sábado, 5 de novembro de 2022

NEM FREUD EXPLICA

 Nem Freud explica.
(por Antonio Samarone)

Um grupo de pessoas que não aceitou a vitória de Lula, resolveu reagir. Aqui em Aracaju, acamparam em frente ao quartel do 28 BC, à espera de um comando dos militares. Eles clamam por um golpe. Aqui, o irreal sempre tem precedência ao real.

As massas são influenciáveis e crédulas, intolerantes, agem dentro da lógica afetiva e com uma capacidade intelectual limitada. Mesmo pessoas razoáveis, regridem, quando envolvidas pela alma das multidões.

Nas massas, desaparecem as singularidades. Os indivíduos sentem-se invencíveis, o que lhes permitem entregar-se aos instintos. Sentem-se no anonimato, desaparece o sentimento de responsabilidade.

O indivíduo pertencente a uma massa psicológica, se comporta e pensa diferente, acompanha o coletivo, se torna irreconhecível. Torna-se capaz de grandes vilanias e grandes sacrifícios.

Basta lembrarmos o suicídio em massa dos membros da seita de Jim Jones. Mais de 900 seguidores da seita Templo do Povo tomaram veneno, a mando do reverendo Jim Jones.

“O fato de pertencer a uma massa organizada, o ser humano desce vários degraus na escala da civilização. Em seu isolamento era talvez um indivíduo culto; na massa, é um bárbaro, um ser instintivo. Possui a espontaneidade, a violência, a ferocidade, o entusiasmo e o heroísmo dos seres primitivos” – Le Bon

Na frente do 28 BC ocorreram fatos inusitados. Um sergipano poderoso, podre de rico, experiente, frio, sempre pragmático, estava lá, ingenuamente clamando pelo golpe. Perdeu o senso crítico no meio da massa.

Eu sabia, mas nunca tinha visto o fenômeno de perto.

Nada se pode demovê-los desses delírios. Alguns marcham em ordem unida, prestam continência, se ajoelham e rezam, cantam o hino nacional, falam coisas sem nexo e em línguas estranhas. Estão lá na certeza de que a qualquer momento rufarão os tambores anunciando o fim da democracia.

Somos um país estranho...

Na visão freudiana, trata-se de um delírio coletivo, com consequências imprevisíveis. Muitos, quando saírem do transe, não se lembrarão do que fizeram. O apagamento mental é frequente nesses casos. Ninguém será punido! É o Brasil.

“Na multidão, todo sentimento, todo ato são contagiosos, e isso em grau tão elevado que o indivíduo muito facilmente sacrifica seu interesse pessoal ao interesse coletivo.” - Freud

Um colega da época da faculdade, fechou o consultório, aparou o barba, fez aquele bigodinho de Hitler e está há 72 horas defronte ao 28 BC. Não arreda pé! Faz a saudação romana até na padaria. Tem mais armas armazenadas em um sítio no Mosqueiro, que Roberto Jefferson tinha no apartamento, com destaque para uma submetralhadora israelense, comprada em Itabaiana.

Em seu apartamento, o meu colega de universidade possui uma foto emoldurada dos Romanov, fuzilados pelos Bolcheviques. Ele sente náuseas quando ouve a palavra comunismo e acredita que Lula, Joe Biden e Emmanuel Macron são vermelhos. De Alckmin, ele desconfia.

Sou amigo do mal-assombrado acima. A família me pediu para não o citar nominalmente. Não o farei. Antes, desse fanatismo bolsonarista, desse surto, eu nunca tinha identificado nele nenhuma anomalia relevante. Os criminosos nazistas, segundo Hannah Arendt, eram sujeitos comuns.

Eu sei, isso vai passar. No Brasil, até o fascismo tem ares carnavalescos. O líder deles não se leva a sério.

Antonio Samarone. (médico sanitarista)

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