Antonio Samarone de
Santana.
Academia Sergipana de
Medicina.
A história de Sergipe registra a
proteção dada ao cangaço, pelo coronel Antônio Ferreira de Carvalho, o lendário
“Antônio Caixeiro”, pai do Governador Eronides de Carvalho, no município de
Canhoba. O governo de Eronides de Carvalho (1935 – 1941) foi altamente
repressivo com os movimentos e organizações dos trabalhadores. Sua posse
coincide com a Intentona Comunista de 1935. Censurou a imprensa, reprimiu a
oposição, castigou os trabalhadores. Ao mesmo tempo, protegia o Cangaço e os
coronéis, entre os quais o seu próprio pai.
Entre as contradições da história,
o mesmo Eronides Carvalho, durante o Estado Novo, protegeu e acobertou em
Sergipe dois notórios comunistas. Vamos aos fatos. Um casal de médicos
alagoanos, Mário Magalhães da Silveira e Nise da Silveira, formados na Bahia na
turma de 1926, e que depois se tornariam grandes nomes da Saúde Pública
nacional, ele como Sanitarista; e ela como psiquiatra; se esconderam em Sergipe
num período de clandestinidade (1937/38). Nossa hipótese, é que eles tiveram a
proteção do médico, militar e interventor do Estado, Eronides de Carvalho, um anticomunista
declarado.
Após a Intentona Comunista, em
1936, Nise da Silveira foi presa na Frei Caneca por 18 meses, por possuir livros marxistas. No presídio da “Frei Caneca”,
no Rio de Janeiro. Nise estabeleceu amizade com Graciliano Ramos na Prisão,
tornando-se personagem do livro “Memórias do Cárcere”. "... lamentei ver a
minha conterrânea fora do mundo, longe da profissão, do hospital, dos seus
queridos loucos. Sabia-se culta e boa. Rachel de Queiroz me afirmara a grandeza
moral daquela pessoinha tímida, sempre a esquivar-se, a reduzir-se, como a
escusar-se a tomar espaço. O marido também era médico, era o meu velho
conhecido Mário Magalhães. Pedi notícias dele: estava em liberdade. E calei-me,
num vivo constrangimento."
Por outro lado, Mário Magalhães
da Silveira, simpatizante do comunismo, entrou para a clandestinidade. Identificamos
a presença do Sanitarista em Sergipe a partir de 1937, com o pseudônimo de
Claudio Magalhães da Silveira, organizando a implantação do Centro de Saúde
Serigy e dos ambulatórios públicos do estado. Neste período, pelos mesmos
motivos, Jorge Amado também viveu sua clandestinidade na Estância, em Sergipe,
muito bem retratada por Rui Nascimento.
A escolha do pseudônimo “Claudio”
para substituir Mário, durante a clandestinidade em Sergipe, não ocorreu de
forma aleatória. Sua esposa, Nise da Silveira, recebeu esse nome, em homenagem
a Nise, personagem de Cláudio Manuel da Costa, estreitamente relacionada ao
ideal libertário, do qual o seu pai Faustino era admirador. O salão de Faustino era frequentado pelo que havia de mais destacado e
elegante em Maceió. Nossa hipótese é que o “Claudio Magalhães”, Diretor de Saúde
Pública em Sergipe é na verdade o famoso Mário Magalhães. Em conversa pessoal
com o psiquiatra José Hamilton Maciel, Nise da Silveira revelou sua passagem
por Sergipe.
Ao sair da
prisão, Nise vem juntar-se ao marido em Sergipe. Mário Magalhães da Silveira
ocupou o cargo de Diretor Geral de Saúde Pública (O Secretário da Saúde),
substituindo o Dr. Lauro Dantas Hora. É impossível que o Interventor Eronides
de Carvalho não soubesse as razões da presença daquele casal de médicos
comunistas, já famosos, em Sergipe. Levanto duas hipóteses, amizades familiares,
Coronel Antonio Caixeiro era alagoano; ou relação corporativa, em sua
juventude, Mário Magalhães da Silveira, fez parte do Exército Brasileiro, em
Fortaleza. Não sei dizer por quanto tempo eles se esconderam em Sergipe.
Além de nomear um comunista como Diretor
de Saúde pública do Estado, (Secretário da Saúde), Eronides Carvalho criou o Leprosário
Lourenço Magalhães; instalou o Centro de Saúde Serigy, o primeiro do Estado, construiu
o Hospital Infantil, anexo ao Hospital de Cirurgia; criou o Serviço de
Assistência a Psicopatas e Crianças Abandonados, o que possibilitou a
transferência dos loucos das cadeias públicas para uma moderna unidade de
saúde, dirigida pelo eminente psiquiatra Luiz da Rocha Cerqueira, um dos
pioneiros da reforma psiquiátrica no Brasil. Essa história está apenas
começando...
O governador Eronides Ferreira de Carvalho
nasceu na Borda da Mata, Sergipe, em 25 de abril de 1897. Formou-se pela Faculdade de
Medicina da Bahia, em 20 de Dezembro de 1917. Eronides faleceu aos 73 anos, em
18 de Março de 1969 no Rio de Janeiro, onde está sepultado.
Muito interessante. Conhecia a atuação de Nise e de Mário, porém não sabia que eram um casal. Obrigada pelo texto!
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