A Felicidade de Final de Ano.
(por Antonio Samarone)
A felicidade é uma aspiração universal, isso já se sabia. A dúvida, era se esse desejo seria possível. Freud achava que a felicidade possível era instantânea, momentos passageiros, que ficam na memória.
A assertiva freudiana de que a “Natureza não tem compromissos com a felicidade”, é difundida com ares de verdade bíblica. Até 1920, Freud defendia que a psique humana é regulada pelos princípios do prazer e do desprazer. Depois mudou de opinião.
Não pretendo discutir aqui sobre as pulsões da morte, outro conceito Freudiano.
A redenção se faz pelo sofrimento. Ocorre, que o Ego busca a felicidade. Essa dualidade é aparente?
O certo é que a felicidade dos outros incômoda. A prova é simples: comece a relatar as suas vitórias (reais ou imaginárias) em um grupo de amigos, a reação de antipatia será generalizada. Mesmo que não se fale na hora, por conveniência, mas a impressão que fica é que somos mentirosos, pretensiosos e falastrões.
No geral, não se vê com simpatia a felicidade alheia. Agora inverta, conte as suas derrotas, o sorriso brotara no canto da boca dos circunstantes. Com as exceções de regra.
Com as redes sociais, o desejo universal de felicidade para todos se tornou exequível. São festas, jantares, confraternizações, muita alegria, risos, abraços. A chegada do Paraíso.
Com uma novidade histórica: a tecnologia permitiu que essas demonstrações de felicidade fossem de acesso universal, ao vivo e a cores. Só mudou a mídia. A natureza humana continua a mesma.
Os caga-raivas acham que tudo isso é falso. Uma representação teatral, ilusória, virtual e, na realidade, todos estão infelizes. A felicidade pelas redes sociais é uma fraude! Dizem os incrédulos.
Me permitam discordar.
Acho que a epidemia de felicidade de final de ano, expressa nas redes sociais, é tão verdadeira como as demais felicidades do dia-a-dia. Claro, todas são passageiras.
Para ser mais claro, o riso das “selfies”, das fotos pousadas, das demonstrações de felicidades planejadas, são tão verdadeiras como as antigas. A tecnologia digital não altera a falsidade humana. Nem aumenta, nem diminui.
A felicidade continua enigmática. A razão atrapalha. Ficar procurando explicações, motivos superiores, justificativas dificultam a felicidade.
A felicidade é um sentimento muito próximo da irrelevância. Se sente! Cada um a seu modo. Em alguns casos, submeter-se ao ridículo é necessário. Até fazer coraçãozinho com as mãos, gestos de paz e amor defronte para as câmaras, vale! Talvez seja a única forma de felicidade para muita gente.
Vou radicalizar: talvez seja a única forma de felicidade possível.
Experimente contar o seu momento de felicidade para uma banca de filósofos. Seremos humilhados.
A frase mais comum nos momentos de felicidade é: “estou sem palavras”. Verdade, sem palavras e muitas vezes sem pensamentos.
A felicidade não é filha da razão.
A minha conclusão é que a felicidade generalizada de final de ano é verdadeira, extrema, um surto contagiante. Sei que os mais intelectualizados ficarão decepcionados: “e é só isso”? É!
Os intelectuais acham que merecem outra felicidade, exclusiva, só deles.
Aquela felicidade da massa na areia da praia, defronte a um palco, vendo os fogos, fazendo sinais, gritando, pulando, mandando beijinhos e se abraçando com estranhos é a pura felicidade.
Claro, o álcool (e outras drogas) ajudam. Mas ajudam também as felicidades cultas, em jantares suntuosos.
Gente, a felicidade não é nada que os filósofos procuravam.
Um antigo candidato a Prefeito do Aracaju, chegou a prometer na campanha uma cidade feliz, uma “Feliz Cidade”. Perdemos a chance dessa experiência, ele foi derrotado por quem só propunha pintar os meios fios e apanhar o lixo.
Antonio Samarone – médico sanitarista.
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