As Galinhas da Serra.
(por Antonio Samarone)
As galinhas chegaram ao Brasil com os portugueses, veio na Armada de Cabral. No início, os índios não as comiam, achavam-nas remosas.
Os índios gostavam do Macuco, maior dos que as galinhas e a carne gorda e tenra. Pareciam faisões.
As galinhas sempre foram comidas de rico, de bispo e de major.
Estou falando da galinha criada solta, comendo besouros e porcarias. Galinha que se reproduzia no mato. Botavam os ovos escondidos e quando chocavam, desaparecia por uns dias e reapareciam puxando uma ninhada de pintos.
A expressão “mais feliz do que pinto em merda”, é uma metáfora verdadeira.
Essas galinhas nobres são conhecidas como de capoeiras. Nem todas são. Tem muitas de raças europeias, criadas soltas, e que se fazem passar por de capoeiras. São fakes! As de capoeiras mesmo, que chegaram com Cabral, gargarejam diferente.
As galinhas são vítimas de preconceitos. Acusadas de covardes, promiscuas, de voo rasteiro, mas são de um amor materno imenso. Quem quiser que mexa com os pintinhos, agasalhados sob as suas asas.
As galinhas chocas enfrentam até as raposas.
A galinha tradicional sempre foi um prato sofisticado e caro.
A galinha era parte obrigatória da dieta das mulheres em resguardo do parto. Mulher parida passava 40 dias comendo galinha.
Havia um ditado perverso, preconceituoso, que dizia que “quando pobre comia galinha era sinal de doença, nele ou na galinha.” Já bacalhau era comida de pobre.
No Livro de cozinha da infanta d. Maria, tem uma receita intitulada “Frangos para os hécticos” (tuberculosos) – era também comida de doentes. Caldo de galinha não faz mal a ninguém.
Ou era comida em dias importantes e por pessoas igualmente importantes. O manjar branco, um dos pratos mais refinados da época, levava, como ingrediente principal, peito de galinha.
Se dizia em Itabaiana: “um domingo sem galinha de capoeira, doce de leite e Sílvio Santos, não é um domingo.”
O capitalismo inventou as granjas e bagunçou a tradição.
As galinhas perderam a fidalguia, se massificaram, perderam a identidade. Não faz sentido uma galinha de granja de estimação. Perderam o status, passaram a se chamar genericamente de “frango de granja”.
Por outro lado, a galinha de granja caiu no costume do povo, ficou do preço dos ovos da Kombi. A maior conquista do Plano Cruzado de FHC, foi galinha de granja a um real. Virou um prato popular.
Eu gosto de uma galinha de granja bem temperada, molinha, onde se come até os ossos.
Mas a galinha de capoeira é outro prato.
A galinhada que mamãe preparava está no livro de receitas da Infanta d. Maria de Portugal (1538 - 1577), neta de d. Manuel, que levou para a Itália em 1565, quando se casou com o duque de Parma. A cópia desse manuscrito circulava no Beco Novo, em Itabaiana.
Para os descrentes, segue uma receita da Infanta:
MANJAR BRANCO
“Cozinhe-se demoradamente um peito de galinha em água pura, de tal modo que se possa desfiar com facilidade. Em seguida coloque-se esse peito desfiado numa vasilha com água fria. Tomem-se 450 gramas de arroz bem lavado e seco com um pano, pise-se-o muito bem, e coe-se-o numa peneira bem fina. Num tacho deite-se 1,4 litro de leite, adoçando-o com 200 gramas de açúcar. A esse leite ajuntem-se então o peito da galinha, um pouco socado, a farinha de arroz e sal a gosto. Leve-se tudo o fogo brando, mexendo sem parar. Quando o creme estiver quase cozido, é bom prová-lo, para ver se necessita de mais açúcar. Depois de pronto tire-se o tacho do fogo, continuando-se a bater o creme por mais alguns minutos. Sirva-se em tigelinhas, com açúcar por cima.”
Do Livro de cozinha da infanta d. Maria.
Eu tenho um grande amigo, Alberto Nogueira, advogado juramentado, que comprou um sítio no Pé da Serra de Itabaiana para restaurar a tradição centenária das galinhas. Está criando a verdadeira galinha de capoeira, de forma orgânica, com besouros e cereais.
E o mais alvissareiro, está vendendo-as aos apreciadores do melhor prato das terras sergipanas. Chamam-se as galinhas da Serra.
O telefone para contato: 99822-1870.
Antonio Samarone (médico sanitarista)
(por Antonio Samarone)
As galinhas chegaram ao Brasil com os portugueses, veio na Armada de Cabral. No início, os índios não as comiam, achavam-nas remosas.
Os índios gostavam do Macuco, maior dos que as galinhas e a carne gorda e tenra. Pareciam faisões.
As galinhas sempre foram comidas de rico, de bispo e de major.
Estou falando da galinha criada solta, comendo besouros e porcarias. Galinha que se reproduzia no mato. Botavam os ovos escondidos e quando chocavam, desaparecia por uns dias e reapareciam puxando uma ninhada de pintos.
A expressão “mais feliz do que pinto em merda”, é uma metáfora verdadeira.
Essas galinhas nobres são conhecidas como de capoeiras. Nem todas são. Tem muitas de raças europeias, criadas soltas, e que se fazem passar por de capoeiras. São fakes! As de capoeiras mesmo, que chegaram com Cabral, gargarejam diferente.
As galinhas são vítimas de preconceitos. Acusadas de covardes, promiscuas, de voo rasteiro, mas são de um amor materno imenso. Quem quiser que mexa com os pintinhos, agasalhados sob as suas asas.
As galinhas chocas enfrentam até as raposas.
A galinha tradicional sempre foi um prato sofisticado e caro.
A galinha era parte obrigatória da dieta das mulheres em resguardo do parto. Mulher parida passava 40 dias comendo galinha.
Havia um ditado perverso, preconceituoso, que dizia que “quando pobre comia galinha era sinal de doença, nele ou na galinha.” Já bacalhau era comida de pobre.
No Livro de cozinha da infanta d. Maria, tem uma receita intitulada “Frangos para os hécticos” (tuberculosos) – era também comida de doentes. Caldo de galinha não faz mal a ninguém.
Ou era comida em dias importantes e por pessoas igualmente importantes. O manjar branco, um dos pratos mais refinados da época, levava, como ingrediente principal, peito de galinha.
Se dizia em Itabaiana: “um domingo sem galinha de capoeira, doce de leite e Sílvio Santos, não é um domingo.”
O capitalismo inventou as granjas e bagunçou a tradição.
As galinhas perderam a fidalguia, se massificaram, perderam a identidade. Não faz sentido uma galinha de granja de estimação. Perderam o status, passaram a se chamar genericamente de “frango de granja”.
Por outro lado, a galinha de granja caiu no costume do povo, ficou do preço dos ovos da Kombi. A maior conquista do Plano Cruzado de FHC, foi galinha de granja a um real. Virou um prato popular.
Eu gosto de uma galinha de granja bem temperada, molinha, onde se come até os ossos.
Mas a galinha de capoeira é outro prato.
A galinhada que mamãe preparava está no livro de receitas da Infanta d. Maria de Portugal (1538 - 1577), neta de d. Manuel, que levou para a Itália em 1565, quando se casou com o duque de Parma. A cópia desse manuscrito circulava no Beco Novo, em Itabaiana.
Para os descrentes, segue uma receita da Infanta:
MANJAR BRANCO
“Cozinhe-se demoradamente um peito de galinha em água pura, de tal modo que se possa desfiar com facilidade. Em seguida coloque-se esse peito desfiado numa vasilha com água fria. Tomem-se 450 gramas de arroz bem lavado e seco com um pano, pise-se-o muito bem, e coe-se-o numa peneira bem fina. Num tacho deite-se 1,4 litro de leite, adoçando-o com 200 gramas de açúcar. A esse leite ajuntem-se então o peito da galinha, um pouco socado, a farinha de arroz e sal a gosto. Leve-se tudo o fogo brando, mexendo sem parar. Quando o creme estiver quase cozido, é bom prová-lo, para ver se necessita de mais açúcar. Depois de pronto tire-se o tacho do fogo, continuando-se a bater o creme por mais alguns minutos. Sirva-se em tigelinhas, com açúcar por cima.”
Do Livro de cozinha da infanta d. Maria.
Eu tenho um grande amigo, Alberto Nogueira, advogado juramentado, que comprou um sítio no Pé da Serra de Itabaiana para restaurar a tradição centenária das galinhas. Está criando a verdadeira galinha de capoeira, de forma orgânica, com besouros e cereais.
E o mais alvissareiro, está vendendo-as aos apreciadores do melhor prato das terras sergipanas. Chamam-se as galinhas da Serra.
O telefone para contato: 99822-1870.
Antonio Samarone (médico sanitarista)
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