sexta-feira, 19 de maio de 2017

A REVOLUÇÃO RUSSA

A Revolução Russa.

O centenário da revolução russa de 1917 me trazem lembranças provincianas. A força da utopia vermelha chegou a Itabaiana com o fim da Segunda Guerra. Tínhamos os nossos comunistas municipais, todos heterodoxos. O primeiro foi Zeca Cego. Um camponês, que aos sábados descia a Rua de Macambira, guiando uma carroça de burro entupida de feijão, farinha, aipim, batata doce, abóboras, para negociá-los na feira. Seu Zeca entoava uma canção em língua desconhecida, dizia-se que era a “Internacional” cantada em russo.  Zeca Cego nunca leu Marx, analfabeto, mas bem-falante. Pregava as suas teses para quem quisesse escutar. Virou comuna pela simpatia a Coluna Prestes, diziam até que ele tinha participado. Um lendário...

Contudo, o comunismo mesmo, de carteirinha, com células clandestinas, ligação partidária, leitura do manifesto, ocorreu pelas mãos de uns poucos sapateiros e alfaiates. Foi a chegada a Itabaiana dos sapateiros Zé Martins e Paulo Barros, na década de 1940, que levou a novidade. O primeiro veio de Anadia, em Alagoas; e o segundo de Aracaju (ou Laranjeiras). O grupo logo conseguiu adesões importantes: João Océia (relojoeiro), João de Matos (maestro), Nilo Carvalho (alfaiate), João Barraca (sapateiro), Filadelfo Araújo (alfaiate), Faustino (sapateiro), Raimundo Andrade (comerciante), Jeová (funcionário público), Cardial (marceneiro), Antônio de Doci (comerciante), Renato Mazze Lucas (médico); além de simpatizantes, como os filhos de Zeca Mesquita, João e Zé Silveira, e o padre Arthur. A primeira e única mulher foi a professora Marlene, irmã de Arturzinho.

Era um grupo pequeno, porém atuante. Como prova, carregaram a bandeira do “Petróleo é Nosso”, criaram um clube de cinema, fundaram a Sociedade Beneficente dos Trabalhadores, com sede no Beco Novo, com objetivos de prestar assistência médica, educacional e jurídica aos trabalhadores e politizá-los. Com a redução da influência dos comunistas, a Sociedade virou o Clube do Trabalhador, entidade recreativa, competindo com a Associação Atlética, dos patrões. O terreno da Sociedade foi doado por Zeca Pimentel e a sede construída em mutirão. Na sala da frente funcionava uma escola. O primeiro presidente foi o comunista Nilo Carvalho. Na fase de Clube, os carnavais eram dominados pelos frevos de Capiba, interpretados por Claudionor Germano.

Na política local, os comunistas no início apoiaram Euclides Paes Mendonça, acreditando ser o novo para Itabaiana, diante da caótica passagem de Jason Correia pela Prefeitura. Certa feita, o jornalista e intelectual comunista Fragmon Carlos Borges, natural de Frei Paulo, estava escondido em Itabaiana dando apoio a construção local do Partido. O Secretário de Segurança João de Araújo Monteiro ficou sabendo e enviou forte contingente policial para prendê-lo. Os comunistas procuraram a ajuda de Euclides, que se encarregou de escondê-lo. Desta feita Fragmon escapou. Com o tempo essa aproximação com Euclides foi desfeita, e nas eleições municipais de 1962, os comunas apoiaram de forma militante a candidatura de Zeca Araújo a Prefeito, na disputa com Sizino de Boanerges. Em 1963, na fatídica passeata pela água, os comunistas estavam ao lado dos manifestantes, contra Euclides Paes Mendonça. A ditadura de 1964, levou-os ou as prisões ou ao silêncio.


Independente do destino final, a revolução russa mexeu com o imaginário das classes subalternas no mundo, mesmo em comunidades rurais, dominadas ideologicamente pela igreja. Em Itabaiana, nada intimidava o sapateiro Zé Martins, que pregava com a certeza dos crentes que a revolução estava chegando...  

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