segunda-feira, 2 de setembro de 2024

ITABAIANA 350 ANOS - VELHOS CARNAVAIS.

Itabaiana, 350 anos – Velhos Carnavais.
(Por Antonio Samarone)

A passagem de uma economia rural para mercantil não é pacífica. É uma mudança do modo de vida e dos valores culturais.

A Itabaiana agrícola rezava, festejava, dormia e sonhava no seio da igreja católica. Natal, São João, santas missões, trezenas e procissões. As festas eram religiosas.

A economia era rural. Pequenos sitiantes produzindo alimentos e indo às feiras vendê-las. As mercadorias eram levadas nos burros até Roque Mendes, povoado de Riachuelo e, de lá, via os saveiros, até o mercado central do Aracaju. Itabaiana era a cidade celeiro.

Os povoados próximos aos Rio das Pedras, levavam os seus produtos nos burros, direto ao mercado do Aracaju, por uma estrada que passava defronte ao antigo leprosário. Hoje é o Conjunto Jardim, em Socorro.

Na fase agrícola (até a década de 1960), a cidade era uma extensão do campo. A festa de São João era em volta das fogueiras, nas portas de cada um. No Beco Novo, era um São João na roça.

O Natal era a missa do galo, a feirinha e a roupa nova. A ceia era o arroz com galinha, nas barracas de comidas da Praça de Santa Cruz.

Socialmente pobre, acanhada, casas de taipa, Itabaiana só recebeu a energia de Paulo Afonso em 1956, e a água encanada em 1963.

Nesse período surgiram dois cinemas. O de Zeca Mesquita, com os cowboys, séries, o Gordo e o Magro e Chaplin. Onde Zé Bezerra montava algumas peças de teatro. Tivemos um Cinema Paradiso.

A Igreja montou o cinema Santo Antonio. Domingo as 8 horas, missa das crianças, 9 horas o catecismo e, finalmente, o matinal gratuito no cinema do Padre, as 10 horas. Só para os meninos que foram a missa. Eu não perdia!

Na década de 1950, iniciam-se as mudanças culturais. A sociedade mercantil (caminhão e comércio) estava se consolidando. As festas saiam das Sacristias.

A primeira festa urbana de massas em Itabaiana, foi o carnaval fora de época (micareme). Patrocinado por Euclides Paes Mendonça, o chefe político.

Antes, Itabaiana tinha as bandas de música, com os seus dobrados, as festas folclóricas (reisados e mamulengos) e a fotografia. Graças ao talento de Miguel Teixeira, Percílio Andrade e Joãozinho Retratista. A fotografia fez história e deixou um legado precioso.

Lembro-me do mamulengo de Rafael dos Penicos, na Rua de Maraba.

Euclides Paes Mendonça, o chefe político, percebeu as mudanças e incentivou as micaremes.

Surgiram os blocos carnavalescos, divididos socialmente. Os principais: Lobos do Mar, comandado por Fefi, que atraiu a classe média; e o Margem da Serra, comandado por João Criano, que aglutinava os trabalhadores (sapateiros, alfaiates, padeiros, ourives e carpinteiros). A categoria dos comerciários ainda era pequena.

O Margem da Serra era sediado no Beco Novo.

A foto é de Naciete, a porta-bandeira do Margem da Serra. O mestre sala era Seu Pierrô, craque do Itabaiana. O Beco Novo era uma rua de Pretos. Naciete é filha de Maria de Teodoro e de Seu Teodoro Santana, negro, do Povoado Estreito.

Naciete de Santana é Irmã de Dulce, esposa de Bonito; de Marinete, esposa de Euclides, alfaiate; e do valente Titi, um motorista que levantava uma mesa de sinuca com a coxa.

Itabaiana tinha os seus valentes: Zé de Senhor, Milton de Viera Lima e Antonio Joaquim (Titi). Em meu conceito infantil, valente era quem enfrentava a polícia.

Valdemar Vieira Rosa (Seu Bonito), era de Maruim, marceneiro do Murilo Braga, tocava ganzá no Bloco Margem de Serra. Casou com dona Dulce, irmã de Naciete. Uma família bonita e numerosa. A filha mais velha, Josefa Valdemir Vieira Santos (Dona Nide), casou com o sambista Salomão, e fundaram a Quadrilha Balança Mais não Cai, há 42 anos.

Tenho saudades do alegre Negro Gato, filho de Seu Bonito. Inalcançável nas brincadeiras de pega-pega. Foi para São Paulo, como muitos, e por lá faleceu.

Naciete de Santana (83 anos), mora em São Paulo. Foi a primeira estrela, do jovem carnaval itabaianense. (a moça da foto)

Antonio Samarone – médico sanitarista.
 

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