesmente “De tudo ao meu amor...” “De tudo ao meu amor...” “De tudo ao meu amor...” Não adiantava, travou! “Esqueci, pronto, esqueci!”. A gente só conseguia rir...
A varanda da nossa casa era o seu coração. O dele e o de minha mãe. Era acolhimento a qualquer pessoa para conversar sobre qualquer assunto, para servir o que ela preparava, era lugar de festejar e para onde eu sabia que podia ir sem medo. Era lugar de estar feliz.
Ofenísia Freira disse numa entrevista quando lhe perguntaram um lugar de paz: “A casa de Alberto Carvalho”. Ela estava certa.
A biblioteca da nossa casa era o avião particular dele. Lá ele conhecia quem ele quisesse e o lugar que desejasse; ele falava de tudo com tanta propriedade que ninguém duvidaria que ele foi lá ou viveu de fato tudo aquilo, tornando-se assim a principal referência para tantos quando estavam em busca de conhecimento. Era só “falar com Alberto”. Era meu ponto de chegada e de partida. E ainda é.
O meu pai na minha vida me faz falta. Sinto falta de falar com ele sobre um filme bom que assisti, ou sobre uma música que descobri... sinto falta da paz, do porto, do amor em cada gesto dele. Em mim, ficou mais do que o nariz tanto lembrado nas caricaturas que fizeram dele, ficaram as melhores piadas e os ensinamentos para não perder a ternura diante dessa vida dura.
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