Novas e velhas doenças.
(por Antonio Samarone)
Como surgem e desaparecem as doenças?
Eu nasci na metade do século XX. Fui atormentado com o sarampo, paralisia infantil e a varíola. Passei por todas as perebas, lombrigas e caganeiras. Sarnas e bicho de porco. A febre puerperal deixou de matar as mulheres.
A saúde pública inventou as vacinas, a higiene pessoal, o saneamento, a água potável e os antibióticos.
Na infância, eu temia cachorro azedo, cama de sapo, frieira, espinho de cobra, vento pelas costas, vertigem, remela, sarna gaiteira, leite com manga, quebrar o encaixe e perder o juízo.
O resto, dava para enfrentar. Mamãe tratava tudo com pó de sulfonamida, violeta genciana, guaiacol e óleo de rinse. O chulé foi uma novidade trazida pelos sapatos de plásticos.
O autismo era tão raro, que nem nome tinha.
A vida média no início do século XX era de apenas 31 anos. Elevamos a vida média para 80 anos. O século XXI elevará para 120 anos? Será a volta de Matusalém.
Reduzirmos a mortalidade infantil. Acabou-se os enterros de anjos. Pensei, as novas gerações serão mais saudáveis.
O final do século XX, pelo modo de vida, elevou as doenças do coração, as neoplasias, as mortes violentas e o suicídio. Mesmo assim, a vida média cresceu muito, sobretudo pela redução da mortalidade infantil.
A questão é o que fazer com essa sobrevida. Encheremos os asilos e clínicas geriátricas.
Inventamos as mamadeiras, os danoninhos e o today. Resultado: a lactose virou veneno.
Os antibióticos foram fartamente usados, em qualquer sinal de infecção. A agroindústria abusou dos antibióticos. Resultado, alteramos a nossa flora normal, ou seja, a nossa convivência evolutiva com os microrganismos foi modificada.
Em nosso corpo, apenas 10% são células humanas. Além de carne, sangue, músculos, ossos, cérebro e pele, somos bactérias e fungos. Somente o nosso intestino abriga 100 trilhões de microrganismos. 4 mil espécies diferentes.
As bactérias do intestinos pesam 1,5 Kg, o mesmo peso do fígado. Somos uma coletividade de microrganismos.
Em 2003, deciframos o nosso genoma, uma surpresa: possuímos apenas 20 mil genes, menos que um pé de arroz e um pulgão d’água. Os microrganismos que nos habitam somam 4,4 milhões de genes.
Não estamos só. O individualismos é uma ilusão.
Evoluímos lado a lado com bactérias, fungos e vírus, bem antes de sermos humanos. Os nossos micróbios são importantes para o nosso corpo. Uma novidade: cada um, possui a sua flora. Uma bactéria que habita em mim, pode não habitar em você.
Os nosso 2 metros de pele, contém tantos ecossistemas quanto todas as paisagens das Américas.
A indústria achou pouco, passou a vender lactobacilos em supermercados.
Mudamos o modo de vida, a alimentação, substituímos os tubérculos por alimentos processados. Envelhecemos gordos. Derrotamos as bactérias. Os vírus avançaram. A medicina passou a denominar o desconhecido como virose.
O século XXI trouxe as alergias, o autismo, doenças autoimunes, diabetes tipo I, escleroses múltiplas, ansiedade e depressão. O nosso sistema imunológico perdeu a calma, passou a atacar o próprio corpo.
O envelhecimento encontrou as demências e as neuropatias degenerativas.
O que estamos fazendo com a gente? Hipócrates achava que todas as doenças começavam no intestino.
As doenças do século XXI começam no intestino e estão associadas ao sistema imunológico. As diarreias crônicas e a seletividade alimentar são frequentes nos autistas.
Estou convencido: a transição alimentar que experimentamos, tem a digital nas novas doenças. Leiam “10% Humanos”, de Alanna Collen.
Antonio Samarone – Médico sanitarista.
terça-feira, 15 de agosto de 2023
NOVAS E VELHAS DOENÇAS
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário