sexta-feira, 12 de janeiro de 2018

O nascimento da oftalmologia no Brasil. (Apontamentos).


O nascimento da oftalmologia no Brasil. (Apontamentos).


Nas primeiras décadas do século XIX, a oftalmologia era apanágio dos cirurgiões aprovados, que realizavam operações de catarata, de fístula lacrimal e enucleação do globo ocular.  Os naturalistas Spix e Martius, relatam o tratamento de moléstias dos olhos, por volta de 1818. Em Recife, o médico Henrique Krause, anunciava realizar qualquer tipo de operação nos olhos. As patologias oculares mais frequentes eram: conjuntivite, terçol, sapiranga, blefarite, arcus sinilis, oftalmia purulenta e tracoma. Entre os medicamentos da flora brasileira usados nas oftalmias citamos: suco de cansanção, sumo de brotos de umbaúba; contra manchas brancas nos olhos usava-se esterco de jacaré. Já se lavava os olhos com água boricada.  Em 1854, fundou-se no Rio de Janeiro, o Imperial Instituto dos Meninos Cegos. Pelas bandas de Sergipe, José Lourenço de Magalhães, José Correia de Melo Bitencourt e Antônio Militão de Bragança são os primeiros médicos a tratarem das doenças dos olhos. (fonte: Lycurgo Santos)

O primeiro serviço público destinado ao tratamento das moléstias dos olhos foi criado em 1858, pelo Marquês de Abrantes, provedor da Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro. O serviço foi entregue ao conceituado médico ítalo-francês Carron Du Villards. Nascia então a chamada 1ª enfermaria da Santa Casa, onde nasceu a oculística cientifica dando início a oftalmologia no Brasil. Foi também nessa enfermaria que surgiu a cátedra de oftalmologia da Faculdade Nacional de Medicina, em 1883. O primeiro professor a ocupar a cadeira foi Hilário Soares Gouveia. Quem foi o Dr. Charles Joseph Fréderic Carron Du Villards, fundador da oftalmologia no Brasil?

Quando chegou ao Brasil em 1857, Carron Du Villards, com 57 anos, já era um oculista famoso no Velho Mundo. Autor de um Tratado de Oftalmologia (Guide Pratique pour l’étude et le traitement des maladies des yeux), tinha implantado e dirigido um dispensário de oftalmologia em Paris, sido assistente dos cursos de oftalmologia ministrado por Lisfranc.  Carron Du Vilards possui vários trabalhos científicos publicados no “Annales d’Oculistique”. Doutor em medicina e membro da Academie Royale des sciences del Turin. Mesmo já estabelecido e conceituado na França, Carron Du Villards era um apaixonado por viagens. A partir de 1848, partiu percorrendo vários países, buscando novas experiências, até chegar ao Brasil.

Carron Du Villards nasceu em 1800, na Savoia, doutorou-se em Turim aos 20 anos, filho do médico militar sardenho, Carlo Giacono Luigi Carron, foi discípulo de Antonio Scarpa, maior nome da oftalmologia italiana. Em 1832, transferiu-se para a França, onde naturalizou-se. Faleceu no Brasil, em 02 de fevereiro de 1860, sendo sepultado no cemitério São João Batista. Com a morte de Carron Du Villards, comandaram essa enfermaria oftalmológica da Santa Casa, pela ordem, os renomados Joaquim Antonio Araújo e Silva (Barão do Catete) – 1860/1863;    Manoel da Gama Lobo – 1863/1867;  Hilário de Gouveia, Pereira da Cunha, Fernandes Pires Ferreira e o professor Octávio do Rego Lopes. Foi dessa enfermaria, que a partir de 1898, o médico sergipano José Antonio de Abreu Fialho comandou por 40 anos a oftalmologia brasileira. Em seu gabinete de trabalho, destacava-se um mapa de Sergipe, emoldurado, e posto em destaque na parede. Abreu Fialho foi assistente do Professor Pires Ferreira. Desse serviço saíram os melhores professores e profissionais de oftalmologia brasileira.

José Antonio de Abreu Fialho nasceu em 20 de janeiro de 1874, em Aracaju, filho de Tito de Abreu Fialho e Maria José de Abreu Fialho. Formou-se no Rio de Janeiro em 1896. Dois anos depois, com apenas 24 anos, foi aprovado em concurso público para a cátedra de oftalmologia. Em seguida, marchou para Viena, onde cursou por 2 anos, a especialização em oftalmologia na Clínica de Fuchs, o melhor serviço do Velho Mundo. Em 1918, Abreu Fialho convocou e dirigiu o Congresso Brasileiro do Tracoma, sendo o primeiro a chamar atenção para esse grave problema de Saúde Pública. Em 1922, fundou e dirigiu até a sua morte, a Sociedade Brasileira de Oftalmologia. Em 1928, lançou os “Anais da Oculística” e assumiu a direção da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, convidado pelo Presidente Washington Luís. 

Por ocasião da posse como Diretor da Faculdade de Medicina, Abreu Fialho enfatizou em seu discurso: “Quero a dignidade do ensino e no ensino. Ser útil, sem exceção, a quem ensina e a quem aprende. Quero elevar-me ao cimo das paixões humanas; com o ideal da beleza moral diante dos olhos, para cuidar com afinco dos deveres do meu cargo; sem ódios nem rivalidades que amesquinham os homens; sem desagravos a desagravar, sem contas a ajustar; sem dar ouvidos a estas palavras que o vento traz pela boca dos noveleiros; sem otimismos cândidos, sem confianças ilimitadas, antes sempre preso às realidades, e vigilante na guarda da coisa pública que me foi confiada”.

Segundo Sylvio Fialho, “a atividade de José Antonio de Abreu Fialho – na enfermaria, na cátedra, nas academias, nas revistas médicas, na imprensa, nos congressos, nas sociedades sábias, na administração – mas o grande cenário da sua vida sempre foi o seu consultório, na Rua dos Ourives, onde ele clinicou durante quase quarenta anos, e em cujos arquivos ficou a história da vida de um grande médico”. “Cerca de quatrocentos mil doentes, no consultório e no hospital, desfilaram diante do professor famoso, gente de todas as raças e de todas as condições sociais, vindas não raro de longes confins, atraídas pelo renome da sua ciência e da sua honestidade profissional. Sabiam que da sua boca só ouviriam a verdade, não ignoravam que o interesse mercantil jamais toldara a consciência daquele profissional, que sempre teve em estandarte a honradez e a probidade. Para Abreu Fialho, que cultuava acima de tudo a sua profissão, e a queria cada vez mais dignificada e respeitável, tanto valia o cliente rico quanto o pobre, o humilde tanto quanto o poderoso, nivelados todos pelo denominador comum dum sofrimento igual”.

Seu amor a medicina e o desapego ao poder, fez Abreu Fialho rejeitar o convite do Presidente Arthur Bernardes para governar Sergipe, e em seguida o mandato de Senador por oito anos; de forma consensual com todos os Partidos, sem precisar participar das disputas eleitorais. As frações em disputa em Sergipe queriam um nome de fora da política e com boa fama.  Abreu Fialho foi presidente do Centro Sergipano, no Rio de Janeiro. Faleceu em 17 de março de 1940.
Antonio Samarone.

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