sábado, 24 de fevereiro de 2024

A FORÇA DAS FANTASIAS

A força das fantasias...
(Por Antonio Samarone)

O cinema foi o fascínio da minha geração. Existia uma casa de espetáculo própria, não estou falando de cinema de shopping. Com a telinha da TV, o cinema passou a ser em casa, na TV. Eu não suporto.

Lembro-me quando o cinema do Padre, em Itabaiana, instalou uma tele gigante, e um pouco côncava, para que os filmes com tecnologia “cinemaScospe” pudessem ser exibidos. Só se falava isso na cidade.

Os filmes sendo cinemaScope colorido, som estéreo e boa fotografia, já era meio caminho andado. Logo cedo, procurávamos nos cartazes, espalhados na cidade, se tinha filme novo.

O que vai passar hoje? Era uma pergunta quase obrigatória.

Os filmes em Itabaiana tinham uma classificação peculiar. Podiam ser de amor, guerra, espada, comédia, cowboy, terror, brasileiros, Tarzan, Zorro, Mazzaropi, o Gordo e o Magro, Carlitos, Paixão de Cristo, policial, e tantos outros, que esqueci.

Os filmes, por natureza, precisavam de um final feliz. O artista não podia morrer, nem no final. O emocionante Canal – 100, foi substituído pelos gols do Fantástico. No Canal 100, passava os gols das rodadas distantes.

O escurinho do cinema era mágicos, sentíamos que os nossos sonhos não eram vistos. Era um bom engano.

As fantasias se estendiam para as revistas de quadrinhos. Era um troca-troca alucinado. De revistas, para quem pensou maldades.
No Beco Novo, brincarmos de contar filmes. Era uma oportunidade de se checar quem tinha assistido aos filmes. Quem não lembrasse, podia inventar cenas inteiras. Eu adorava consertar os filmes contados pelos outros. Era um exercício de narrativas.

Com a chegada da TV esse encanto foi quebrado, mas não morreu. Os cinemas foram fechando. O cine Pálace, o mais luxuoso do Aracaju, virou bingo. Outros viraram igrejas de crentes, inferninhos, lojas de roupas. Foram acabando, um a um.

O tiro de misericórdia foi dado pelos “iphones”, as telinhas de bolso. Tudo se passa ali, a qualquer hora. O cinema como espaço coletivo de convivência, de sonhos, de fantasias foi sufocado?

Foi isso que testamos ontem. Com a ousadia de reviver o cinema coletivo, só que não rua. Instalamos todo o encanto possível e fomos aos subúrbios da Itabaiana Grande.

Com fogos de artifícios, música de Glenn Miller, som estereofônico, pipoca e algodão-doce, uma plateia imensa, atenta e emocionada, assistiu Canta Maria, um filme inspirado na obra do escritor sergipano Francisco Dantas.

A praça lotou, mais de trezentas pessoas. Foi gente até do Aracaju, só para conhecer a iniciativa. A imensa maioria era de crianças.

Enquanto isso, os cinemas dos shoppings são quase vazios.

Voltei com uma dúvida: o Cinema como um desfrute coletiva ainda é viável?

Respondo: sim! Vamos insistir!

Senti no olhar das crianças de pés descalços (vejam as fotos), o mesmo brilho das fantasias da nossa infância...

Antonio Samarone. (médico sanitarista)
 

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