O perigo vermelho ronda
Itabaiana.
No dia santo, da imaculada
Conceição, fui a Itabaiana. Ser querer, encontrei com Araponga, um filosofo da
província, que levou a vida no anonimato. Poucos sabem, sobre a sua erudição.
Foi ele que, há muitos anos, me falou detalhadamente sobre o pensamento de
Descarte. Ele citava o “cogito ergo sum”, sempre em latim, e aquilo me
impressionava.
Araponga anda assustado! Me
revelou que um grupo direitista, clandestinamente, criou em Itabaiana o
Movimento Olavo de Carvalho (MOC). O grupo pretende entrar em contato com Steve
Bannon, para transformar o MOC numa “think tank”. Enquanto isso não acontece, o
MOC iniciou o jogo sujo.
O MOC começou a ameaçar os subversivos
(ou supostos): deixe o Capitão assumir, que os comunistas serão varridos de
Itabaiana, e você é um deles. Araponga não se conforma, não aceita ser chamado
de comunista! Quando jovem, ele até tentou organizar uma centúria poética em
Itabaiana, inspirado no realismo português de Eça de Queiroz. Araponga também não
nega a sua admiração por Antero de Quental. Mas comunista, é demais...
Araponga nunca se meteu em
política, muito menos com o comunismo. Até que em Itabaiana existiam alguns
comunas, discretos, reservados, pois nunca foi fácil ser marxista no interior
de Sergipe. Mas já morreram quase todos.
Segundo um intelectual
itabaianense, afamado na Universidade de Pernambuco, os comunistas de Itabaiana
não perdiam uma trezena de Santo Antonio, e uma meia dúzia era da Irmandade das
Almas, saiam nas procissões com o secular colete verde, sob o comando de Zé
Bigodinho.
Agora, me apareceu esse MOC
querendo caçar comunistas em Itabaiana. Eles não descansam, enquanto não
identificarem todos os inimigos. Não está fácil encontrar comunistas nem na
Rússia, imagine em Itabaiana.
Araponga filosofou: se governa
com “panem et circenses”, mas quando não se consegue, oferecer o sangue dos
inimigos (reais ou imaginários) serve de consolo. Em Itabaiana, Araponga acha
que ele foi o primeiro escolhido. Ele não pode negar a sua admiração por Antero
de Quental, nem que segue as suas ideias, e adora os seus livros. Certa feita, foi
à Portugal só para visitar o túmulo de Antero.
Araponga possui uma tela
portuguesa (cópia), do famoso duelo de espada entre Antero de Quental e Ramalho
Ortigão, e nunca negou sua imensa simpatia pelo primeiro.
Ele não sabe como descobriram a
sua ligação com Antero de Quental. Araponga é antigo, nunca usou as redes
sociais, nem sabe; não anda de conversinha nas esquinas, nem o seu nome ele
divulga; não gosta de aparecer. Poucos conhecem a sua filiação à maçonaria. Ele
já pensa em usar essa condição em sua defesa: não existem comunistas na
maçonaria.
Estou num beco sem saída,
desabafou Araponga! O MOC entende a minha simpatia por Antero de Quental como
uma prova inabalável da adesão ao credo vermelho. A perseguição está sendo
feroz! Achei aquela conversa sem pé nem cabeça, e retruquei: não é possível, você
deve estar vendo fantasmas, delirando.
Araponga se aborreceu com a minha
descrença, e bradou: os filisteus vão tomar conta do mundo, como dizia Antero
de Quental. Com medo que eu não soubesse quem eram os filisteus, ele abriu um
parêntese: os filisteus eram um povo inculto, que só possuíam interesses
materiais, vulgares e convencionais.
Para encurtar a conversa, mesmo
eu desconfiando da existência ou não desse MOC, aconselhei que ele botasse as
barbas de molho, mas que não deixasse de pregar as ideias subversivas de Antero
de Quental, em Itabaiana. E enceramos a conversa.
Antonio de Samarone.
Nenhum comentário:
Postar um comentário