sábado, 21 de outubro de 2023

QUAIS MUDANÇAS?

Quais mudanças?
(por Antonio Samarone)

A divisão política irreconciliável entre as pessoas, não é um fenômeno apenas brasileiro. Aqui, a divisão é mais radicalizada.

Não houve um golpe em 08 de janeiro e a volta da ditadura, por falta de quem o liderasse. Bolsonaro fugiu para os Estados Unidos, e os outros patriotas, foram eleitos para o Congresso.

Se dependesse dos democratas, a invenção francesa tinha sido varrida. Ninguém mexeria uma palha.

A base, dos auto denominados "Patriotas", fez a sua parte. Acamparam nas portas dos quartéis, entoaram hinos e fizeram apelos apaixonados pela volta da tirania. Foram derrotados, mas não reconheceram, nem desistiram.

A divisão política do Brasil é real!

Não se trata de uma confusão generalizada, de uma nova Babel, onde ninguém se entende. Não! A divisão é de valores, visões de mundo e ideologias.

Essa divisão se manifesta em quase tudo, dos grandes conflitos ao cotidiano. No campo dos direitos humanos: a invasão armada das favelas, a matança de jovens negros, a bala perdida, a tortura e a execução sumária, são defendidas e até festejadas por uns.

Os que são contra, estão intimidados e impotentes.

A divisão é geral: nas questões ambientais. Nas guerras (Ucrânia e Israel), nas questões comportamentais (do aborto e as opções sexuais), no modelo de ensino. Até na saúde pública.

A denominação direita/esquerda perdeu a nitidez. Talvez ainda ajude na economia. A esquerda tenta domesticar o neoliberalismo, torná-lo mais humano, com políticas compensatórias de distribuição de renda. Os resultados são provisórios.

A famosa nova classe C, surgida nos primeiros governos Lula, voltou rapidamente para a fila do osso. Hoje, tenta-se novamente humanizar o neoliberalismo.

A herança escravocrata, as desigualdades e a violência foram as bases fundadoras da sociedade brasileira. Não há dúvidas. Só que antes, uma parte, sobretudo os jovens, acreditava que poderia construir um mundo novo no Brasil, através da política.

Esses, que estou chamando de progressistas, sucumbiram. A utopia no Brasil perdeu força. Hoje, a política não é vista como caminho, foi criminalizada.

O grupo que tinha fome e sede de justiça foi derrotado. Quem pôde, refugiou-se na caridade.

Por onde andam os Caras Pintadas?

Essa geração perdeu as ruas nas passeatas de 2013 (dos sem Partidos), para os futuros patriotas. Depois, eles prostram-se diante do Pato Amarelo, do mercado financeiro.

Na última quarta, fui ao lançamento da biografia de Jackson Barreto, um personagem contraditório da vida pública sergipana. Mas, a contradição é a regra dos homens públicos.

Não é do biografado que eu quero falar nesse texto. Nesse, depois falo! Nem vou falar da bem escrita e esclarecedora biografia. Jorge Carvalho foi cirúrgico.

Quero falar dos que lá estavam. Chamou a atenção a composição da plateia, que foi prestigiar o lançamento da biografia de JB: Poucos jovens, poucos petistas, raros bolsonaristas e ausência do novo bloco governista (um ou outro perdido).

Dominou a presença dos antigos progressistas (de ex comunistas a liberais), de gente que um dia acreditou nas mudanças (palavra desgastada).

Quero falar da gente que lutou pelo fim da ditadura, pelas Diretas Já, pela vitória de Tancredo no Colégio eleitoral e que se conformou com as mudanças de Sarney.

Em Aracaju, essa turma deu a maior vitória eleitoral a JB, no retorno das eleições diretas para as capitais, em 1985. Qualquer proposta política naquele tempo, precisava da marca: Mudanças Já!

A maioria dos presentes no lançamento (antigos progressistas) foi derrotada, em suas crenças políticas e em seus credos ideológicos. O mundo que sonhávamos construir, não deu certo!

Uma boa parte dos progressistas, nem lembra mais do que se tratava. Preferem agarra-se ao que deu certo, nas conquistas (entre aspas).

A derrota não é uma boa companhia. “As mentiras sinceras me interessam,” como diz a canção.

Um dos poucos remanescente desse bloco progressista, que pessoalmente venceu e ainda continua na ativa, ocupando um posto importante na vida pública, teve a ideia em reunir a turma das “Diretas Já”, que depois chegou a Prefeitura de Aracaju, para uma foto histórica.

Vamos chamar quem? Todos os que ainda se idêntica com aquelas mudanças. Olhamos para os lados, quase ninguém. Deixamos a ideia da foto prá lá. As pessoas não mais reconhecem como progressistas, que fizeram parte de uma crença política.

Fizemos uma constatação silenciosa: perdemos no principal. A nossa narrativa foi derrotada. Os progressistas foram politicamente extintos.

De quebra, a antiga maioria silenciosa se assumiu de direita, e boa parte de extrema direita. Ocuparam as redes sociais com as suas teses, esperando novas chances. Amigos, colegas de universidade, que passaram a juventude calados, hoje carregam orgulhosamente a bandeira dos patriotas.

Hoje, esses patriotas torcem apaixonadamente pela vitória de Javier Milei, nas eleições da Argentina. Aliás, Milei é o candidato preferido da juventude portenha.

Hoje, esses patriotas sonham com a volta de Trump!

E os progressistas daquele tempo? Bem, esses acabaram por inanição, esquecimento, velhice ou morte. Alguns por conveniência.

Não se pode entender a biografia de Jackson Barreto (um progressista), escrita por Jorge Carvalho, sem observar essas mudanças por que passamos.

A foto, me parece ser da safra do grande César.

Antonio Samarone. Médico sanitarista.
 

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