terça-feira, 5 de fevereiro de 2019
O CHEIRO DAS DOENÇAS
O cheiro das doenças. (por Antonio Samarone).
Em minha viagem pelos cheiros, duas constatações. Primeira, o cheiro é individual, como a impressão digital, cada um tem o seu. A especificidade genética se expressa também no cheiro. Segunda, as doenças têm cheiros.
A medicina antiga diagnosticava com a ajuda do olfato. Avicena aconselhava aos médicos a exercitar bem o seu faro. Segundo ele, o odor da urina do seu paciente revela a sua patologia. No final do século XIX, o diagnóstico olfativo perdeu a sua ascendência.
No fundo, trata-se de um mesmo princípio: o cheiro específico de cada um se modifica com as doenças. As afecções possuem odores próprios, que se misturam com o odor do doente. Como não exercitamos o nosso olfato, não percebemos.
Não falo das doenças externas, dos abcessos, fistulas, feridas e perebas; nem do odor das carnes deterioradas do câncer no maxilar de Freud. Não falo do hálito cetônico dos diabéticos, nem do hálito urêmico dos renais crônicos, com cheiro de peixe; não, não trato disso. Isso qualquer recém-formado em medicina sabe.
A novidade é que as doenças possuem cheiros, mesmo aquelas em que os olfatos destreinados nada percebam. Trata-se de identificar os estados psicológicos dos pacientes pela linguagem dos odores. A competência olfativa do médico permite uma forte intuição sobre o estado de saúde dos seus assistidos.
Claro, fiquei em dúvida sobre essa importância do olfato na medicina, como afirmava os antigos. Sair perguntando. Fiz a mesma pergunta a vários especialistas: você consegue suspeitar um diagnóstico pelo cheiro? As doenças possuem Cheiros? A pergunta causou espanto a maioria, e as resposta foram genéricas e vagas.
Kraepelin, psiquiatra alemão, acreditava que a esquizofrenia possuía um cheiro próprio. Procurei um velho psiquiatra sergipano, um erudito em medicina, e perguntei-lhe: a esquizofrenia tem cheiro? Ele me contou uma história:
“Trabalhei muito tempo em hospitais públicos, com precárias condições de higiene dos ambientes e das pessoas, sempre senti um cheiro diferente junto aos esquizofrênicos. No interior de São Paulo, trabalhei num hospital totalmente higienizado, tudo limpo, entretanto, quando ia atender um esquizofrênico, a minha memória olfativa identificava o mesmo cheiro. Não tenho dúvidas, a esquizofrenia tem cheiro.”
O encanto com a medicina científica monopolizou os saberes. Mesmo assim, vários princípios da medicina hipocrática retornam timidamente. Por exemplo: a medicina grega acreditava na cura natural (vis medicatrix naturae), que as doenças evoluíam para a cura, e que a função do médico era não atrapalhar.
O médico sensato, na visão hipocrática, não se avexava, assumia uma posição expectante. Existe um movimento mundial (slow medicine), que restabelece, em parte, esse princípio.
A medicina hipocrática era holística, defendia que a doença era um desequilíbrio do homem consigo mesmo, com a família, com o meio ambiente, com a sociedade e com o cosmo. Alguma dúvida? O movimento das marés e as fases da lua interferiam com o andar de várias doenças. Que nos digam os lunáticos.
Nessa volta ao passado, na Inglaterra, o National Health Service (NHS), o serviço público de saúde mais antigo do mundo, aprovou o uso de cães treinados na identificação do câncer, pelo faro, na triagem dos pacientes. Um “pet scan” natural, mais barato e sem exposição às radiações ionizantes. Os cães treinados podem detectar câncer de próstata na urina em 93% dos casos. O teste Antígeno Específico da Próstata (PSA), tem uma alta taxa de "falsos positivos".
A Dra Claire Guest, co-fundadora da Medical Detection Dogs, percebeu que ela tinha câncer de mama depois que seu cachorro, Daisy, começou a cutucar uma área do seu peito que parecia machucada. Testes mais tarde revelaram que ela tinha dois tumores.
A ciência começa a demonstrar o que a medicina antiga afirmava: as doenças possuem cheiro, mesmo que o olfato humano não perceba.
Para se evitar mal-entendidos, o faro dos cães não substitui os demais exames e recursos usados pela medicina em seus diagnósticos dos cânceres, nem de outras doenças; apenas comprova que através do olfato, se pode suspeitar de várias patologias.
Antonio Samarone.
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