O Belo Monte é aqui...
Antônio Vicente Mendes Maciel é
de Quixeramobim no Ceará, nasceu em 1830. Por volta dos quarenta anos, depois
de quinze anos de penitência, iniciou a sua vida ambulante, como pregador. Virou
Antônio Conselheiro. Em 1874, ele chegou a Itabaiana. Sua passagem por Sergipe
foi decisiva nessa transição de Antônio Vicente para Antônio Conselheiro. Aos
poucos, ele vai abandonando a postura de ermitão, para liderar seguidores.
Tá lá, nos Sertões de Euclides da
Cunha:
“Dos sertões de Pernambuco passou
aos de Sergipe, aparecendo na cidade de Itabaiana em 1874. Ali chegou, como em
toda a parte, desconhecido e suspeito, impressionando pelos trajes esquisitos —
camisolão azul, sem cintura; chapéu de abas largas derrubadas, e sandálias. Às
costas um surrão de couro em que trazia papel, pena e tinta, a Missão Abreviada
e as Horas Marianas.”
“Vivia de esmolas, das quais
recusava qualquer excesso, pedindo apenas o sustento de cada dia. Procurava os pousos
solitários. Não aceitava leito algum, além de uma tábua nua e, na falta desta,
o chão duro.”
Em Itabaiana, ele se arranchou na
Rua da Pedreira, numa casa da família de Romão de Nanã. Em sua breve passagem
por Itabaiana (97 dias?), de acordo com a memória coletiva, passada de boca em
boca, Conselheiro construiu o cemitério das Flechas e um tanque de água para
beber, conhecido como Perpétua. Ele deixou Itabaiana, com destino a Itapecuru,
com os seus primeiros seguidores, três da família de Romão, e quatro negros, fugindo
da escravidão. Um tema pouco tratado pela história oficial: o Belo Monte é
visto por José Calazans, como o último quilombo.
Nos ensinou Luiz Antônio Barreto:
“A tradição sergipana é a de que Antonio Conselheiro, antes de fixar-se em
Monte Santo, fazia igrejas e cemitérios. São citados, dentre outros, a igreja e
o cemitério de Tanque Novo, município de Riachão do Dantas, em Sergipe... Não
há, no entanto, um levantamento que revele, com segurança, a geografia das
andanças do Conselheiro, antes de Canudos.”
A presença de Conselheiro na
memória dos Itabaianenses era muito forte. Minha mãe falava muito, me contava
estórias de Canudos, como se tivesse participado. Em ouvi falar de Conselheiro
por mamãe. Machado de Assis estava certo, quando sentenciou: “O nome de Antônio
Conselheiro acabará por entrar na memória desta mulher anônima, e não sairá
mais. Ela levava uma pequena, naturalmente filha; um dia contará a história à
filha, depois à neta, à porta da estalagem, ou no quarto em que residirem.”
Muita gente de Itabaiana lutou na
Guerra do Fim do Mundo, em Canudos, ao lado dos Conselheiristas. Gente da Matapoã,
Sambaíba, Flechas, Caraíbas, Pé do Veado, Nicó. Sei por ouvir dizer. Quando a
notícia de Belo Monte se espalhou, vários Itabaianenses não perderam tempo,
partiram para Canudos. Os poucos que voltaram, contavam, e foi assim passando,
de boca em boca. Houve em Itabaiana uma adesão a causa. A passagem de Conselheiro
deixou raízes. E ele recebeu influências: não é à toa que o padroeiro de
Canudos é Santo Antônio.
Sobre a passagem e breve estadia
em Itabaiana não existem dúvidas. O Jornal “O Rabudo”, da Estância, relatou em
detalhes esse fato. O que ele fez, quanto tempo ficou, quem o seguiu, quem foi
depois para o Belo Monte? É o que queremos saber. Vamos ouvir os poucos que
ouviram dizer, e ainda lembram. E os historiadores de Itabaiana, que são bons e
muitos, podem ajudar nessa reconstrução histórica.
Nesse momento, a Associação
Sergipana de Peregrinos, sob a liderança de Anselmo Rocha, está construindo um memorial
a passagem de Antônio Conselheiro por Itabaiana. O local escolhido foi a Rua da
Pedreira, nas proximidades de onde foi o seu rancho. Da mesma forma que a
lenda de Santo Antônio Fujão está sendo reconstruída, esse fato histórico, quase
esquecido, começar a ser relembrado.
Antonio Samarone.
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