Só Deus é grande. (por Antônio Samarone)
Encontrei Seu Bento de Zé de Sá Joaninha
contrariado. Chegou um padre novo em Itabaiana dizendo não acreditar em
milagres. Seu Bento se azedou! Ele, devoto de Santo Antônio, nascido e criado
na Sambaíba, passou a vida vendo milagres. Sempre obteve as graças de Deus, com
as promessas, e as ajudas dos santos. Como não acreditar em milagres? Esse
padre é doido! Os milagres estão por todos os cantos.
Bento só acredita no catolicismo
penitencial. Ele não perde novenas, ofícios, benditos, santas missões, trezenas,
jejuns, penitências, procissões, terços, romarias e vias sacras. “O cristão é
um peregrino em busca da porta estreita do céu”, sentenciou ele. Acho que os
padres sem batina perderam a autoridade. No fundo, quem faz o monge é o hábito!
Perderam o temor de Deus. A culpa é da igreja! Mudou tudo. Eu procurei esse
padre novo, para pedi-lo penitências, daquelas bem sofridas. Ele fez de conta
que não me ouviu.
Bento nunca perdeu a encenação da
Paixão de Cristo na Cajaíba, em Itabaiana. E vai paramentado, como se fosse um
dos apóstolos.
O bisavô de Bento morreu em
Canudos. Como herança, a família carregou consigo um manuscrito com os sermões
do Conselheiro. Perguntei-lhe se eu podia ver a relíquia. Meu amigo, eu não sei
onde botei, se achá-la, está em suas mãos. Fiquei curioso...
“Todos somos forasteiros, o céu é
a nossa pátria.” Não sei de onde ele tirou isso, mas não perguntei, deixei ele
falar. “Não se engane, o fim do mundo está próximo! Nunca mais teve uma
santa-missão em Itabaiana. O anticristo já nasceu, e pode ser qualquer um. Ele
vem disfarçado.” Eu comecei a suspeitar de uma meia dúzia de mal-assombrados
que conheço.
Eu sigo um pouco as pregações de
Conselheiro, me disse Bento: não como carne na quaresma. Outra coisa, o Beato
ensinava que só podia comungar quem passasse por uma boa confissão, hoje os
padres dão a hóstia até aos hereges. A coisa mais difícil é encontrar um padre
desocupado para uma confissão. Não está certo. De tanto procurar, já desisti.
Deus governa o mundo, disse-me Bento.
Só existem três leis: a da natureza, dada a Adão; a escrita, dada a Moisés; e a
da graça, dada a Jesus Cristo. Deus governa agora com amor, e cita uma passagem
dos sermões do Conselheiro: o sangue do meu filho não me pede vingança, como o
de Abel; ele me pede misericórdia e compaixão. Mas a justiça e a ira santa
terão o seu tempo. Deus é paciente, porquê é eterno! Não tive dúvidas, Bento
leu os manuscritos.
Somos pó, profetizou Bento. E
citou-me de memória uma longa passagem dos sermões do Conselheiro:
Permitiu Deus que a vida do homem
fosse breve, para ele nem com a riqueza se ensoberbasse, vendo o pouco tempo
que as havia de gozar; nem com as adversidades perdesse o ânimo, vendo que em
breve havia de acabar. Os dias do homem se desvanecem como sombras e seca como
as ervas. O mundo é uma passagem, um desterro, um lugar de sofrimento e
resignação.
Prosseguiu Bento, citando
Conselheiro: Quando Nosso Senhor vier a julgar todos os homens, dos bens e
males que fizeram em sua vida, não haverá mais tempo, tudo será eternidade. O
sertão vira mar, e o mar vira sertão.
A conversa ia e conversa vinha, e
eu com pressa de voltar para Aracaju. Tentei concluir: valeu meu amigo, vou lhe
procurar para ver o manuscrito. Ele se fez de surdo. Só mais duas coisas, insistiu
Bento, estamos nos fins dos tempos, e o Conselheiro foi um homem santo. Eu cá
comigo, o mundo tá só começando! Mas sobre a santidade do Conselheiro, Papa
Francisco bem que poderia botá-lo no mesmo lote de avaliação do meu padim Padre
Cícero.
Antônio Samarone.
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